Brasília – A Fundação Nacional do Índio (Funai) aguarda a Justiça fazer a notificação dos ocupantes ilegais da Terra Indígena (TI) Marãiwatsédé, pertencente aos índios xavantes, para iniciar a desocupação da área de 165 mil hectares, localizada no norte do Mato Grosso (nos municípios de São Félix do Araguaia e Alto Boa Vista). O plano para a retirada pacífica dos ocupantes foi apresentado à Justiça.
Advogados dos fazendeiros dizem que 7 mil pessoas ocupam o território, número não confirmado pela Funai. A data exata do início da operação (prevista para setembro) ainda não está definida e, por razões estratégicas, não será divulgada. A desocupação mobilizará a Força Nacional de Segurança, a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal. O Exército poderá ser acionado para dar apoio logístico.
Além do aparato policial e militar, o trabalho requer o cruzamento de dados sobre as ocupações irregulares. Algumas informações, como o dado de desmatamento, têm como origem o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama); outras, como a situação fundiária, são fornecidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Segundo dados do Censo 2010, divulgados no início do mês, mais de 30 mil pessoas declaradas não índias habitam 505 terras indígenas que foram reconhecidas pelo governo até 31 de dezembro de 2010. A TI Marãiwatsédé foi homologada em 1998 por decreto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e está registrada na Secretaria do Patrimônio da União.
De acordo com a Funai, o plano apresentado à Justiça prevê todas as ações para a retirada pacífica dos ocupantes. “Esta tudo pronto para iniciar a retirada desses ocupantes em atendimento à decisão inicial”, disse à Agência Brasil, o diretor de Proteção Territorial da Funai, Aluízio Azanha.
Apesar de já dispor de alguns dados, a Funai ainda não tem informação fechada sobre o número de ocupantes irregulares, aguardando levantamento que está sendo feito pelo Incra. Segundo os advogados dos fazendeiros que tentaram ações para suspender a demarcação e a desocupação da TI, entre as 7 mil pessoas que moram na área estão 800 alunos do ensino fundamental. Alegam também que a TI demarcada não corresponde ao território original dos xavantes.
Em ação apresentada ao Tribunal Regional Federal (TRF), os advogados “desafiam” a Funai a explicar “qual o motivo lógico e plausível para que as antigas aldeias e antigos cemitérios xavantes não se encontrem dentro dos limites da área demarcada” e “qual o motivo do Rio Xavantinho, que tem este nome evidentemente por causa dos xavantes, não margear a área demarcada”.
Em resposta, o diretor de Proteção Territorial da Funai admite que “eventualmente, se deixou parcelas de áreas tradicionais, mas isso não atesta que a área [demarcada] não é de ocupação tradicional”. Ele lembra que “nenhuma demarcação de terra indígena, com raras exceções, corresponde à totalidade do território tradicional”; e pondera: “se partirmos dos pressupostos desses argumentos, deveremos demarcar o Brasil todo”.
Para o prefeito de São Félix do Araguaia, Filemon Gomes Limoeiro, o processo de desocupação poderá resultar em conflitos, como o ocorrido durante a retirada de produtores rurais da Reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, em 2009.
De acordo com imagens de satélite usado pelo Ibama (Sistema Prodes), o desmatamento da área aumentou na última década (após a homologação). Segundo Aluízio Azanha, as TI em litígio são “as mais vulneráveis” e “mais desmatadas”. Em compensação, as TI onde concluíram o processo de regularização fundiária são as mais protegidas do ponto de vista ambiental - “porque tem a posse dos indígenas”, ressaltou.
A recuperação ambiental será objetivo do plano de gestão dos territórios, que ainda não foi elaborado. A Funai espera a desocupação – que chama de desintrusão - para iniciar as discussões com os próprios xavantes. O plano também vai tratar da reocupação de aldeias, da vigilância do território e atividades econômicas na área, que já foi o maior latifúndio do Brasil, iniciado com a expulsão dos xavantes em 1966.
Ele ainda garante que os agricultores familiares que estejam na TI serão reassentados. “Isso é uma obrigação do Estado”. Com a mesma contundência, o diretor nega que os grandes fazendeiros terão direito à indenização. “Lucraram em cima da terra da União, nunca pagaram imposto territorial, nunca pediram licença ambiental, nunca pagaram multas de infração ambiental. Eles não têm título, lucram em cima de uma área da União e ainda querem ser indenizados?”.