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Batalha à vista pela CPMF

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Marcos Seabra, Agência JB

SÃO PAULO - Lei-Jogo duro da bancada governista pode elevar o custo, para o governo, da prorrogação do imposto

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva não avaliou corretamente o grau de lealdade dos parlamentares de partidos aliados no Congresso ao encaminhar o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) para a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e da ferramenta que possibilita a desvinculação de recursos da União, a DRU.

Desde a criação da contribuição, que na verdade começou como um imposto, o Provisório Sobre Movimentação Financeira (IPMF), o Planalto nunca teve dificuldades para conseguir as modificações que propôs. Mas as condições políticas não são as mesmas. A decisão sobre o assunto promete ser uma pequena batalha para o governo a partir de amanhã, quando o assunto será discutido na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

Só este mês, o governo liberou R$ 67 milhões em emendas individuais, mais do que nos sete meses anteriores, para aprovar a continuidade da CPMF. O custo da prorrogação do tributo, no entanto, pode sair mais caro para o Palácio do Planalto. O apetite dos aliados aumentou depois que viram a estratégia do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) lograr êxito. Durante três meses, o relator da PEC na CCJ cozinhou seu parecer sobre o tema. O relatório só saiu do forno a partir da nomeação do ex-prefeito do Rio Luiz Paulo Conde à presidência de Furnas, estatal ligada ao Grupo Eletrobrás.

Os integrantes do Palácio do Planalto acreditaram demais no histórico altamente favorável dos governos no Congresso quando o assunto é prorrogação da contribuição avaliou o analista político da Tendências Consultoria, Rogério Schmitt. Mas o tiro pode sair pela culatra.

O próprio Eduardo Cunha admite que o governo deveria ter manobrado melhor o destino do projeto, principalmente na Comissão. E direcionado suas ações para que a relatoria do tema caísse nas mãos de um deputado mais afinado com suas aspirações . Agora, a CPMF virou moeda de troca para os deputados da bancada governista que têm pendências com o governo.

Para o analista da Tendências, até por ser um assunto explosivo e passível de discussões, o Planalto deveria ter jogado toda a sua influência na tramitação do projeto. Schmitt lembra que dentre as matérias importantes para o governo que estão no Congresso, apenas os casos da CPMF e da DRU obrigam a uma mudança constitucional e exigem quorum diferenciado de votação. Além disso, os recursos da CPMF aproximadamente R$ 37 bilhões este ano e outros R$ 39 bilhões para o próximo ano são considerados pilares básicos para tornar realidade parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

A CPMF ajuda a viabilizar os programas do PAC, que são de interesse dos Estados e municípios argumentou o deputado Ricardo Berzoini, presidente nacional do PT, na sexta-feira, ao sair de uma reunião com o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

A situação ficou tão complicada para o Planalto que Mantega chegou a acenar com uma antiga reivindicação da oposição para conseguir a prorrogação da CPMF.

Podemos até pensar na desoneração da folha de pagamento, mas não podemos abrir mão dos recursos acenou o ministro.

Por enquanto, uma coisa é certa: o governo não conseguirá aprovar a prorrogação até setembro, como pretendia inicialmente. A aprovação após esse prazo pode suscitar uma disputa judicial a respeito da regra da anterioridade, com a obrigação de a PEC ser aprovada 90 dias antes de a cobrança da CPMF vencer, em dezembro. Mas a também analista da Tendências, Carolina Guerra e Souza, esclarece no boletim Carta Política que a recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) sugere que a noventena só se aplicaria à criação de novos impostos ou ao reajuste de alíquotas dos tributos já existentes, o que não é o caso desta PEC.

O líder da bancada do DEM na Casa, Onyx Lorenzoni (RS), prometeu apelar ao STF, caso a prorrogação da CPMF seja aprovada.

Vamos utilizar todas as armas para tentar barrar a aprovação prometeu Lorenzoni. Se não conseguirmos, o jeito é apelar ao Supremo.

Imposto sobre movimentação financeira foi criado durante governo Itamar Franco

brasília.O primeiro ocupante da cadeira principal do Palácio do Planalto a descobrir um bom filão de recursos na taxação de movimentações financeiras foi Itamar Franco. O herdeiro de Fernando Collor de Mello elaborou a proposta de Emenda Constitucional 3, prontamente aprovada no Congresso. A emenda instituiu o imposto sobre movimentação financeira ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira, cuja alíquota máxima deveria ser de 0,25%.

Assim, em julho de 1993, entrou em vigor a lei complementar nº 77, que criava o Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF) lembrou a analista da Tendências Consultoria, Carolina Guerra e Souza, no boletim Carta Política.

O tributo só começou a ser cobrado em agosto, sem ser submetido ao princípio da anterioridade que estipula que o imposto só poderia começar a ser exigido dos contribuintes no ano seguinte, em 1994. O imposto foi cobrado por menos de um mês. Em setembro de 1993, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a arrecadação, por entender que o tributo só poderia ser cobrado no ano seguinte.

A CPMF só surgiu com Fernando Henrique Cardoso, em 1996, por outra emenda constitucional (número 12), aprovada com facilidade no Congresso.

Pela proposta aprovada, o governo foi autorizado a instituir a CPMF pelo prazo de dois anos salientou Carolina Guerra e Souza, no boletim.

A alíquota não poderia ser superior a 0,25% prevista na IPMF de Itamar e financiaria exclusivamente as ações e serviços de saúde. Como previsto, depois de cumprir a noventena, a CPMF começou a ser cobrada e perdurou até janeiro de 1999. No mesmo mês, o governo de FH, prevendo substituir a arrecadação da CPMF, aprovou a cobrança de IOF sobre aplicações financeiras em fundos de investimentos com a alíquota de 0,38%, a mesma aplicada também sobre operações de crédito.

O passo seguinte da história da CPMF foi a aprovação da emenda constitucional 21 que autorizou a cobrança por mais 36 meses, ampliando a alíquota para 0,38% lembrou a analista da Tendências.

Mais tarde, a quatro meses da eleição que conduziu Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República, o governo do tucano FH aprovou mais uma modificação na legislação. A tempo de evitar interrupções na arrecadação, em junho de 2002, o governo conseguiu aprovar no Congresso uma outra emenda constitucional (número 37) prorrogando a cobrança até dezembro de 2004.

Mas pela emenda, a alíquota por dois anos 2002 e 2003 seria de 0,38%, caindo para 0,08% em 2004 acrescentou Carolina Guerra na Carta Política da Tendências.

Já no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, a legislação foi novamente alterada. Além de prorrogar por mais quatro anos a incidência da contribuição e das respectivas leis de regulamentação, uma nova emenda manteve a alíquota de 0,38% para o período de janeiro de 2004 até dezembro de 2007.

Mesmo que o Planalto não consiga aprovar a prorrogação da CPMF a tempo, o governo poderia se beneficiar, nos primeiros meses de 2008, da arrecadação tributária recorde nos últimos meses.

Só neste primeiro semestre foram R$ 282,4 bilhões, dos quais pouco mais de 6% é da CPMF finalizou a analista da Tendências. (M.S)

Dinheiro financiou festas

São Paulo foi o Estado que mais recebeu recursos arrecadados com o tributo

Segundo reportagem publicada ontem pelo JB, o Estado de São Paulo aparece como destino do maior montante de recursos da CPMF encaminhado pela União sob forma de contribuição para custeio de despesas com a saúde pública. Cerca de R$ 891 milhões foram enviados, neste ano, ao governo estadual. Outros R$ 846 milhões seguiram para as prefeituras paulistas, até o fim de julho. Ainda assim o Estado, maior gerador de arrecadação da CPMF, recebe apenas R$ 1 de cada R$ 5 que paga, segundo dados da Associação Contas Abertas.

Por volta de 45% desse montante serviu para pagar serviços terceirizados de saúde a instituições particulares e filantrópicas credenciadas junto ao Sistema Único de Saúde (SUS). No Estado do Rio de Janeiro, esse percentual cai para 41,5%, de um volume de recursos da ordem de R$ 2,3 bilhões, segundo informações do Datasus banco de dados do Sistema Único de Saúde. Desse montante, R$ 656,5 milhões foram repassados pela União ao governo estadual e prefeituras cariocas na rubrica de contribuições, dentro do bolo da CPMF.

Entram nessa conta desde as despesas com terceirização de serviços de saúde até gastos com compra de material de cozinha ou cama e mesa. Neste ano, por exemplo, os gastos com passagens representaram despesas de R$ 302,4 mil, até julho. Diárias em hotéis custaram outros R$ 173 mil, segundo dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do governo federal (Siafi), que mostra algumas curiosidades entre as despesas custeadas pela CPMF na área da saúde. Cerca de R$ 5,3 mil foram gastos sob a rubrica de festas e homenagens. Outros R$ 2.828 serviram para a compra de sementes e mudas de plantas.