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Uma festa ordeira e silenciosa no 2º turno

Votação dessa vez não teve fila nem confusão nas seções eleitorais, mas tampouco teve empolgação nas ruas

Bruno Kaiuca -
Cristine foi à igreja pedir "Ele não" a São Judas Tadeu
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O segundo turno das eleições, no Rio de Janeiro, transcorreu com tranquilidade. Nas seções eleitorais, as filas que causaram demoras e tumultos, no primeiro turno, sumiram. O que também sumiu, na cidade, foi empolgação. Pelas ruas, um clima morno para um “dia de decisão”. Os adesivos nas roupas — também conhecidos como praguinhas — eram as principais manifestações, geralmente, relacionadas à eleição presidencial.

Como o seguro morreu de velho, Luciana Vasconcelos escolheu a dedo a roupa para ir votar. “Vim disfarçada de Bolsonete”, contou ela que criou um vestido a partir de uma bandeira do Brasil. Ela queria evitar ser hostilizada, como aconteceu no primeiro turno, quando optou por roupas vermelhas em referência ao seu candidato, Fernando Haddad.

Travesti, Luciana vota no Centro de Convenções SulAmérica, na Cidade Nova, local com maior número de seções eleitorais no Rio: 32, com um total de 14 mil eleitores. O local, no primeiro turno, foi um dos mais tumultuados, em toda a cidade, com a ocorrência de longas filas.

“Fui cuspida, me jogaram garrafa de água. E eu quieta, parada na fila. Nessas horas, clamo a Jesus. Não sou louca de reagir. Isso aqui, da outra vez, estava lotado. Hoje está tudo bem mais tranquilo”, afirmou ela, que fez selfies e vídeos para suas redes sociais, no local de votação, onde também conversou com os mesários.

Aos 39 anos, ela trabalha bem próximo ao Centro de Convenções, mais precisamente, na Prefeitura do Rio, no prédio “carinhosamente” apelidado pelos cariocas como “piranhão”. É assessora da Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual (CEDSRIO). A todos com quem conversava, na seção, tentou ganhar voto para o seu candidato. “Eu só quero continuar vivendo”, afirmava ela, na sua “campanha”.

Em Copacabana, o casal Katia e Lúcio Campos se diziam confiantes com a vitória dos seus candidatos: Jair Bolsonaro para presidente e Wilson Witzel, para o governo do Rio. Professores universitários aposentados, estavam satisfeitos por não terem encontrado filas no local de votação, ao contrário do que aconteceu no primeiro turno. Com dois dos quatro filhos no exterior, Katia, de 57 anos, afirmou que, se Bolsonaro perdesse as eleições, eles não retornariam ao Brasil. Mas mostrou confiança na vitória do seu candidato: “Aqui no nosso bairro, o nível de instrução é mais elevado, então, naturalmente há mais eleitores do Bolsonaro. Quanto maior o nível de escolaridade, mais Bolsonaro cresce. Já fomos simpatizantes do PT. Agora, aprendemos”, afirmou ela.

No mesmo bairro, a família Rosa dava um exemplo de democracia. O casal Augusto Sérgio e Vera Lúcia é eleitor de Bolsonaro, ao contrário da filha Fabiana, que ostentava um adesivo “#EleNão” na roupa. Cada um deles vota em um local diferente, nas proximidades, mas foram juntos em todas as seções. Engenheiro, Augusto Sérgio, de 65 anos, disse que, para o governo do Rio, votou em Witzel “porque desde (Leonel) Brizola o estado só teve governo de esquerda”. Para presidente, escolheu Bolsonaro, porque acredita que o candidato vai unir o país.

A advogada Vera Lúcia, de 60 anos, acredita que Bolsonaro, “por ser liberal e nacionalista”, vai buscar fazer do Brasil “um país mais igualitário”. Ela disse que estava “amando” passear tranquilamente pelas ruas com sua blusa amarela, junto com a filha, de blusa vermelha: “O Brasil está lapidando sua democracia. Estamos dando um exemplo para o mundo”, afirmou ela, no que a filha discordou com firmeza. “Acredito que a democracia, no país, está em perigo. É preciso ter um governo que advogue pelas minorias”, disse ela, no que foi rebatida pelo pai. “A esquerda fraciona a sociedade em minorias para jogar uns contra os outros”, afirmou ele, no que teve a concordância da esposa.

Fabiana, de 29 anos, tem duas irmãs. Ela é a filha do meio. Estudante de Engenharia na Universidade Veiga de Almeida, é a única simpatizante do PT na família. Entre olhares para os pais, conta que nem sempre é fácil conversar sobre política em casa: “Muitas vezes, até evito comentar alguns assuntos”, admitiu ela, no que a mãe minimizou. “Democracia é isso. Cada um pensa o que quer”.

No Cosme Velho, a cor vermelha predominou. Se por lá eleitores demonstravam pelos adesivos sua simpatia pelo PT, o reforço na cor veio por conta de São Judas Tadeu, que tem um santuário no bairro. Ontem se comemorou o dia do santo.

Entre fitas e flores predominantemente de cor vermelha, a socióloga Cristine Ribeiro, de 65 anos, foi até a igreja, segundo ela, para fazer um único pedido: “ele não”. “Ele é o santo das causas difíceis, então vim pedir pela vitória do (Fernando) Haddad, porque o Brasil não merece passar outra vez pelos horrores da ditadura”, afirmou ela que, na época em que estudava Sociologia na Universidade Federal Fluminense (UFF), passou “alguns sufocos”.

Um desses, relatou, foi ter que passar por um “corredor polonês”, formado por policiais com cassetetes na mão. “Eles estavam procurando por alguém. Bastava cismar com a cara de um de nós para nos bater. Esse é o grande problema da ditadura, basta cismarem com você”, afirmou ela, que é moradora de Santa Teresa e também achou “bem mais tranquilo” votar no segundo turno, em comparação com o primeiro. “Vim pedir força para seguir em frente. Vamos precisar”, disse.

Infarto nas seções

Dois mesários morreram, ontem, durante o horário de votação, nas suas respectivas zonas eleitorais. Ambos sofreram um infarto. Segundo o TRE-RJ, a eleição no estado teve quatro pessoas presas por crimes eleitorais. Três prisões foram em Aperibé, cidade do interior fluminense em que ocorreu também eleição suplementar para prefeito. A quarta prisão foi em Miguel Pereira. Os motivos das prisões foram boca de urna, divulgação de propaganda eleitoral e compra de voto. Ao todo, 404 urnas foram substituídas no estado.

Briga

Apoiadores de Jair Bolsonaro que acompanharam a apuração de votos na Praça São Salvador, em Laranjeiras, provocaram simpatizantes do candidato adversário. Após a divulgação da vitória do candidato do PSL, houve confusão, dissipada por policiais do 2º Batalhão da Polícia Militar (BPM), de Botafogo.