Yacy Nunes, Jornal do Brasil
RIO - Rio de Janeiro, 31 de março de 1964. Avenida Ataulfo de Paiva, Leblon. O advogado Ronaldo Pacheco tinha 11 anos. Morava entre as ruas Carlos Gois e Cupertino Durão. Ouvia na vitrola de seu quarto discos dos Beatles, Rolling Stones e The Monkeys. Soube do golpe militar pela televisão. Tinha acabado de voltar da aula de piano. Nesse ano chegou a participar de um concerto musical com seus colegas de sala, na Associação Brasileira de Imprensa.
Presidente da Associação das Empresas do Mercado Financeiro (ABIMEC), em 1989 e 1990, Robson Pacheco tinha 18 anos em 1971, quando seu irmão mais novo, Ronaldo, de 16, foi preso no dia 20 de janeiro por agentes do Doi-Codi que cercaram a casa de Rubens Paiva, na rua Almirante Pereira Guimarães com a Avenida Delfim Moreira. Desde o golpe miltar, toda a família achava que nada de ruim iria acontecer por causa da carteira que a mãe, Gilza, filha de um almirante, herdou da da Marinha Brasileira. O documento deu a ele e aos irmãos a ilusão de que nada de ruim lhes aconteceria enquanto os fardados estivessem no poder.
Ronaldo Pacheco era um dos melhores amigos de Eliana, filha de Rubens Paiva, que ainda adolescente frequentou a praia, em frente à Avenida Afrânio de Melo Franco, entre 1967 e 1971. Foi pego de surpresa pelos gorilas , já que apareceu ali naquele feriado para buscar a amiga para uma festa.
- Meu irmão era muito alegre, mas desde que foi preso ficou triste Não contou para a família, só ficamos sabendo anos depois. Meus pais tinham ido viajar. Estávamos sozinhos em casa. Dormíamos em camas separadas, mas muito perto um do outro. Foi a primeira vez que ele desapareceu e ficou fora de casa. Naquele tempo todo mundo avisava, quando ia passar a noite em algum outro lugar, achei que era alguma namorada. Ele ficou traumatizado, pois foi interrogado durante dois dias. Levou tapas na cara, nos rins, nas costas, na nuca.
Ao contrário do irmão mais velho, Robson, que elogia Lula e acha que existem bons políticos no Brasil, o advogado Ronaldo Pacheco diz não acreditar na democracia brasileira. Indenizado com R$ 11 mil pelo Ministério da Justiça, em 2008, ele ganha pouco com os serviços que presta em sua profissão e refugia-se do passado e das crises atuais com os amigos, a família e a religião. É católico. Foi budista e espírita (Robson também, mas hoje é protestante) e se não fossem os ensinamentos espirituais, acredita que não teria sobrevivido.
- Quando eles me prenderam, na casa do deputado, quiseram que eu acreditasse que o pai da Eliana era um terrorista e não era verdade. Não levei nem mesmo a carteira de estudante. Naquela época andávamos sem documentos pelo Leblon. Eles me sequestraram, praticamente. A casa onde sofri o interrogatório era na Gávea Pequena. Achei a indenização absurda, mas recebi assim mesmo. Tenho absoluta certeza de que as gerações futuras não passarão por esse tipo de problema no Brasil. Mas, terão que escolher melhor seus governantes. Acredito nas instituições, mas não tenho confiança nos políticos e nos homens que ocupam cargos importantes no Executivo, Judiciário, universidades e empresas em geral. Eles são muito egocêntricos. Almejam o poder somente para obter vantagens pessoais.