Colhi do noticiário, enviado diretamente de Londres por correspondentes do jornal O Globo, as seguintes observações relativas ao transporte daquela cidade durante os Jogos Olímpicos: “O transporte público da capital inglesa superou todas as marcas, graças à movimentação em direção ao Parque Olímpico e ás outras instalações”; “O dia de maior movimentação no underground, o seu transporte subterrâneo, foi a sexta-feira que passou, dia 3, transportando 4,4 milhões de pessoas”; “O DRL, trem leve sobre trilhos, está experimentando um crescimento incrível de passageiros. Pela primeira vez transportou mais de 500 mil pessoas num único dia, o que significou uma elevação de 70% em relação aos dias normais”; “Outro meio de transporte que vive espírito olímpico é o trem. O recorde obtido a semana passada foi de 2,8 milhões de pessoas transportadas, um aumento de 27%”; “Até mesmo as bicicletas, que podem ser alugadas em quase todas as esquinas londrinas, entram para as estimativas. Em julho foram usadas por mais de 1 milhão de ciclistas”.
O Lord Mayor de Londres, (seu prefeito), considerou que, até agora (dia 7), está tudo mantido “dentro da normalidade de uma evento deste porte”. E o jornal termina a matéria de um correspondente com a pergunta, que eu também me faço: “O Rio de Janeiro terá condições de transportar tamanho volume de pessoas daqui a quatro anos?”. Pelo andar da carruagem tenho minhas dúvidas, e mais, temo por um vexame internacional.
O governo municipal optou pelo transporte rodoviário, ou seja, os BRTs, em vias mal bloqueadas e, já apresentando superlotação, exigindo um aumento da quantidade de coletivos articulados em circulação. Já alertamos que, para que o sistema semafórico prioritário para os BRTs funcione, exige um limite mínimo de intervalo entre os ônibus, caso contrário dará um nó no trânsito, ao longo de suas áreas de influência.
E o nosso sistema de trens a cargo da SuperVia? Não me atrevo a comentar, por estar fora da minha área de competência, embora, como ex-residente na Europa, seja um fã do transporte por trem. Durante os dois anos que morei em Haia, peguei, diariamente, o trem para Roterdã, que partia às 8h02. Funcionou, sem falhas, todos os dias úteis em que eu o utilizava.
É fundamental que se dê à população um transporte público que compense, em rapidez, preço e conforto, o fato de deixar o carro em casa. Enquanto não tiverem a coragem política de enquadrar o carro de passeio, com apenas o seu motorista nos horários de pico, criando o URV, o pedágio inteligente, atrelado à taxa de congestionamento, capaz de gerar recursos para subsidiar o transporte público, não teremos mobilidade urbana, nem um povo bem transportado. Quanto mais com o afluxo de turistas durante os Jogos Olímpicos, onde a sobrecarga no sistema de transportes é imprevisível.
O que realmente me preocupa é a nossa opção pelo transporte por ônibus, enquanto as reportagens originárias de Londres só elogiam o seu transporte sobre trilhos, e nada falam sobre os seus excelentes e tradicionais ônibus, de dois andares (os doble deck buses). Tão importante é o atendimento ao público que voluntários, não remunerados, orientam o público visitante como utilizar o seu underground, embora as orientações por sinalização e no seu mapa sejam à prova de quem não fale inglês.
A empresa Transport of London, responsável pela operação do transporte público, nas horas de maior movimento, para evitar o acúmulo de passageiros nas catracas, por várias vezes, liberou o embarque sem precisar passar por elas.
Podemos entender que o prefeito de Londres confiou todo o seu sucesso na mobilidade urbana, durante os Jogos Olímpicos, no seu meio principal de transporte, o seu underground, carinhosamente chamado pelos londrinos de “The Tube”, inaugurada sua primeira linha em 1868, com propulsão a vapor, explorando a recém-inventada fonte de energia, criada por Henry Fulton. Com suas 13 linhas, esse meio de transporte está honrando a confiança nele depositada. É a demonstração explícita da superioridade do transportes sobre trilhos, em vez do rodoviário, contrariando a escolha brasileira, tanto federal como municipal.
Tudo isso que aqui relato aumenta ainda mais o meu temor pelo sucesso da nossa mobilidade urbana na Olimpíada do Rio, daqui a apenas quatro anos. Que eu esteja redondamente errado no meu pessimismo, são os meus sinceros votos.
* Celso Franco, oficial de Marinha reformado (comandante), foi diretor de Trânsito do antigo estado da Guanabara e presidente da CET-Rio. - [email protected]