- CRÍTICA - ‘Caros Camaradas! – Trabalhadores em luta’: o sonho era um pesadelo
Cotação: quatro estrelas
O cineasta russo Andrey Konchalovskiy tem uma carreira muito interessante. Aos 84 anos, continua na ativa, e já passou por todo tipo de filme: do drama de época ao filme político, passando por uma superprodução americana de ação com atores renomados (“Expresso do Inferno/Runaway Train”, 1985, com Jon Voight). Agora, volta às raízes com “Caros Camaradas! – Trabalhadores em Luta” (“Dear Comrade”, 2020), que trata de uma greve, em pleno auge do comunismo, na extinta URSS.
O local é Novocherkassk, URSS, 1962. Lyudmila (Yulyia Vysotskaya) é uma executiva do Partidão e comunista devota, que lutou na guerra pela ideologia de Stalin. Certa de que seu trabalho criará uma sociedade comunista perfeita, a mulher detesta sentimentos antissoviéticos. É superidealista. Contudo, durante uma greve numa fábrica local, Lyudmila testemunha um piquete de trabalhadores (que também reclamam do preço dos alimentos), que são friamente baleados, por ordem do governo, que busca abafar greves na URSS.
Após o banho de sangue na praça da cidade (as cenas são muito fortes e bem explícitas), quando os sobreviventes fogem do local, Lyudmila percebe que sua filha desapareceu. Então, um buraco se abre em sua visão de mundo. Apesar do bloqueio da cidade, das prisões em massa e das tentativas das autoridades de encobrir o massacre, Lyudmila procura sua filha e percebe que nada daquilo está certo. Não sabemos como vai terminar a busca, mas percebemos que a vida da mulher nunca mais será a mesma. Assim como suas convicções. Sobretudo as políticas.
Konchalovskiy filma tudo em preto e branco, e com enquadramento 1.33:1 (tela quadrada), para dar a impressão que estamos vendo realmente um filme da época. Após duas horas de projeção, parece mesmo que vimos um documentário. “Caros Camaradas!” foi o filme escolhido pela Rússia para representar o país no Oscar de 2021, na categoria de ‘Melhor Filme Internacional’ (e, também, no equivalente britânico, o Bafta). Se não ganhou, é detalhe. Porque é um filme que realmente vale ser visto. Sobretudo nos tempos atuais.
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