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Juiz quer 'reconstituição virtual' de tragédia da Kiss

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Mais atento do que nunca às questões que cercam o processo criminal da tragédia da Boate Kiss, o titular da 1ª Vara Criminal de Santa Maria (RS), juiz Ulysses Fonseca Louzada, manifestou, na manhã desta quinta-feira, o interesse para que seja feita uma “reconstituição virtual” do incêndio na casa noturna, que causou a morte de 242 pessoas e deixou mais de 600 feridas na madrugada de 27 de janeiro. O anúncio foi feito após mais um pedido da defesa para que seja permitido o ingresso de peritos particulares na Kiss. Duas vítimas foram ouvidas pela manhã. Mais uma vai falar à tarde.

O primeiro depoimento desta quinta-feira foi do policial civil Rodrigo Souza da Silveira, 35 anos. Ele contou que só entrou na Kiss por volta das 1h30 do dia 27 de janeiro porque estava passando na frente da boate e foi convidado a entrar pelo gerente da casa, Ricardo de Castro Pasch, que já era seu amigo e lhe deu uma cortesia para não pagar ingresso.

Silveira relatou detalhes a respeito das dificuldades para sair da Kiss na hora em que o tumulto começou por causa do incêndio. “Em questão de segundos, baixou uma cortina preta de fumaça e foi um ‘Deus nos acuda’. Não era mais racional, era um instinto de sobrevivência”, disse.

O policial civil tinha acabado de sair do banheiro perto da porta de saída. Ele estava pedindo uma bebida em um dos bares e percebeu que algo estava errado. Inicialmente, até pensou que fosse briga. Diante do tumulto das pessoas para sair, ele até percebeu que algumas iam para o lado errado. “Eu tinha certeza que a saída não era por ali. Tinha vontade de gritar, mas não tinha forças”, relatou Silveira, que chegou a ser cortar em algum dos guarda-corpos perto da saída que havia quebrado pelas pessoas nos momentos de desespero.

Depois que o juiz Louzada fez as perguntas que desejava, houve um pequeno bate-boca entre o promotor Joel Oliveira Dutra e advogados de defesa sobre quem questionaria a vítima primeiro, já que ela havia sido listada por um dos defensores. No fim, tudo seguiu na ordem costumeira, com o Ministério Público dando início às questões, seguido pelos assistentes de acusação e pelos advogados de defesa.

Após a pequena discussão, Rodrigo Souza da Silveira seguiu com seu depoimento. Como ele não viu o início do fogo, seguiu com o relato sobre a saída das pessoas da Kiss. “Era idade média, tempo das cavernas. Cada um por si tentando sair. Não havia ninguém orientando a saída”, disse. E acrescentou: “demorei uns 40 segundos para sair, mas isso (naquela situação) era uma vida”. O policial também destacou que os guarda-corpos dificultaram bastante a evacuação. “As grades eram um brete. O povo parecia gado”, comparou Silveira.

Antes do segundo depoimento desta quinta, o advogado Omar Obregon, que defende o vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos, fez um requerimento para que seu cliente esteja ausente nos depoimentos que serão feitos em outras cidades, por meio de cartas precatórias. Ele também pediu que os advogados que estiverem representando a defesa, seja como defensor nomeado ou público, não façam perguntas nas audiências que ocorrerem fora de Santa Maria. Nesse quesito, Obregon foi acompanhado por outros advogados de defesa.

O advogado do vocalista reiterou que gostaria de ver o cenário da Kiss preservado, para que fosse feita uma vistoria particular, mesmo pedido que já havia sido feito pela defesa do sócio da Kiss Elissandro Spohr, o Kiko. O juiz Ulysses Louzada, em manifestação anterior, já havia negado às defesas o acesso à boate por causa dos riscos à saúde.

A resposta do juiz aos pedidos dos defensores veio após a 1ª Vara Criminal receber um ofício do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest), sediado em Santa Maria. Profissionais do Cerest recolheram amostras de resíduos do interior da casa noturna, no dia 26 de março, e depois enviaram o material para análise do Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), vinculada ao governo paulista. O exame apontou a presença de 17 produtos químicos no pó residual que estava na Kiss.

Diante dos riscos, o juiz comentou que quer que seja feita uma “reconstituição virtual” dos fatos ocorridos no dia da tragédia. Para fazer isso, o magistrado disse que vai pedir a ajuda da Justiça Federal.

Em relação às audiências para ouvir vítimas que serão fora de Santa Maria, Louzada se manifestou, informalmente, que pretende acompanhá-las nas outras cidades, para garantir que tudo ocorra da melhor maneira.

Duas audiências já têm datas marcadas: uma em Rosário do Sul (RS), em 23 de setembro, e outra em Uruguaiana (RS), em 25 de setembro. Essa última, garantiu o juiz Louzada, terá a data alterada, pois haverá audiência nesse mesmo dia em Santa Maria. As que vão ocorrer em Horizontina (RS), Passo Fundo (RS) e Quaraí (RS) ainda não foram marcadas. Uma vítima que iria depor em Caxias do Sul (RS) não foi localizada, mas os advogados do sócio da Kiss Mauro Hoffmann, Mário Cipriani e Bruno Seligman de Menezes, reforçaram que gostariam que ela seja ouvida . Uma nova tentativa deve ser feita em breve.