Filme baseado no livro 'Meu nome não é johnny' tem primeira exibição

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Hugo Cals, Agência JB

RIO - O pequeno auditório Rio Data Centro, localizado no campus da universidade PUC-Rio, na Gávea, ficou pequeno na manhã desta quinta-feira, dia 25.

Todos os presentes estavam ansiosos para conferir, em primeira mão, a versão cinematográfica do livro "Meu nome não é Johnny", do jornalista Guilherme Fiúza. A produtora do filme e professora do curso de cinema, Mariza Leão, deu início à exibição, anunciando que esta seria a primeira exibição pública do filme.

O filme é um retrato fiel do Rio de Janeiro, mais precisamente da Zona Sul da cidade na década de 90. Um personagem real, João Guilherme Estrela, jovem de classe média alta, embarca no mundo do narcotráfico mesmo tendo oportunidades para seguir caminhos diferentes. De sua primeira experiência com drogas, um inocente baseado na pedra do Arpoador, até se tornar o maior fornecedor de cocaína do Rio de Janeiro, o caminho foi curto. No entanto, através de uma narrativa que segue a ordem cronológica dos fatos, intercalado com flashbacks da infância do ex-mega-traficante, o diretor Mauro Lima constrói uma história multifacetada que desperta no espectador os mais diferentes sentimentos, variando entre a felicidade e tristeza.

Até mesmo nos momentos de clímax do filme, por exemplo, quando João compra sua liberdade após receber a visita de policiais, tiradas sarcásticas são utilizadas para quebrar o gelo. O policial corrupto, que entra na casa de João em busca de mais flagrantes e dinheiro, critica a companhia de luz por cortar o fornecimento após falta de pagamento. Quando o João é preso, e o delegado pergunta se ele está envolvido ou não com o tráfico de drogas, sua resposta não podia ser mais irônica:

- Por quê? O senhor está interessado em comprar?

Em mais uma brilhante atuação, Selton Mello interpreta o complexo João Guilherme Estrela que através de sua atuação ganha contornos humanísticos mesmo no auge do narcotráfico. Tanto o ator quanto o ex-traficante no qual o personagem foi inspirado, estavam presentes na exibição. Selton contou que foi a primeira vez em sua carreira que interpretou alguém que estava presente nos sets de filmagem. João, que assistiu ao filme pela primeira vez, estava muito feliz com o resultado:

- Estou muito emocionado. É muito gratificante ver minha vida retratada fielmente na tela. Não tenho arrependimentos, mas não a recomendo para ninguém.

Selton ressaltou que não conversou com João para compor o personagem:

- Mesmo tendo o conhecido, quis criar o meu próprio Johnny. Quis fazer o meu João, construído a partir de relatos de amigos, que não foram poucos, além de estudos das reportagens da época.

O bipolarismo do personagem de Selton, que em segundos pode tornar felicidade plena em depressão profunda, é bem equilibrada pelo seu par romântico, Sofia, interpretada pela atriz Cléo Pires. Ela completa a personalidade de João, e serve de termômetro de alerta quando a situação torna-se grave. Mas assim, como na maioria dos casais cujo relacionamento é baseado no consumo de drogas, o romance dura pouco.

Assim como no livro de Fiúza, o longa-metragem mostra a ascensão, o apogeu e a queda do personagem de João Guilherme Estrela. Em 1995, a partir de investigações policiais, João Guilherme e duas pessoas envolvidas em seu esquema de tráfico, foram presas em um apartamento de Copacabana que continha 6 quilos de cocaína pura, que seriam enviados para a Europa, através de casacos com fundos falsos. O título do livro, o mesmo do filme, é inspirado exatamente nesse episódio: ao ser encaminhado para a carceragem da Polinter, na Praça Mauá, João Guilherme lia a reportagem publicada no Jornal do Brasil sobre sua prisão e ficou incrédulo quando foi reportado como João Guilherme Estrela, o Johnny. Ao constatar o equívoco, ele exclama:

- Meu nome não é Johnny!

O filme, mesmo que sutilmente, toca em assuntos polêmicos: a fase em que João fica preso (depois da Polinter, ele foi encaminhado a um manicômio) serve de pano de fundo para denunciar as péssimas condições existentes no sistema carcerário brasileiro. Em vez da reintegração social, os detentos encontram um ambiente marcado por hostilidade e falta de estrutura.

Depois da exibição do filme, o público pode participar de um debate com os envolvidos na produção do filme. O autor do livro, Guilherme Fiúza, fez questão de ressaltar que o filme não é sobre o tráfico, mas que ele existe no filme. O diretor Mauro Lima fez eco à observação, explicando que o filme propõe analisar a história de uma pessoa comum que por um motivo alheio realiza transgressões.

- O filme não passa mensagem, ele é um retrato de um personagem inspirado em fatos reais. De perto ninguém é normal - afirmou Mauro.

Em tempos em que o filme "Tropa de Elite" é o assunto mais comentado em todas as camadas sociais, a comparação é inevitável, já que ambos abordam o tráfico de drogas, mesmo que sobre pontos de vista diferentes. Apesar do narrador de "Tropa" ter uma visão radical e responsabilizar o usuário de drogas pelo financiamento do tráfico de drogas, a visão aqui é diferente, como ressaltou o diretor Mauro Lima:

- Não acho que usuários de drogas podem ser culpados pela violência. Por que os usuários de álcool não são?

Selton fez uma brincadeira com a pirataria que envolveu "Tropa de Elite" com um pedido repentino:

- Quero a cópia que passou agora na minha mão!

A verdade é que, independente da visão de um ou de outro, a presença do biografado e ex-traficante João Guilherme Estrela no debate transmitiu esperança a platéia. Interagindo o tempo todo com a platéia, com irreverência, o personagem em questão é a prova viva que a reabilitação de dependentes é possível. João contou que finalmente lançará seu primeiro álbum solo (ele é cantor, compositor e produtor musical atualmente) no mesmo dia da estréia oficial do filme. Um sonho antigo que ficou perdido nas longas carreiras de cocaína que ele consumiu no auge de seu "reinado".