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Tesourada de Crivella afeta 644 mil

Cada uma das 184 equipes de saúde a serem cortadas pela prefeitura atende média de 3.500 pessoas, segundo Sindicato dos Médicos

Marcos Tristão -
Na clínica Ricardo Lucarelli, no Estácio (acima), profissionais trabalham com salário atrasado
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O corte de 184 equipes de saúde da família — com o fim de 1.400 postos de trabalho de profissionais que atuam em clínicas no município do Rio de Janeiro — afetará 644 mil pacientes. É o que estima o diretor do Sindicato dos Médicos do Estado do Rio de Janeiro (SinMed), Alexandre Telles, levando em conta que cada equipe da família atende cerca de 3.500 pacientes.

A tesourada em R$ 184 milhões na rede pública está só no início, mas os pacientes já estão sentindo os efeitos da contenção de despesas da prefeitura. Enquanto a população reclama da falta de remédios, os funcionários se queixam de salários atrasados. A decisão, segundo a Prefeitura do Rio informou no mês passado, veio “após um detalhado estudo técnico, formado por técnicos das secretarias municipais de Saúde, da Casa Civil e da Fazenda”.

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Na clínica Ricardo Lucarelli, no Estácio (acima), profissionais trabalham com salário atrasado (Foto: Marcos Tristão)

Com a medida, a cobertura de atendimento, que desde 2016, é de 70% da população do município, cairá para 55%. No mês passado, quando o corte foi anunciado, o secretário da Casa Civil, Paulo Messina, avaliou que o crescimento “foi cadenciado até 2016”, quando deu “um salto maior do que a capacidade da Prefeitura de manter o serviço”. Ainda de acordo com informações da prefeitura, “quase 300 equipes foram contratadas no segundo semestre de 2016, ano eleitoral, e foram distribuídas para regiões que já contavam com boa cobertura de saúde”.

“A cidade do Rio chegou a 70% de cobertura de saúde da família, mas está dando um passo atrás. A atitude do prefeito demonstra retrocesso social e descompromisso. Antes mesmo do corte de profissionais já anunciado, a falta de repasse já está afetando as unidades, onde muitos funcionários trabalham com salários atrasados”, conta Telles.

Na área de planejamento 3.1, que engloba toda a região da Leopoldina, os núcleos de apoio à saúde da família foram extintos. Ao todo, 15 profissionais foram dispensados. Segundo o Sindicato dos Médicos, na lista de demitidos estavam psicólogos, assistentes sociais, psiquiatras e fisioterapeutas. Mas a lista de corte ainda é extensa. Segundo circula num grupo de WhatsApp de profissionais da rede de atenção básica, serão demitidos 200 médicos com contrato de 40 horas, 200 enfermeiros e 200 técnicos de enfermagem, mas a prefeitura já informou que, ao todo, serão 1.400 demitidos.

No Centro Municipal de Saúde Heitor Beltrão, na Tijuca, trabalham oito equipes. A notícia de que uma delas será cortada preocupa a todos. O movimento ali é intenso. Apesar do salário atrasado, os funcionários não param. A qualidade do atendimento, no entanto, é alvo de queixas. Aloísio Cunha, de 74 anos, esteve na unidade para marcar uma consulta com um urologista, por meio do Sistema Nacional de Regulação (Sisreg), mas encontrou o sistema fora do ar.

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Na Tijuca, Aloísio Cunha não conseguiu fazer consulta com urologista (Foto: Marcos Tristão)

A aposentada Rachel Rosenberg, de 63 anos, reclama, por sua vez, da diminuição de visitas das equipes. “Sumiram lá de casa. Antes, sempre apareciam, levavam os pedidos de procedimentos médicos”, lembra ela, que passou a usar os serviços da clínica há três anos, quando cancelou seu plano de saúde. A explicação para a justa queixa de dona Rachel vem de uma das oito médicas que atuam na unidade. “Já tivemos uma redução de agentes comunitários no início da gestão do atual prefeito. Antes eram pelo menos sete agentes em cada equipe. Com mais cortes, teremos prejuízo no atendimento”, antecipa ela, que hoje conta com quatro agentes de saúde em sete equipes e outros cinco numa oitava.

O mesmo aconteceu com a clínica da família Ricardo Lucarelli Souza, no Estácio. No início do ano, eram 48 agentes de saúde — o número baixou para 34, 30% a menos. A unidade também consta de uma listagem extraoficial de cortes que corre entre funcionários. Logo na entrada do posto, um cartaz informa o número de pacientes cadastrados ali: 25 mil. A maioria do Complexo do São Carlos. “Estamos sem internet há três semanas, o que impede a inserção de pacientes no SISREG. Também tem alguns remédios faltando, mas a principal carência tem sido a de mão de obra”, diz uma agente comunitária de saúde. Procurada, a Prefeitura do Rio informou que vai apurar os problemas.

Ação da Câmara contra cortes

Um grupo de vereadores, entre eles Paulo Pinheiro (PSOL), médico e integrante da Comissão de Saúde da Câmara Municipal, ingressou com ação popular no Ministério Público do Rio na última quarta-feira. A tentativa é de interromper a ação de “reestruturação” de Crivella. “Queremos uma liminar para suspender esse absurdo”, criticou. Segundo Pinheiro, 4,4 milhões de pessoas estão cadastradas nas clínicas de saúde da família: “No ano passado, o Orçamento aprovado para a Saúde foi de R$ 6 bilhões. Este ano, a prefeitura enviou uma proposta de cerca de R$ 5,2 bilhões de Orçamento. São mais de R$ 700 milhões de corte”.

Marcos Tristão - Na Tijuca, Aloísio Cunha não conseguiu fazer consulta com urologista
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