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Com UPP, venda de drogas migra da favela para o 'asfalto'

Pesquisa mostra 69% dos cariocas percebem crescimento da prática no Rio

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A socióloga e coordenadora da ONG Rio Como Vamos (RCV), Thereza Lobo, acredita que os modelos de Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) implantados nas comunidades cariocas podem estar se refletindo diretamente na percepção da população do Rio de Janeiro de que os pontos de venda de drogas estão aumentando no Estado. Para Thereza, a ocupação dos morros pode estar provocando o deslocamento dos traficantes para as áreas urbanas e contribuindo com a disseminação das drogas. A tese da socióloga foi baseada na pesquisa realizada pela RCV, com o tema "Ordem Pública e Ocupação dos Espaços Públicos no Rio de Janeiro". Dos 1500 entrevistados, 69% apontaram a disseminação das drogas como o problema que mais incomoda na cidade.   

"O resultado da pesquisa que realizamos pode estar ligado ao nosso modelo de UPP, que não se relaciona diretamente com as questões das drogas, mas com o policiamento nas comunidades e a ocupação armada desses espaços. Com isso, os traficantes procuram outras alternativas. Apesar de não termos os dados oficiais, a população já observou, já percebeu esse processo", explicou a coordenadora do RCV. 

Já na visão do professor do Laboratório de Análises da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Ignácio Cano, essa percepção do carioca sobre o aumento dos pontos de venda de drogas pode estar sofrendo a interferência da difusão massiva das cracolândias na imprensa nacional, nos últimos tempos. Ignácio explica que as políticas públicas voltadas para as questões do consumo e venda de drogas nos centros urbanos deram ênfase ao assunto nas mídias, despertando o olhar crítico da população para o problema e interferindo na sua percepção mediante outras causas sociais. 

"As imagens que são mostradas do uso de crack, por exemplo, são impactantes e despertam mais a atenção da população. Então, apesar de não termos os dados oficiais sobre o aumento de venda desses tipos de drogas na cidade, que seriam dados policiais, a população fica impressionada com o assunto. A questão da internação compulsória também foi amplamente debatida nos veículos de comunicação, contribuindo com essa percepção comprovada na pesquisa", comentou Ignácio.

Na sua quarta edição, a pesquisa de percepção realizada pela RCV foi realizada nos meses de maio e junho deste ano. O estudo foi elaborado pela RCV e executado pela empresa de pesquisa digital e gestão do conhecimento do consumidor, M.Sense. Avaliando os dados alcançados, Thereza Lobo destacou que eles demostram o crescente grau de atenção do carioca desde a realização do último estudo feito pela organização, em 2011, e a população está mais exigente. "Eles só chegaram a conclusão de que o problema mais grave da cidade é a venda de drogas porque estão atentos às mudanças no cotidiano urbano", destacou a coordenadora.  

Segundo ela, a pesquisa foi realizada integralmente pela internet, obedecendo aos mesmos critérios das anteriores, ou seja, a diversificação dos fatores sociais, como renda familiar, idade, gênero e área de residência dos entrevistados. Das cinco questões abordadas no questionário com o intuito de mensurar o grau de insatisfação do carioca, a preocupação com o aumento dos pontos de venda de drogas imperaram na pesquisa. Os dados não têm bases de estatísticas públicas, mas refletem as opiniões dos moradores.

A Rio Como Vamos realiza a pesquisa de percepção de dois em dois anos, sempre abordando os mesmo temas relacionados à Ordem Pública e Ocupação dos Espaços Urbanos e mantendo o mesmo questionário para avaliar as mudanças no comportamento do carioca nesses períodos. Cerca de 30 áreas são avaliadas, através das abordagens presencial e internet. O questionário solicita ao entrevistado para classificar os problemas que eles consideram mais graves na sua cidade, usando uma escala de 1 a 10. Os tópicos listados foram "aumento dos pontos de venda de drogas", a "quantidade de moradores de rua", a "atuação da guarda municipal", o "nível de ruído no bairro" e a "eficiência da sinalização nas ruas da cidade".