Quando a polícia invadiu alto do morro da Vila Cruzeiro, a casa de Daniele Cristina da Silva Nicanor, 22 anos, tinha cerca de 15 pessoas no seu interior. Primos, sobrinhos, vizinhos e colegas de trabalho haviam se refugiado lá, com medo dos tiros. A casa de alvenaria, composta de sala, cozinha, quarto e banheiro estava uma das janelas abertas. Com a aproximação de um helicóptero da polícia, Ronald Henrique Nicanor, 21 anos, primo de Daniele decidiu fechá-lá. Foi atingido com um tiro no braço direito.
"A situação que estamos vivendo é muito grave, é muito duro você estar dentro de casa e ver seu marido ferido dessa maneira", afirmou Mara Francisco da Cunha, mulher da vítima, grávida de três meses.
Daniele descreve a situação: "a casa estava cheia de crianças e estava todo mundo apavorado. O Ronald é trabalhador, camelô. Não foi trabalhar hoje com medo desse cerco todo", afirmou. De acordo com ela, ele vende relógios e pulseiras na Uruguaiana, região de comércio popular do Rio de Janeiro. "Não sei de onde veio o tiro, mas veio de cima. Sangrou muito", disse.
Daniele se disse inconformada com a atuação da polícia, diferente das comunidades que foram pacificadas. "Para a implantação das Unidades Pacificadoras de Polícia (UPPs) não morreu nenhum morador, nem houve confronto. Qual é a diferença aqui? Bandido não é bandido sozinho. Para cada um que tem aqui, são vários em Brasília", disse.
Segundo ela, o rapaz foi socorrido por um pedreiro que passava pelo local e chegou ao Hospital Getúlio Vargas, no bairro Penha, em cerca de 20 minutos. "Pela minha família eu vou até o inferno. Paramos o carro na rua e ele nos trouxe aqui. Enrolamos o braço dele com uma faixa para não perder sangue", afirmou.
O homem que socorreu a vítima disse ter feito apenas a sua obrigação. "Não se pode negar ajuda a ninguém. Eu o trouxe aqui e espero que ele saia bem".
Feridos na quinta-feira
Após o confronto desta tarde de quinta-feira, seis feridos, incluindo Ronald, deram entrada no Hospital Getúlio Vargas, próximo à comunidade de Vila Cruzeiro, segundo os dados da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro.
Além de Ronald, José Pereira, 32 anos, levou um tiro no tornozelo esquerdo e já teve alta; Osmar Sabino Julião, 21 anos, levou um tiro no glúteo e já teve alta; Bruno da Silva, 24 anos, levou um tiro no braço esquerdo e deve ter alta até o fim do dia; José Dantas, 43 anos, foi ferido por estilhaços de fuzil e continua internado; Marllon José Barbosa, 16 anos, levou um tiro no braço esquerdo e deve passar por cirurgia.
Na quarta-feira, outras 21 pessoas deram entrada no hospital feridas pelos conflitos, sendo que quatro delas morreram.