Ao vivo no Rio, o Sonic Youth foi de incendiário a desanimado

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Marco Antonio Barbosa, Jornal do Brasil

RIO DE JANEIRO - Os fãs brasileiros do Sonic Youth particularmente os cariocas já foram ao céu e ao inferno com a banda. A primeira vinda do grupo ao Rio, apresentando-se no finado Free Jazz Festival de 2000 (no Museu de Arte Moderna) foi um dos melhores shows de rock que a cidade já testemunhou. Na segunda, quando a banda estava escalada no fatídico Claro que É Rock (realizado na Cidade do Rock, em 2005), tudo o que poderia dar errado deu mesmo. Entre os dois extremos, a certeza da presença de uma banda realmente única. Para o bem e para o mal.

Em 2000, diante de uma escalação um tanto duvidosa no setor pop rock (Moloko, Sean Lennon, Jay-Jay Johansen), ficou fácil para o SY tomar o posto de show mais esperado do evento. A banda nova-iorquina era aguardada pelos brasileiros ao menos desde 1988, ano em que, pela primeira vez, um disco deles ganhava edição nacional (o seminal Sister). O grupo lançara meses antes o disco NYC ghosts & flowers, mal recebido pela crítica internacional por seu excesso de experimentalismo e pretensão. A expectativa era grande, especialmente conhecendo-se a reputação vale tudo do quarteto no palco. Se eles se limitassem a tocar o repertório do disco, o show poderia ser um barulhento e desconexo fracasso.

O que se viu passou bem longe disso, felizmente. Tocando apenas o mínimo indispensável de NYC ghosts & flowers, Thurston, Kim, Lee e Steve (acrescidos do guitarrista Jim O'Rourke) centraram fogo mesmo nos sucessos. Foi praticamente um greatest hits, tocado com o máximo de energia e a dose certa de porralouquice guitarrística. Das ancestrais Schizophrenia, Turf gnarl (ambas de Sister) e Shadow of a doubt (de EVOL, 1986), passando pelos clássicos de Daydream nation e desembocando nos hits da fase grunge (100%, Kool thing, Disappearer, Sugar Kane, Bull in the heather), o bicho pegou realmente. A porção viajandona foi garantida numa longa perto de 20 minutos de duração versão de The diamond sea, ponto altíssimo da noite.

Cinco anos depois, em novembro de 2005, a história foi bem outra. A etapa carioca do festival Claro que É Rock foi um dos mais acidentados eventos da história do showbusiness brasileiro. A começar pela escolha do lugar: a distante e imensa Cidade do Rock, espaço totalmente superdimensionado para uma escalação que só tinha artistas de perfil alternativo (Nine Inch Nails, Iggy Pop, Flaming Lips, Fantomas, além do SY). Rumores de encalhe maçiço de ingressos se confirmaram no dia do evento (um domingo à tarde), quando era possível comprar até por R$ 5, na mão de cambistas, entradas que originalmente custariam R$ 100. Para completar, um dos caminhões que transportava o equipamento de palco do festival quebrou quando vinha de São Paulo, o que acarretou um atraso de mais de cinco (!) horas na programação.

Na hora do Sonic Youth tocar, espremidos entre a psicodelia do Flaming Lips e a catarse punk de Iggy Pop, o desânimo era geral. Irritados com o atraso que o forçou a cortar muito a duração do show, o grupo se limitou a fazer longas e arrastadas versões de músicas do (bom) disco Sonic nurse (2005), pontuadas por um festival de microfonias e dissonâncias. No final, uma longa cacofonia guitarrística, de furar os tímpanos, espantou os poucos fiéis que ainda resistiam.