Nova antologia traz contos da literatura brasileira

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Henrique Marques-Samyn*, Jornal do Brasil

RIO DE JANEIRO - No cenário atual da literatura brasileira, o conto continua ocupando firme e forte o posto de gala a que foi novamente alçado no fim da década passada. Sendo assim, nada mais adequado que o lançamento de Os melhores contos brasileiros de todos os tempos, nova antologia de Flávio Moreira da Costa inteiramente dedicada à produção contística nacional. A obra, que reúne 87 contos em quase 800 páginas, fornece um valioso panorama da riquíssima tradição da qual assumidamente ou não os novos contistas brasileiros aspiram fazer parte algum dia. Percorrendo as obras coligidas, afinal, não deixamos de nos deparar com brilhantes subvertores do gênero, como o inconstestável Machado de Assis, o (injustamente) esquecido e inclassificável Adelino Magalhães e o genial Dalton Trevisan.

Os melhores contos brasileiros está entre as antologias estruturadas por Flávio Moreira da Costa segundo uma perspectiva diacrônica, em que temos a oportunidade de acompanhar todo o processo de constituição de uma determinada tradição literária. Desse modo, a primeira parte da obra 'Conto antes do conto ou a infância da ficção' recorre à literatura oral e à cultura popular a fim de resgatar contos que, embora não concebidos tendo em vista o gênero (ou mesmo uma intenção literária stricto sensu), apresentam o que pode ser considerado a pré-história do conto brasileiro.

Além desta, compõem a obra mais nove seções, dentre as quais vale destacar: 'Contos fundadores ou à sombra do romantismo', quando nasce no Brasil o conto propriamente literário através de nomes como Álvares de Azevedo, Bernardo Guimarães, Casimiro de Abreu e França Jr.; 'Contos sem data ou Machado de Assis, um capítulo à parte', registro de 'um inesperado (e definitivo) amadurecimento da narrativa curta entre nós', no dizer do selecionador; 'Contos pioneiros ou o nome do conto-menino', em que o título faz referência ao processo de constituição formal do gênero pela mão de autores como Domingos Olympio, Lúcio de Mendonça e José Veríssimo; 'Contos modernos ou amor e morte na cidade grande', que apresenta a consolidação do conto urbano no Brasil; e 'Contos contemporâneos ou a terceira margem na hora neutra da madrugada', que elenca autores recentes cujo lugar na tradição já está garantido como Clarice Lispector, Autran Dourado, Rubem Fonseca e Moacyr Scliar.

Como registra Fábio Lucas na apresentação do livro, é impossível reunir, num só volume, todos os grandes contistas brasileiros (e ao dizê-lo refere-se aos escritores contemporâneos, que constituem apenas a décima parte do corpus coligido por Flávio Moreira da Costa). Não obstante, 'o selecionador esteve à altura da temerária e cansativa tarefa', observa com justiça o crítico. Vale ainda notar que constam da obra nomes que, a despeito de sua indiscutível qualidade, dificilmente comparecem em antologias por conta de dificuldades relacionadas à negociação de direitos autorais: é o caso de Carlos Drummond de Andrade e Guimarães Rosa. Os melhores contos brasileiros é, enfim, como um time de futebol bem escalado: é possível questionar a ausência de um ou outro nome, já que sempre fica de fora algum craque, mas seria uma grande injustiça excluir qualquer um dos que foram escolhidos o que só comprova a qualidade do antologista Flávio Moreira da Costa.

*Doutorando em literatura comparada e autor de Esparsa erótica (poemas).