Partido incomoda?

Por WILSON CID

Talvez esteja equivocado o presidente Jair Bolsonaro quando, em retaliação aos agravos que tem recebido, proclama-se suficientemente forte para independer de partidos, a começar pelo PSL, sob cujo manto abrigou-se para disputar o cargo em que hoje se encontra. Primeiro, tomando-se uma constatação lógica, as ações do Executivo, quando dependentes do apoio parlamentar, teriam de ser negociadas com blocos ou mesmo na individualidade dos deputados e senadores, árdua tarefa por causa do tempo que isso demandaria, sem tempo para mais nada. O governo não teria como avançar se dependesse de permanente caça aos votos pelo varejo. Depois, não menos real, os agentes, tratados isoladamente, tornam-se mais poderosos e exigentes, prontos para sugar todos os sangues que correm nas veias do poder.

Não houve presidente, desses que posam em paredes e galerias oficiais, que tenha desdenhado dessas corporações, embora muitas vezes prestes a fazê-lo, quando se esgotou a paciência e exauriam as fontes de atendimento às preensões impostas. Jânio Quadros impacientou-se logo, diante de um Congresso onde via gente despreparada e ociosa. Mas ele se foi e os partidos sobreviveram, para mostrar que sem eles um presidente não consegue viver.

O jeito, talvez alguém possa dizer a Bolsonaro, é tornar a convivência mais agradável ou menos acidentada, adotando a forma sempre eficaz de diluir o fôlego de um partido incômodo prestigiando, em doses cuidadosas, um concorrente com igual apetite de poder. Forças divididas. Vê-se a solução administrada por Vargas, abraçando o trabalhista para respirar nos centros urbanos, e, ao mesmo tempo, alimentando o velho PSD, que ouvia e atendia as massas rurais, àquele tempo muito mais poderosas. Dividir o poder político dos partidos, facilitar as divergências entre litigantes, enfraquecer postulações; mas sem dispensar partidos, ainda que com sacrifício gástrico na hora de engolir sapos e lagartos. Se a História aprecia repetir experiências, quem sabe o breviário da velha alquimia varguista faria bem a Bolsonaro neste momento ?

Ruim com eles, pior sem eles, pode-se dizer a respeito dos partidos, porque a violência de sua dissolução ou sua redução ao papel de meros assistentes sempre foi a antevéspera das ditaduras. O presidente pode estar incorrendo em desserviço à politica nacional quando anuncia disposição de tornar-se independente de qualquer. Porque reduz sua capacidade conviver republicanamente com o Congresso, e fulanizar o modelo de dialogar com o poder Legislativo.

Quem analisa os ciclos temperamentais do presidente nos seus primeiros dez meses haverá de perceber o esgotamento da capacidade de desvencilhar-se, com paciência, de perguntas e situações incômodas. Com a peculiaridade de, não obstante, deixar-se atrair pelas ciladas. Não foi diferente o que se deu no recente e generalizado desprezo devotado aos partidos, além de confessar que em quase trinta anos de militância nunca dependeu deles. Há certas coisas que o homem público tem todo direito de pensá-las, mas não dizê-las, sob pena de estar abrindo fossos perigosos na convivência democrática.

Revela-se cada dia de forma cristalina que o presidente se irrita facilmente com impasses de natureza política, e com facilidade espalha brasas ao vento. Assunto longe de lhe parecer agradável, ideal seria atribuir a outrem a missão de dar trato ao tema; um intérprete menos explosivo e com visão mais acuidosa sobre os desdobramentos da palavra; porque esta, depois de proferida, tanto constrói como destrói o que tem pela frente.