Os integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista do Cachoeira aprovaram nesta quinta-feira a quebra dos sigilos fiscal e bancário da construtora Delta na região Centro-Oeste. O objetivo é verificar as movimentações feitas nas filiais da empreiteira comandadas pelo ex-diretor da empresa, Cláudio Abreu, que está preso.
O requerimento causou um debate acalorado na comissão. Parte dos parlamentares defendeu que a CPI não poderia concentrar os trabalhos apenas nos Estados de Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás, além do Distrito Federal, área de atuação de Abreu.
O relator da CPI, deputado Odair Cunha (PT-MG), justificou que não haveria indícios que justificassem a quebra do sigilo nacional da Delta. "Não há indícios para a quebra geral, ampla e irrestrita, inclusive do senhor Cavendish (Fernando Cavendish, dono da empresa). Há indícios suficientes que evidenciam que todas as filiais comandadas pelo senhor Cláudio Abreu tiveram o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) e o senhor Cachoeira como sócios ocultos", disse o relator.
O senador Pedro Taques (PDT-MT) contestou a decisão de Odair Cunha. Para ele, não é possível desmembrar a investigação sobre escritórios diferentes da mesma empresa. "O crime não respeita geografia, não ocorre só em uma região. Existem mais que indícios que estão nos documentos em nosso poder. Em uma das gravações, Cláudio Abreu fala em pegar um avião para buscar Pacheco. Quem é Pacheco? É o diretor-executivo da Delta nacional e ele fica em São Paulo. Não existe motivo para afastar o sigilo da Delta Centro-Oeste e não da Delta como um todo", afirmou o senador.
Após a votação, ficou definido que apenas o sigilo dos escritórios onde Cláudio Abreu atuou serão quebrados. O pedido para analisar os segredos fiscal e bancário da região Sudeste teve sua análise adiada.
Segundo as investigações, Cláudio Abreu era incumbido de tocar o braço da quadrilha de Cachoeira que se especializara em fazer contratos com governo. Abreu aparece em diálogos-chave do caso. Consta de uma conversa sua com Cachoeira a referência a um depósito de R$ 1 milhão para o senador Demóstenes Torres. Foi com base nesse grampo que a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu a quebra do sigilo bancário do senador.
É também Cláudio Abreu quem telefona a Cachoeira para dizer que iria "amarrar os bigodes" com os dois mais poderosos secretários do governador petista Agnelo Queiroz, Paulo Tadeu e Rafael Barbosa, em encontro em Brasília.
Cláudio Abreu está preso desde 25 de abril, em Brasília, suspeito de formação de quadrilha e corrupção. Ele foi detido durante a operação Saint-Michel, um desdobramento da operação Monte Carlo, da Polícia Federal, que resultou na prisão de Cachoeira, em fevereiro.
Carlinhos Cachoeira
Acusado de comandar a exploração do jogo ilegal em Goiás, Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, foi preso na Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, em 29 de fevereiro de 2012, oito anos após a divulgação de um vídeo em que Waldomiro Diniz, assessor do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, lhe pedia propina. O escândalo culminou na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bingos e na revelação do suposto esquema de pagamento de parlamentares que ficou conhecido como mensalão.
Escutas telefônicas realizadas durante a investigação da PF apontaram contatos entre Cachoeira e o senador democrata Demóstenes Torres (GO). Ele reagiu dizendo que a violação do seu sigilo telefônico não havia obedecido a critérios legais.
Nos dias seguintes, reportagens dos jornais Folha de S.Paulo e O Globo afirmaram, respectivamente, que o grupo de Cachoeira forneceu telefones antigrampos para políticos, entre eles Demóstenes, e que o senador pediu ao empresário que lhe emprestasse R$ 3 mil em despesas com táxi-aéreo. Na conversa, o democrata ainda vazou informações sobre reuniões reservadas que manteve com representantes dos três Poderes.
Pressionado, Demóstenes pediu afastamento da liderança do DEM no Senado em 27 de março. No dia seguinte, o Psol representou contra o parlamentar no Conselho de Ética e, um dia depois, em 29 de março, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski autorizou a quebra de seu sigilo bancário.
O presidente do DEM, senador José Agripino Maia (RN), anunciou em 2 de abril que o partido havia decidido abrir um processo que poderia resultar na expulsão de Demóstenes, que, no dia seguinte, pediu a desfiliação da legenda, encerrando a investigação interna. Mas as denúncias só aumentaram e começaram a atingir outros políticos, agentes públicos e empresas.
Após a publicação de suspeitas de que a construtora Delta, maior recebedora de recursos do governo federal nos últimos três anos, faça parte do esquema de Cachoeira, a empresa anunciou a demissão de um funcionário e uma auditoria. O vazamento das conversas apontam encontros de Cachoeira também com os governadores Agnelo Queiroz (PT), do Distrito Federal, e Marconi Perillo (PSDB), de Goiás. Em 19 de abril, o Congresso criou a CPI mista do Cachoeira.