Carolina Bellei, Jornal do Brasil
RIO - Quando criança, a pequena Flávia freqüentava o Café Lamas, no Flamengo, para saborear um dos pratos mais tradicionais da cidade, o Filé à francesa. Ela ainda não sonhava em ser a chef de cozinha Flavia Quaresma, proprietária do Carême Bistrô e referência na alta gastronomia brasileira. Apenas acompanhava o pai, que há muito elegeu o prato como um dos seus prediletos. E não foi só ele. Com 134 anos, o Lamas hoje tem como carro chefe o Filé à francesa, que passou a fazer parte do cardápio nos anos 40.
Comecei a frequentar o Lamas com o meu pai, e o hábito continua até hoje conta Flavia, que lembra:
O meu pai sempre pedia o filé.
Em média, são 70 mesas por dia que optam pelas 300 gramas de filé na chapa, com batata palha, cebola, presunto e petit-pois. De acordo com o historiador Milton Teixeira, o prato foi uma sugestão de um cliente francês que costumava pedir o filé com estes acompanhamentos. Primeiro era chamado de Filé ao francês, só depois virou à francesa.
Esse é o prato mais conhecido e o mais vendido conta Milton Brito, um dos três sócios da casa, que faz questão de ressaltar:
Não tem nenhuma casa que sirva um filé tão bom quanto o nosso, é imbatível.
Sem igual
Conhecedor dos tradicionais restaurantes do Rio, o sambista Moacir Luz concorda que as casas que criaram os pratos levam vantagem em relação aos outros restaurantes, que servem pratos com os mesmos ingredientes e nome.
Em Santa Teresa tem um restaurante que faz a Sopa Leão Velloso muito bem, mas não é igual a do Rio Minho conclui Moacir.
O historiador Milton Teixeira contesta a paternidade da sopa de frutos do mar, que segundo ele surgiu no restaurante ao lado do Rio Minho, no Cabaça Grande, também no Centro, que fechou há 10 anos. Apesar de estar à frente dos balcões há apenas 30 dos 124 anos do restaurante, o proprietário, o espanhol Ramón Dominguez, não abre mão da criação da casa. Mas quanto a origem do prato não há dúvida:
A sopa Bouil Labasse, de tradição francesa, era feita com quatro tipos de peixes. Como o embaixador Leão Velloso não gostava da mistura de peixes, pedia para trocar por crustáceos.
O prato foi criado e ganhou o seu nome explica Teixeira
A invenção do embaixador agradou os cariocas. Além de estar em cardápios de toda cidade, Dominguez revela que são consumidos cerca de 90 litros por semana só de caldo da sopa. E para garantir a qualidade, ele faz questão de comprar os ingredientes frescos todos os dias.
Jorge Querino Santino sócio do restaurante Cosmopolita, na Lapa, criador incontestável do famoso Filé à Oswaldo Aranha diz que a qualidade e o cuidado no preparo do prato são quesitos que fazem a diferença.
Em toda a cidade são vendidos filés com esses acompanhamentos, mas as pessoas vêm aqui só para experimentar o nosso, onde o prato foi criado. E depois voltam brinca Santino, que completa:
Não abro mão de um bom fornecedor e que o preparo seja feito na hora. Não sei como podem servir batata portuguesa murcha. Aqui não é assim de jeito nenhum.
Talvez seja esse o sucesso do restaurante de 82 anos, que criou o prato em homenagem ao ministro do governo Getúlio Vargas na década de 30, que sempre pedia a carne com bastante alho, batatas portuguesas, arroz branco e farofa. Hoje, cerca de 200 quilos de filé são vendidos por semana na casa.