Brasil cria regras para orgânicos; setor cresce 40% ao ano
Jornal do Brasil
RIO E BRASÍLIA - Os alimentos orgânicos têm tido uma procura crescente, nestes tempos ecologicamente corretos. Trata-se de um fenômeno que ocorre em todo mundo. Nos EUA, o setor movimentou US$ 20 bilhões em 2007. No Brasil, são R$ 360 milhões por ano, num mercado que cresce 40% anualmente. É pouco ainda em relação à produção do país: apenas 1,8% dos produtores brasileiros usam estas técnicas. Mas a produção e o consumo devem aumentar: o país já conta com uma espécie de marco regulatório para o setor e os produtos orgânicos estão se adequando às regras. Um dos aspectos mais importantes é a certificação obrigatória dos produtos.
Com a regulamentação, no mercado interno haverá possibilidades legais de coibir e punir a venda de produtos que se dizem orgânicos, mas não são. Isso é uma garantia para os consumidores e para a credibilidade do movimento orgânico afirma o presidente da Câmara Temática de Agricultura Orgânica do Ministério da Agricultura, José Pedro Santiago.
Na produção orgânica, não podem ser usados agrotóxicos, adubos químicos e sementes transgênicas, e os animais devem ser criados sem uso de hormônios de crescimento e outras drogas, como antibióticos. Para controlar esse modo de produção, a certificação obrigatória será exigida a partir de 31 de dezembro de 2010 no Brasil, de acordo com o Sistema Brasileiro de Avaliação da Conformidade Orgânica (Sisorg). Os produtores terão o prazo de um ano para se adequar às regras e vender os produtos com a certificação obrigatória.
Nos Estados Unidos e na Europa, a produção e o consumo de orgânicos deram um salto após a aprovação das suas respectivas leis. Isso deverá acontecer também no Brasil diz Santiago
Mais qualidade
As certificadoras, que atestam se o alimento é orgânico, deverão ser creditadas pelo Instituto Nacional de Metrologia (Inmetro), o que, segundo Santiago, deve elevar a qualidade no setor.
Segundo o coordenador de Agroecologia do Ministério da Agricultura, Rogério Dias, no próximo ano, haverá novos dados oficiais sobre o setor, a partir do Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos, que devem facilitar a aplicação de políticas públicas específicas.
Com esse cadastro, vamos saber quem são os produtores, quantos são, onde estão e o que produzem. Vamos saber qual é a área de soja, milho, frutas, carnes, ovos e leite, porque no cadastro teremos também a atividade produtiva de cada um explicou.
A maior parte da produção brasileira (60%) é voltada para a exportação, principalmente para o Japão, os Estados Unidos e a União Europeia. A maioria do que segue para o mercado externo é de produtos in natura, processados da soja, açúcar, café, cacau, carnes, leite e derivados do mel.
Segundo o Censo Agropecuário 2006, divulgado em setembro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção orgânica no Brasil concentra-se na pecuária e criação de outros animais (41,7%) e na produção de lavouras temporárias (33,5%).
Além de produzir alimentos considerados mais saudáveis, na agricultura orgânica, o solo se mantém fértil e sem risco de contaminação.
Da Redação, com Agência Brasil
Consumidores atentos à saúde criam tradição no Rio
Thiago Feres
Instalada há 25 anos na Rua das Laranjeiras, na galeria número 43, a loja Grão Natural é mais um dos estabelecimentos de produtos orgânicos que tornou-se referência para os seus consumidores.
No local, todas as terças, quintas e sábados, a partir das 7h30, funciona uma feira especializada neste tipo de alimento. A loja também vende produtos naturais e é frequentada por todos os tipos de clientes: desde os mais radicais até os que se preocupam só um pouquinho com a saúde.
Venho aqui há 20 anos. Minha mãe é pediatra e quando criança fui educada com uma atenção muito grande com a alimentação conta a programadora visual Anita de Moraes, de 62 anos. Depois de um câncer, quando tinha 40 anos, passei a me preocupar ainda mais com a minha saúde e consumo somente produtos orgânicos.
A proprietária da Grão Integral, Benedita Santana Xavier, trabalhava em uma emissora de televisão. Quando deixou o emprego, resolveu comprar a loja que já existia.
Sempre comia em um restaurante de produtos naturais, quando pintou a oportunidade não perdi tempo. Consegui fazer a loja crescer e aluguei um espaço maior. No que diz respeito aos preços, sei que ainda são altos, mas a oferta de produtos é muito pequena diante da demanda. Só tenho um fornecedor bom de tomates, por exemplo explica.
O quilo do tomate está custando R$ 9,30. Bem diferente dos R$ 3 cobrados nos supermercados normais. Já o quilo da batata orgânica é vendido por R$ 8.
A doença entra pela boca. Para evitar problemas, eu busco qualidade na minha alimentação diz o jornalista Leandro Uchôas, 33.
Além da feirinha daqui, também existe uma outra na Glória vendendo produtos orgânicos. A sociedade organizada foi quem estabeleceu que alimentos saudáveis fossem mais caros. Como a demanda é menor, o capitalismo eleva o preço, o que é completamente errado reclama.
Benedita destaca que os clientes de sua loja são pessoas especiais.
Percebo uma filosofia peculiar neles. São preocupados com a natureza, com a poluição e possuem consciência social conta.
Outra particularidade dos consumidores de produtos orgânicos, é a quantidade do que se compra no mercado.
Eles costumam comprar sempre, semanalmente. Aquelas compras mensais, enormes, não são nada comuns por aqui diz Benedita.
No entanto, há quem frequente o local e não leve tão a sério a dieta alimentar. É o caso do antropólogo Antônio de Jesus Silva, 60.
Sou gaúcho e fui criado comendo muita carne vermelha. Por isso, acabei influenciado pelo mito dos anos 70, da geração saúde, e resolvi me controlar mais com o passar dos anos. Mesmo assim, não me privo de comer um churrasco ou uma pizza quando sinto vontade.
Nas manhãs de sábado, hora de ir à feira na Glória
Todo sábado, tem feira de produtos orgânicos da Glória, no Rio. Ela completou 15 anos de existência em 2009. A maior parte dos produtos vem da área rural de cidades da Serra dos Órgãos fluminense, comenta o coordenador da feira, Renato Martelleto. Segundo ele, a certificação obrigatória dos produtos orgânicos vai impulsionar as vendas.
A engenheira agrônoma da Associação de Agricultores Biológicos do Rio de Janeiro (Abio), Lúcia Helena Almeida comemora uma mudança que considera essencial no novo marco regulatório:
Abio poderá certificar e orientar os produtores, o que hoje não pode fazer. Uma coisa é certificar o produto como orgânico. Outra é ensinar o produtor a plantar em outro lugar, evitando a erosão. Isso é sustentabilidade, é princípio do desenvolvimento sustentável.
A preocupação com a saúde e com o impacto ambiental é o principal fator que leva o consumidor a buscar produtos orgânicos. É o que aponta o pesquisador Francisco Vilela Resende, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Unidade Embrapa Hortaliças. Algumas pesquisas da empresa mostram que os orgânicos têm mais vitamina C e antioxidantes.
Os consumidores destacam a durabilidade e o sabor diferenciado dos alimentos. Não só eles.
Em termos de produto final, o orgânico tem muito mais sabor, muito mais aroma, mais cor e um peso maior do que o convencional diz Renato Caleffi, chef de um restaurante paulistano especializado nesse tipo de culinária.
Na questão do paladar, uma das maiores defensoras dos produtos orgânicos é Maria Beatriz Dal Ponte, gerente do Centro de Gastronomia do Senac do Rio de Janeiro.
A produção e o consumo de orgânicos são o resgate de uma prática antiga da história da humanidade. E hoje os orgânicos são usados pelos chefs no mundo inteiro diz.
(Com Agência Brasil)
Preços tendem a cair com marco regulatório
Trabalhar com produtos orgânicos é um negócio que rende frutos. Embora, o mercado ainda esteja retraído devido ao preço das mercadorias muitas vezes o dobro dos alimentos convencionais a tendência é de alta. A rede Mundo Verde registra crescimento médio de 25% ao ano na venda de orgânicos, que já representam 5% da receita da empresa.
A participação dos orgânicos no Mundo Verde é cada vez maior e a preocupação da rede está em esclarecer os consumidores sobre os benefícios de se consumir este tipo de alimento, que é mais saudável para o cliente e para o planeta. Afinal, nosso compromisso é vender conceito em alimentação inteligente e não apenas mais alimentos afirma Donato Ramos, diretor de Marketing da rede.
Segundo ele, a participação de 5% nas vendas pode parecer pequena, mas é bastante significativa se for considerada que a venda era praticamente nula há 20 anos, quando o Mundo Verde foi criado em Petrópolis.
Com o novo marco regulatório, os preços dos produtos orgânicos tenderão a cair, uma vez que o consumidor se sentirá mais seguro a comprar, incrementando as vendas. Atualmente, na Europa e nos EUA, já se encontram à venda alimentos orgânicos com preços bem próximos dos convencionais.
Para a gerente comercial de Alimentos Orgânicos do grupo Pão de Açúcar, Sandra Caíres, o motivo da diferença de preços está na pequena produção de orgânicos no Brasil.
Na Europa e nos EUA, a diferença de custo do orgânico para o convencional fica entre 25% e 40%, no máximo. No Brasil, que ainda está embrionário no setor, as diferenças são absurdas, indo a mais de 100%, porque o país ainda não tem produção em escala.
Segundo ela, existe dificuldade para conseguir alguns tipos de alimentos orgânicos, principalmente frutas, e colocar à venda na rede de supermercados em que trabalha.
Apesar de os preços ainda serem altos, o consumo de alimentos orgânicos é uma tendência, acredita Sandra. E, quanto mais a população for se informando e a escala aumentando, os preços irão cair:
Segundo ela, de janeiro a abril deste ano, enquanto a venda de produtos convencionais cresceu 10%, na comparação com o mesmo período do ano passado, a de alimentos orgânicos aumentou 40%. Para Sandra, o que tem levado as pessoas a comprar mais orgânicos é a preocupação com a saúde e a segurança alimentar.
O alimento orgânico é rastreado. Você sabe o lote que está comprando, quem é o fornecedor.
Para o coordenador de Agroecologia do Ministério da Agricultura, Rogério Dias, muitos supermercados consideram os orgânicos um nicho de mercado, o que contribui para a manter os preços altos:
Mas já existe um entendimento, mais avançado, de que agricultura orgânica não é nicho de mercado. É um novo modelo de desenvolvimento afirmou.
