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O fim do regime DE nas universidades

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       O ensino médio é um lugar em que o professor reproduz o saber, embora possa também criar – principalmente quanto à didática. O ensino universitário põe o professor diante do desafio de criar o saber que ensina, ainda que também possa e deva reproduzir muito do saber existente. Essa característica do ensino universitário, que vem de sua origem, é que gera o movimento ideal de harmonia entre pesquisa e ensino.

        O professor universitário ensina porque pesquisa. Quando o ensino na graduação se mostra exageradamente reprodutor, então é necessário criar o setor de pós-graduação, para que a pesquisa continue sendo o carro-chefe do ensino universitário. Assim, o fundamental na universidade é que exista a chamada Dedicação Exclusiva (DE). Isto é, além das aulas, o professor universitário deve ter um tempo livre para se dedicar à pesquisa.

        Todavia, em um país como o nosso, com o ensino médio destroçado, os governos que assumem o comando da União, se veem pressionados a utilizar o que têm nas mãos para salvar a situação da classe média de cada região brasileira, em termos de aquisição cultural. Então, o governo federal empanturra as universidades federais com projetos que visam dar ensino cujo objetivo não é propriamente universitário, mas apenas uma forma de suprir demandas ou necessidades que, em uma situação regular, deveriam ser da competência do ensino médio, talvez do fundamental.

        Pouco esclarecida sobre o assunto, a maior parte da sociedade parece concordar com o governo: a universidade precisa cuidar de tudo que é defeituoso no país e, enfim, alfabetizar (em graus variados) todo mundo. Nessa linha, o governo empurra para as universidades federais muitos “programas bombeiros” (do Ensino a Distância - EAD - ao Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica - Parfor -, passando por mil e uma iniciativas). Para seduzir o professor no sentido de torná-lo um serviçal de segunda categoria é fácil: ele o faz por meio de bolsas de complementação salarial. O professor universitário jovem (entre 30 e 50 anos) logo se vê na obrigação familiar (às vezes ele têm mais filhos do que poderia) de pegar essas bolsas, parar de fazer pesquisa e seguir as demandas governamentais. Ao final de uns tempos, o próprio governo conseguirá, com isso, desvirtuar o DE e minar as universidades. Elas então se mostrarão o que não poderiam ser: grandes colégios.

        O resultado disso será o de não termos nem ensino médio nem mais universidade. Tudo poderá ser sucateado por meio da disfunção, e, assim, nos manteremos cada vez mais distantes de outros países ditos emergentes, que não estão adotando tal política. Aliás, no mundo todo, essa situação caracteriza apenas o Brasil. Somos os únicos países emergentes a insistir nessa política.

Paulo Ghiraldelli Jr. é filósofo, escritor e professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.