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Invasões focam agronegócio de Daniel Dantas; fazendeiros se armam

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Vasconcelo Quadros , Jornal do Brasil

BRASÍLIA - Novo foco de conflitos, as regiões do Sul e Sudeste do Pará se transformaram em palco de uma queda de braço que pode mudar a fisionomia da luta pela terra no Brasil. O pivô, mais uma vez, é o polêmico banqueiro Daniel Dantas e a agressiva guinada do Grupo Opportunity para o agronegócio. Ao mesmo tempo em que revolucionou as atividades rurais na região, comprando mais de 50 fazendas literalmente de porteiras fechadas, o banqueiro da Operação Satiagraha acabou se transformando em alvo preferencial das invasões dirigidas por movimentos sociais encabeçados pelo MST.

Somos apenas vítimas nessa história de depredações, roubo e cárcere privado reage Rodrigo Otávio de Paula, diretor operacional da Agro Santa Bárbara, braço rural do Opportunity.

Nos últimos três anos, o grupo comprou cerca de 600 mil hectares de terra, cria atualmente mais de 500 mil cabeças de gado, mas abriga o maior número de invasores concentrados em um único empreendimento rural: são nove fazendas invadidas, com cerca de 50 mil hectares sob o controle de 4.655 famílias de sem-terra, segundo balanço da Comissão Pastoral da Terra (CPT), entidade ligada à igreja católica que apoia os sem-terra.

O cerco do MST aos novos negócios de Daniel Dantas não para por aí. Um grupo de 300 famílias está concentrado há meses em barracos de lona preta de plástico nos limites da Fazenda Cedro, a 50 quilômetros de Marabá _ vitrine do grupo, pela concentração de touros de raça para reprodução aguardando a ordem para entrar. O MST e a CPT acusam o grupo de se aproveitar da confusão fundiária na região para comprar terras públicas griladas e, assim, implantar seu projeto agropecuário.

Por pressão das entidades, o Ibama vistoriou as áreas e constatou falta de autorização ambiental e destruição da cobertura vegetal nas fazendas Espírito Santo e Maria Bonita, em Xinguara. Aplicou uma multa de R$ 88 milhões e mandou que parte das atividades agropecuárias fosse suspensa, decisões que estão sendo discutidas na justiça. Pode não dar em nada, mas virou mais um ingrediente no clima de tensão. O Sul e Sudeste do Pará representam atualmente o maior pólo da migração rural, especialmente de nordestinos atraídos pela mineração ou por grandes projetos oficiais de usinas e hidrovias. Eles se deslocam em busca de emprego.

A região concentra hoje cera 30 mil migrantes. Quem não consegue emprego acaba engrossando as ocupações de terra. Há uma explosão social na região e, de outro lado, um forte aumento de concentração de terras, com as fazendas contratando seguranças para evitar as ocupações de terra diz o representante da CPT em Marabá, José Batista Afonso.

Segundo ele, a intensa atividade do Grupo Opportunity e o reforço da segurança ressuscitaram a ala radical da velha União Democrática Ruralista (UDR) e restabeleceu o caldo gerador de conflitos.

É um caldeirão que pode explodir a qualquer hora afirma Afonso.

A região concentra também o maior número de movimentos sociais que lutam pela terra. Há sigla para todos os gostos: Fetraf (Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar), LCP (Liga dos Camponeses Pobres), MAB (Movimento dos Atingidos pelas Barragens), MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores) e, entre outros, o organizadíssimo e radical MST, cujos dirigentes regionais foram presos na semana passada acusados pela destruição de várias casas da sede da Fazenda Maria Bonita, de Dantas e seus sócios da Agro Santa Bárbara.

Levantamento da CPT mostra que os conflitos na região recrudesceram nos últimos três anos estimulados pelas atividades do empreendimento de Dantas. Foram 66 invasões envolvendo 10.599 famílias 17 assassinatos de trabalhadores rurais, 23 tentativas de homicídio, 101 ameaças, 128 presos e 3.140 famílias ameaçadas de despejo por ordem judicial. Os produtores rurais reclamam que são mais mil fazendas invadidas em todo o Estado e 111 liminares de reintegração de posse não atendidos pela governadora Ana Júlia Carepa. Há um risco concreto de violência afirma o presidente da Federação da Agricultura do Pará, Carlos Xavier. Ele diz que o MST aposta na violência, acusa os governos federal e estadual de leniência com o crime e admite que, para se proteger, os fazendeiros estão reforçando os esquemas de segurança.

O sistema financeiro, a indústria e o comércio não se protegem? Nós também temos o direito de contratar seguranças para proteger o patrimônio diz Xavier. Ele argumenta que a violência e a destruição das sedes de propriedades empregadas pelos movimentos sociais, sobretudo o MST, é uma tática para inviabilizar os grandes empreendimentos do agronegócio.

Há indícios de que recebem apoio de guerrilhas do exterior, especialmente das Farcs afirma Xavier.

Em jogo, os índices de produtividade rural

Os imprevisíveis conflitos agrários travados entre grandes proprietários e sem-terra no Pará recolocaram no tabuleiro político não apenas a ousadia do banqueiro Daniel Dantas e seu novo foco de investimentos. Alí joga-se também com o destino do projeto de revisão dos índices de produtividade em propriedades rurais, o destino da CPMI do MST emplacada pela presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), senador Kátia Abreu (DEM-TO) e o constrangimento político que poderá representar uma eventual decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pela intervenção federal no Pará, forçando o Estado a cumprir as ordens judiciais de reintegração de possa em mais de 100 propriedades invadidas.

Nós queremos parceiros para garantir a segurança na região afirma o presidente da Federação da Agricultura do Pará, Carlos Xavier.

Os ruralistas estão satisfeito com a decisão do Tribunal de Justiça do Pará, que na quarta-feira aprovou o a intervenção, respondendo consulta do presidente do SFT, Gilmar Mendes. Caso o Supremo confirme, a execução da sentença caberia ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele teria de mandar redigir um decreto deslocando a Polícia Federal e a Força Nacional de Segurança para cumprir ordens judicias que, segundo os ruralistas, a governadora Ana Júlia Carepa se recusa a executar. Seria um vexame político para o PT.

É uma tentativa de golpe contra o governo do Estado , reagiu o PT paranese numa nota oficial em que reafirma a solidariedade ao MST e demais movimentos sociais no enfrentamento contra os grandes proprietários de terra. O pedido de intervenção foi formalizado no início de outubro por Kátia Abreu e a decisão sobre a polêmica dependerá, em boa parte, do ministro Gilmar Mendes. A concordância do Planalto implicaria na desocupação das fazendas, entre as quais estão 9 de Daniel Dantas.