Felipe Sáles, JB Online
RIO - Só depois de 81 anos e da doença que hoje restringe sua liberdade, o pescador Jorge Carvalho abandonou a casa onde uma parteira o trouxe ao mundo na Aldeia Imbuí, um recanto da Praia Jurujuba, em Niterói, isolado entre duas montanhas e sitiado pelo Forte Imbuí, construído pelo Exército brasileiro em 1901. Desde 1886, porém, as primeiras famílias se estabeleceram naquele pequeno pedaço de paraíso onde militares e civis conviviam pacificamente, ao ponto de Dona Flora, avó de Jorge, ter costurado a primeira bandeira brasileira a tremular no alto do Forte. Mas, a partir do golpe militar de 1964, iniciou-se uma batalha pelas terras que, por decisão da Justiça, será encerrada dentro de três semanas, para o desespero das 32 famílias que resistem a desmandos e às dificuldades de ir-e-vir no lugar onde três gerações nasceram e morreram.
Meu filho ainda mora lá, tenho medo de que ele não tenha para onde ir contou Seu Jorge, que devido às dificuldades em chegar à sua antiga casa e à necessidade de ir constantemente ao médico, hoje mora com a filha na comunidade Salineira, que fica em frente ao Forte. Só saí de lá por causa da doença. Minha vida toda foi essa confusão, e cedo ou tarde, eles vão vencer. Não temos como lutar contra eles.
Réveillon no Forte
A aldeia fica em terras da união e é controlada pelo 21º Grupamento de Artilharia de Costa. Além de reunir a tropa, o espaço também serve a festas de Réveillon, casamentos e até rodeios. Procurado, o Exército informou que só poderia falar sobre o caso na segunda-feira.
Assim como os moradores, a imprensa também não pode chegar à aldeia sem prévia autorização de no mínimo uma semana. Todos os moradores possuem carteiras de identificação, mas visitantes devem informar o nome na portaria do Forte com até uma semana de antecedência. Civis que desejarem ir à praia devem reservar com um ano de antecedência e ainda pagar uma taxa, não informada pelos militares. A única entrada para a aldeia é pelo Forte e leva cerca de 30 minutos.
Há rumores de que a idéia é fazer da aldeia um resort, e moradores dizem que representantes de uma empresa francesa até já estiveram no local contou o presidente do Conselho Comunitário da Orla da Baia de Niterói, José de Azeredo. O Exército diz que os moradores serão retirados à força, e todos estão dispostos a resistir.
Os moradores já estão fazendo um abaixo-assinado e, ontem, o presidente da Associação de Moradores da Aldeia Imbuí, Aílton Navega, foi à Câmara dos Vereadores de Niterói buscar apoio à causa. Além disso, todos os domingos, os moradores fazem um protesto no Campo de São Bento, em Icaraí, a fim de angariar apoio da população. Ecologistas também já compraram a briga. Os ânimos, porém, vêm se exaltando: em outubro, o carro de um moradores foi atingido por um tiro devido a um desentendimento entre o condutor e os militares da guarda do Forte.
O prazo dado à Justiça Federal foi até o início de fevereiro, não sabemos o que pode acontecer reclamou o ecologista Cássio Garcez. A Justiça não está sendo justa, pois eles estão lá há muito mais tempo, a comunidade não cresceu e são todos pescadores descendentes das mesmas famílias.