"Isso aí que teve troca de tiros, que eles foram atacados, é tudo mentira", disse Elias Cesar, 36, no Instituto Médico Legal (IML), no Rio de Janeiro, na manhã deste sábado (21).
Ele está no IML junto com outros familiares de Ágatha Félix, 8, que morreu após ser atingida por um tiro na noite de sexta-feira (20), no Complexo do Alemão, na zona norte do Rio de Janeiro.
A revolta de Elias é uma das respostas às declarações da Polícia Militar do Rio, que afirmou, em nota e nas redes, que agentes da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) Fazendinha, localidade do Alemão, foram atacados ao mesmo tempo de vários pontos da comunidade e revidaram.
"Após o confronto, não foi encontrado feridos na varredura do local. Na sequência, os policias foram informados por populares que um morador teria sido ferido na localidade conhecida como "Estofador". Uma equipe da UPP se deslocou até o Hospital Getúlio Vargas e confirmou a entrada de uma criança de 8 anos ferida por disparo de arma de fogo.", diz a nota.
Mas a tese do confronto, endossada pelo governo do estado do Rio em outra nota, foi negada por Elias.
"Estavam na kombi e pararam ali na Birosca [uma localidade no complexo], veio um maluco de moto e a polícia mandou parar. O maluco não parou, foi embora, sem arma nem nada, e a polícia atirou. Não teve tiroteio, o único tiro que teve foi o deles, fatal, foi o que tirou a vida da nossa sobrinha", disse.
Um amigo da família, que não quis se identificar, confirmou à Folha de S.Paulo a versão da família.
A história gerou repercussão nas redes sociais. Moradores do Alemão organizaram protestos contra a morte e as declarações da polícia.
Rodrigo Mondego, da Comissão de Direitos Humanos da OAB, acompanha o caso no IML e disse que a mãe está em estado de choque e que ela e o motorista da Kombi --que socorreu a criança ao hospital-- viram de onde partiu o tiro.
"Infelizmente, mais um caso de morte por intervenção militar no Rio. Os indícios dizem que o tiro partiu da polícia militar. Todo mundo viu que ele [motoqueiro] não estava armado", disse.
Ágatha foi internada no Hospital Getúlio Vargas, mas não resistiu e morreu durante a noite de sábado (21).
A Defensoria Pública do Rio de Janeiro também se manifestou sobre o caso.
"A opção pelo confronto tem se mostrado ineficaz: a despeito do número recorde de 1.249 mortos em ações envolvendo agentes do estado apenas este ano, a sensação de insegurança permanece. No caso das favelas, ela se agrava.", afirmou, em nota.
(Lucas Lacerda e Nicola Pamplona - FolhaPress)