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1º de abril: o Dia Mundial da Mentira

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E a mentira neste contexto não é a inversão (invenção?) criminosa de uma realidade para favorecer descaradamente alguém – nem prejudicar descaradamente alguém.

É mais a manipulação de uma “taxa de realidade” para divertir, dar brilho, “crescer” aos olhos de outros, ou se desculpar por uma falta menor. Nem por acaso se diz que todo fato tem três versões: a minha, a sua ... e a verdadeira.

Há, ainda, os subprodutos da mentira: silêncio conivente, a meia verdade e até a meia mentira (também chamada de mentira social ou de conveniência). Se uma mulher com que não se tem intimidade pergunta: estou bem? (e não está), todas essas sub-mentiras  podem ser retiradas do cardápio acima em nome da gentileza.

Uma última possibilidade de faltar com a verdade sem ferir a consciência é a mentira piedosa. Alguém que diante de uma grande enfermidade do outro(a), ou de uma tragédia, “edita” a versão a ser contada.

Ah, sim, e tem ainda a “mentirinha carioca” – te ligo amanhã!

Ou a mineira: era aniversário do Tancredo e cruzando com ele no corredor do antigo Palácio Tiradentes, diz – já de longe – o José Maria Alckmin: enviei, hoje cedo, o telegrama com os cumprimentos! E Tancredo na bucha: recebi e já agradeci!

Mas e por que o 1º de abril é universalmente consagrado à mentira ou, para os mais lights, à pegadinha dos bobos? Vamos lá: reza a lenda que a tradição surgiu na França. Até o começo do século XVI, o Ano Novo era festejado no dia 25 de março, data que marcava a chegada da primavera (e não 22,23 como atualmente). As festas duravam uma semana e terminavam no dia 1ºde abril.

Em 1564, depois da adoção do calendário gregoriano, o rei Carlos IX  determinou que o ano novo seria comemorado no dia 1º de janeiro. Alguns franceses resistiram à mudança e continuaram a seguir o calendário antigo, pelo qual o ano iniciaria em 1º de abril. Gozadores passaram então a ridicularizá-los e a enviar presentes esquisitos e convites para festas “de réveillon” que não existiam, troca de presentes, etc. E no dia seguinte, a gozação: ha! ha! caiu no primeiro de abril!

Isso, hoje, pode parecer estranho, mas imaginem para os cidadãos das zonas rurais, numa época em que as notícias viajavam lentamente e alguns “caipiras” ficavam sem saber “notícias de Paris” durante meses, ou anos. 

Por volta de 1800,  essa tradição se espalhou por toda a Inglaterra e, a seguir, para todo o mundo. No Brasil, o primeiro Estado a aderir ao “espírito da coisa”  foi Pernambuco, onde uma barriga foi publicada e desmentida no dia seguinte.  Um jornal noticiou em 1º de abril de 1848,  o falecimento de D. Pedro II.

O Imperador tirou de letra: soube, filosofou sobre a morte e jantou em Petrópolis, com a família, tranquilamente. Canja e uma taça de vinho. (D. Pedro II comia moderadamente, rompendo a tradição glutã dos Braganças, formidáveis comilões...)

Mas, e para frear essa glamourização da mentira, primeiro um escritor italiano chamado Carlo Collodi escreveu um conto – As Aventuras de Pinocchio, em 1883 –no qual um personagem de ficção, feito de madeira por um entalhador chamado Geppetto, sonhava ser um menino de verdade e, para isso, aprendeu a não mentir, ser correto, etc. 

Quase 60 anos depois, Walt Disney produziu um clássico do cinema – Pinóquio -- personagem do filme de 1940 de mesmo nome. E o enredo é o mesmo: ele é uma marionete viva que deve provar-se digno de se tornar um menino de verdade, com a ajuda do Grilo Falante como sua consciência. Walt Disney e sua equipe utilizaram um modelo de marionete e um ator mirim, Dickie Jones (que deu voz a Pinóquio no filme), para animar o personagem, uma versão construtiva da verdade e uma lição para a garotada.

Mais quarenta anos e aqui no Brasil outro mestre do discurso infantil dirigido para o adulto – ou vice-versa – o grande  Ziraldo, também criou em 1980 “o seu Pinóquio tropical” – O Menino Maluquinho, hoje em versão online na internet. Também ele combate a mentira e descobre o mal que provoca nos outros fingir, trapacear, mentir em suma.

Numa versão light, certos povos não chamam de Dia da Mentira e sim de Dia do Bobo, ou tolo. Na Inglaterra é chamado de Noodle Day (pateta). Na França, de poisson d'avril (peixe de abril); na Escócia, de april gowk (tolo de abril); nos Estados Unidos, de april fool.

Vai por aí. Porque talvez e no fundo, no fundo, que tem razão é o Mário Quintana, quando diz que “a mentira é uma verdade que se esqueceu de acontecer”.

É, pode ser.