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Resgate do Air France não é missão impossível

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Marcelo Ambrósio, Jornal do Brasil

RIO DE JANEIRO - A possibilidade de os destroços do A330 da Air France estarem em uma região do Atlântico com 5 mil metros de profundidade é um pesadelo para as equipes internacionais de resgate. O fundo nas redondezas dos rochedos de São Pedro e São Paulo é uma sucessão de escarpas submersas, capazes de ocultar fragmentos e de atrapalhar a busca. As caixas-pretas, há quem reconheça, podem jamais ser recuperadas. Mas há pelo menos um caso na história no qual as piores condições não foram entrave: trata-se da expedição que achou o Boeing 747 da Air India que caiu em 1987, 250 km a sudeste das Ilhas Maurício, depois de um incêndio no porão de carga. O jato ia de Taipé para Joannesburgo,

O Helderberg era o nome do 747-244B Combi chocou-se com a água 20 minutos depois de o fogo ter sido notado, matando todos os 159 a bordo. Só seis semanas depois de uma busca em uma área de 120 milhas quadradas os destroços foram localizados porque a tripulação, envolta em fumaça, dera a última posição errada. A verdadeira só foi obtida quando se recuperou uma bolsa com três relógios de pulso, um quebrado, um funcionando com hora de Hong Kong e o terceiro parado no que seria o momento do impacto. Assim que o cálculo deteminou a área de busca, foram dois dias apenas para encontrar.

A profundidade, 4,4 km, era superior à do Titanic (3,8 km), então a única expedição do gênero bem sucedida. Justamente pelas enormes dificuldades de logística e organização, apenas um ano depois a CVR - Cockpit Voice Recorder, que registra as conversas na cabine foi recuperada. Mas foi. A FDR Flight Data Recorder, que registra os dados de voo ainda está no mar.

Dificuldade

Localizados por sonares, os campos de destroços estavam separados em áreas a 2,5 km de distância. O jato se partira em três antes de bater na água não pelo fogo, que lambeu o porão, mas pela detonação de um extintor deixado por um tripulante que desceu para tentar apagá-lo. Porém, a profundidade continuava sendo um impedimento para se detectar sinais. O recurso foi usar um Side Scan sonar, equipamento de varre o fundo, rebocado de um navio; neste caso, só o cabo tinha 9 quilômetros e a aplicação tornou-se complexa demais. O sinal não foi marcado. O governo francês pretende adotar a mesma estratégia, mas os equipamentos atuais são mais sensíveis.

A dificuldade da época deverá se repetir agora. Tanto quanto a solução: O ROV, submersível que localizou o Titanic e o cruzador alemão Bismarck, foi acionado, mas tinha de se deslocar por uma área muito grande, já que os restos do jato demoraram 80 minutos para tocar o fundo. Os técnicos então aplicaram modelos matemáticos de dispersão a técnica chama-se back drift ao mapa de escombros e supostos contatos de radar no fundo oceânico. Usando a posição de destroços encontrados 12 horas depois do acidente, e outros recuperados 16 horas depois, encontrou-se dentro das três linhas de escombros os pontos possíveis nos quais o equipamento crucial para as investigações estaria.

Refinando o método, o grupo aplicou métodos estatísticos para desprezar alvos fora da média. Assim, conseguiram notar que em uma determinada direção, o campo de destroços apresentava materiais cada vez mais pesados. O ponto principal, onde o sinal da CVR foi achado, estava no terceiro e último setor.

Tomando-se por base o fato de que no caso do Airbus já há indícios confirmados como a mancha de jet fuel, querosene de aviação, e a poltrona, a força-tarefa internacional deslocada para a região tem quantidade igual ou maior de tecnologia à sua disposição que a usada no acidente do 747. Até um submarino nuclear, capacitado para grandes profundidades, foi enviado pela França à região. Como o Underwater Locator Transmissor (ULT) pode enviar sinais sonoros por 30 dias, a presença desse equipamento ajudaria a refinar a área de patrulhamento.

O resgate propriamente dito da CVR assemelhou-se muito à operação desenvolvida pelo pesquisador americano Robert Ballard. Submersíveis de controle remoto foram usados para fotografar o setor determinado. As imagens eram recolhidas e analisadas por um grupo de 3 a 9 pessoas selecionadas pelo líder da expedição, Johan Strumpfer. A partir desse comitê, partia-se para a escolha de pontos específicos nos quais as fotografias eram evidências mais fortes ou da presença da caixa-preta, ou de peças que costumam ficar nas proximidades do compartimento de cauda onde são instaladas. Demorou, levou tempo, custou caro, mas o mistério foi resolvido.