Chef carioca ganha a 1ª estrela do Michelin no exterior

Raphael Rego é dono do restaurante Oka, em Paris, que serve pratos com ingredientes brasileiros

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"Oka" tem uma "cozinha identitária", que utiliza ingredientes importados da Amazônia, São Paulo, Recife e outras partes

PARIS - Alex Atala, Felipe Bronze, Helena Rizzo... os chefs brasileiros trilham o caminho para o firmamento culinário, mas e seus embaixadores? Raphael Rego está por trás do primeiro restaurante brasileiro a obter uma estrela Michelin no exterior, o "Oka" em Paris.

No entanto, o carioca de 34 anos não planejava seguir esses passos. Não quando, aos 18 anos, foi para a Austrália estudar marketing, ou se estabeleceu em Paris há uma década, sonhando com restaurantes de cozinha francesa, sem considerar por um momento os pratos de seu país natal.

Esteve prestes a jogar a toalha: "Oka" teve de fechar alguns meses após a abertura em 2017, devido a contratempos logísticos. Assim, a estrela que recebeu em janeiro pelo Guia Michelin, a primeira para um restaurante brasileiro no exterior, não era esperada por Raphael.

"Eu nunca tinha cozinhado comida brasileira. Mesmo em casa, para meus amigos, preparava um 'pot-au-feu' (guisado) ou revisitava um bife com batatas", explica o chef em seu restaurante elegante em tons sóbrios e uma enorme cozinha aberta visível da rua. Mas, em 2013, a gravidez de sua esposa, uma francesa que conheceu na Austrália, fez com que mudasse de ideia. "Eu me perguntei o que queria transmitir a meu filho e decidi voltar às minhas raízes".

O resultado deste processo, pontuado por longas estadas no Brasil, é "Oka", uma "cozinha identitária" com ingredientes importados de produtores locais: sementes de puxuri e erva priprioca da Amazônia, arroz de São Paulo, farinha de mandioca de Recife, cachaça...

Suas técnicas, "complexas", são em sua maioria da gastronomia francesa aprendidas na prestigiosa escola Ferrandi e em renomados restaurantes parisienses, como L'Atelier de Joel Robuchon e "Taillevent"."Tento associar os dois sabores que tenho na minha boca desde muito tempo", diz Raphael, referindo-se às cozinhas da França e do Brasil, como ilustrado por um prato de vieiras com puxuri, chuchu e cajá.

Raphael admite que em 2013 esteve prestes a retornar ao seu país para abrir seu restaurante. "Percebi como a gastronomia brasileira tinha evoluído graças a todos esses chefs que se formaram no exterior, inspirados pelos grandes nomes franceses instalados no Brasil, como Claude Troisgros. Atala e a nova geração realizaram uma reviravolta enorme".

Mas fora eles, continua-se "comendo a mesma coisa": feijoada, moqueca e pão de queijo, em restaurantes "decorados com o Corcovado e mulheres dançando samba": "Eu queria ir para o outro lado", explica ele.

Seu primeiro empreendimento também foi batizado de "Oka", um pequeno restaurante parisiense que abriu em 2014. Mas a moqueca com leite de coco ou o porco com purê de banana não convenceu os comensais, "frustrados" com um menu que deixava de fora até a clássica caipirinha. Apenas um influente crítico francês, Gilles Pudlowski, resgatou-o do temido fiasco. "Ele entendeu minha gastronomia e, graças a ele, os clientes começaram a vir".

Enquanto o seu pequeno "Oka" tornou-se "Maloka", Raphael assumiu instalações maiores e aproveitou o período de obras para viajar ao Brasil e entrar em contato com os produtores locais, muitos da Amazônia.