Das ruas para a premiação

Catorze peças disputam prêmios em nove categorias do Shell de Teatro, no Rio. Coletivo de artistas negros lidera indicações

Por Affonso Nunes

Gomlevski no monólogo "Memórias do esquecimento"

O espetáculo "Esperança na revolta", que aborda guerras contemporâneas e resistência, encenado pelo coletivo Confraria do Impossível lidera as indicações ao Prêmio Shell de Teatro Rio, que acontecerá esta noite no Copacabana Palace. Ao todo, 14 espetáculos concorrem a prêmios em nove categorias.

Concebido e encenado por artistas negros, é totalmente independente: o grupo levantou verba para realização, passando o chapéu em apresentações nas ruas e transportes públicos. As indicações são na categoria música, autoria e direção.

O momento é um marco importante para a arte negra brasileira, por ser a primeira vez que um diretor negro (André Lemos) é indicado nos 31 anos da história da premiação. Atrizes negras (Bèa no Confraria do Impossível e Larissa Luz por musical "Elza") também foram indicadas na categoria música.

Por uma nova história

Para André Lemos, este é o momento de construir uma nova história. "Erguer muros não vai nos impedir de entrar. Se precisar, vamos derrubar. Nós vamos para ganhar", avisa Lemos, que disputa o prêmio com Quitéria Kelly, de "A invenção do Nordeste.

De acordo com o diretor, o grupo faz da arte um meio de contrariar as estatísticas, por se tratar de um coletivo de atores jovens e negros. "Dados como a cada 23 minutos, um jovem negro é morto no Brasil, retratam a realidade da juventude preta no país", argumenta. O espetáculo fez duas temporadas, uma em novembro e dezembro e outra em fevereiro. A previsão é a de retornar com mais uma ainda no primeiro semestre deste ano.

Outras montagens com destaque na relação dos indicados são "A invenção do Nordeste", nas categorias dramaturgia e direção, e "Um Tartufo", nas categorias iluminação e inovação. 

O prêmio de melhor ator terá a disputa entre Bruce Gomlevsky, por "Memórias do esquecimento", e Otto Jr., por "Tebas Land". Adaptado por Gomlevski, "Memórias do esquecimento" é monólogo baseado no livro homônimo, ganhador do Prêmio Jabuti de 2000. São relatos sobre as três prisões e as torturas sofridas pelo jornalista Flavio Tavares entre 1964 e 1969 e seu período de exílio no México. 

Laureada no Award Off West End, em Londres, além das cinco indicações ao Prêmio Max, da Espanha, "Tebas Land" narra a trajetória de um escritor de teatro, que, buscando motivação para uma nova peça, opta por contar a história de um jovem assassino real, preso e condenado após ter matado o próprio pai.

Ana Kfouri ("Uma frase para minha mãe") e Nena Inoue ("Para não morrer") são as concorrentes ao prêmio de melhor atriz. "Uma frase para minha mãe" é um texto do crítico literário francês Christian Prigent que reflete sobre a passagem da vida para a literatura e o nascimento de um escritor. Baseado na obra de Eduardo Galeano, "Para não morrer" aborda temáticas feministas e femininas atreladas a questões políticas. Nena foi indicada a melhor atriz no Prêmio Troféu Gralha Azul e premiada em 2017 pelo governo do Paraná.