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Monte Carlo: documentos mostram o envolvimento da Delta e de jornalistas

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Os documentos da Operação Monte Carlo, divulgados na íntegra na madrugada desta segunda-feira pelo Jornal do Brasil e pelo site Lei dos Homens, mostram a complexidade da quadrilha comandada pelo contraventor Carlinhos Cachoeira em Goiás e no Distrito Federal. De acordo com o relatório do Ministério Público Federal e da Polícia Federal, ele combinava o auxílio de ex-agentes de inteligência das polícias Civil e Federal com fontes dentro dos principais órgãos de segurança pública para garantir a manutenção do seu esquema. 

Basicamente, Cachoeira recebia 25% do faturamento de todos que exploravam caça-níqueis em troca da proteção fornecida pelos seus infiltrados. Quem se recusava a pagar a taxa era alvo de operações policiais e, consequentemente, perdia o ponto. Num dos trechos, o dono de um dos pontos de jogo ilegal retrata Cachoeira como um cobrador excessivo, estipulando determinado valor e mantendo-o independentemente do faturamento. 

Na folha de pagamento da quadrilha, figuram agentes das polícias Civil, Militar, Federal e Rodoviária e até funcionários do Judiciário que lhe repassavam informações a respeito de possíveis operações. Presos na Operação Monte Carlo, o corregedor-geral da Secretaria de Segurança Pública e Justiça de Goiás, Aredes Correia Pires, e o delegado da Polícia Federal Fernando Byron aparecem como duas das principais fontes da organização criminosa. 

Numa das conversas sobre a disputa de pontos de jogo ilegal em Goiânia, os envolvidos chegam a mencionar uma possível ajuda do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB) (veja documento abaixo) e de integrantes do GT3, grupo de elite da polícia de Goiás. 

Delta e a imprensa

A ligação com a construtora Delta, negada veementemente pela empresa, também fica clara nos documentos. Em várias ocasiões, Carlinhos Cachoeira pede dos seus infiltrados informações a respeito de possíveis ações contra a Delta. Numa das conversas, integrantes da quadrilha chegam a mencionar uma dívida de R$ 30 mil da construtora com eles. Diretor da construtora, Cláudio Abreu aparece em diversas conversas, em alguns momentos se gabando do seu status de sócio, segundo o Ministério Público. 

Há nove meses, o acidente com um helicóptero, em Trancoso, na Bahia, que matou sete pessoas, entre elas a namorada do filho do governador do Rio de Janeiro, acabou por trazer à tona as estreitas ligações de Sérgio Cabral com o empresário Fernando Cavendish, dono da construtora Delta, empreiteira responsável pela reforma do Maracanã (em associação com a Odebrecht e a Andrade Gutierrez).

Coincidentemente, a Delta é também a empreiteira que mais recebeu recursos do Programa da Aceleração do Crescimento (PAC). Segundo o portal Transparência, da Controladoria-Geral da União, do total de R$ 11,8 bilhões já gastos pelo governo federal este ano, a Delta Construções foi a que recebeu a maior fatia: R$ 254,6 milhões.

Antes do acidente, o governador almoçou com o empresário, a família dele e os convidados no Villa Vignoble Terravista Resort, em Trancoso. De lá, o grupo começou a ser levado de helicóptero para o Jacumã Ocean Resort, a 15 km. Como eram muitas pessoas, foi preciso fazer mais de uma viagem. O acidente aconteceu com o segundo grupo, quando chovia e havia forte neblina.

Depois do escândalo vir à tona, Cabral anunciou a criação de uma Comissão de Ética para avaliar a conduta da gestão pública do Estado. Essa comissão foi realmente criada, mas a nomeação de pessoas próximas do governador para integrar esse órgão, coloca em xeque a sua independência, segundo avaliou o deputado Paulo Ramos. "Como uma Comissão formada por integrantes do governo, que devem obediência ao governador, terá independência para investigar atos do próprio governador?", indagou o deputado, que vê na comissão "uma tentativa de enganar a população e gastar mais dinheiro público sem que haja nenhum retorno". 

A comissão de Ética da Alta Administração é presidida por Regis Fichtner, chefe da Casa Civil e tesoureiro da campanha de Sérgio Cabral em 2002. 

De acordo com a Polícia Federal, o contraventor tinha claros interesses na expansão das atividades da Delta em Goiás. A desconfiança é a de que funcionários da empresa estariam ajudando a quadrilha a "legalizar" parte do dinheiro obtido com jogos ilegais. 

A participação da imprensa no esquema de Carlinhos Cachoeira também aparece como um elemento fundamental, sobretudo através de matérias pagas pelo contraventor. Numa conversa, o jornalista Wagner Relâmpago, repórter da TV Brasília/Rede TV  promete criticar as autoridades que tentavam coibir os jogos clandestinos no entorno do Distrito Federal. Em troca de dinheiro, Relâmpago oferece até arrochar alguns dos entrevistados ao vivo. 

Outro jornalista citado diretamente nas gravações é o diretor da Veja, Policarpo Júnior. Em conversas entre membros da quadrilha, Cachoeira se coloca como principal fonte das matérias do jornalista, mas prega cautela com ele. No total, Policarpo e Cachoeira teriam trocado cerca de 200 ligações e o contraventor teria auxiliado a publicação numa série de matérias, sobretudo aquelas que apontavam como fonte arapongas da Abin. Policarpo também teria se encontrado com Cachoeira pessoalmente em 2011, sendo que o contraventor mandou um dos membros da quadrilha buscá-lo no aeroporto.