Agência Brasil
BRASÍLIA - Para dar conta de produzir em escala suficiente para competir com as emissoras privadas e não depender exclusivamente do governo, a televisão pública precisa encontrar fontes de recursos complementares ao orçamento da União e dos governos estaduais e municipais. Até agora, esse foi o único consenso entre os participantes do grupo de trabalho que discute o marco regulatório da rede de TV pública em estudo pelo governo federal.
As discussões sobre as verbas para a TV pública oficialmente estavam marcadas apenas para esta quinta-feira, quando serão divulgadas as conclusões do grupo que estudou as alternativas de financiamento para as emissoras públicas. Os debates sobre o assunto, no entanto, começaram a esquentar na última quarta-feira.
Diversas sugestões de financiamentos foram apresentadas pelo grupo de trabalho que debateu o marco regulatório da TV pública. A proposta que mais repercutiu foi feita pelo presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia, Informação e Comunicação da Câmara dos Deputados, Julio Semeghini (PSDB-SP). Ele sugeriu que parte das receitas obtidas pelo Ministério das Comunicações com as outorgas de freqüências para as rádios e emissoras privadas sejam revertidas para a televisão pública.
Essa é uma forma de redistribuir os recursos dos canais privados para a televisão pública , explicou o deputado. Ele ressaltou ainda que a medida não traria prejuízos para as emissoras comerciais nem para a população.
A idéia enfrentou a resistência do Ministério das Comunicações. Para Marcelo Bechara, consultor jurídico do ministério, esse tipo de financiamento é desnecessário para custear a televisão pública. Existem outras iniciativas que podem complementar as fontes de recursos para as emissoras públicas , avaliou o consultor, que não revelou quanto o ministério arrecada com essas receitas.
Bechara sugeriu outras fontes de recursos. Ele citou o Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel) e a concessão de incentivos fiscais para doações à rede pública de televisão, como ocorre com a Lei Rouanet, que permite às empresas deduzir do Imposto de Renda os recursos empregados para o patrocínio de eventos culturais.
Administrado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o Fistel é formado por recursos pagos pelas empresas de telefonia e de radiodifusão e são destinados a custear a fiscalização do espectro pela agência, que monitora, por exemplo, interferências provocadas por emissoras não-autorizadas a operar. Como as emissoras comerciais já contribuem com esse fundo, essa seria uma maneira mais racional de aproveitar esses recursos , afirma.
A Anatel administra ainda dois fundos: o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), destinado a investimentos em telefonia e inclusão digital, e o Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funtel), usado para pesquisas científicas e tecnológicas em comunicações e chegou a financiar o desenvolvimento do sistema brasileiro de televisão digital.
Bechara ressalta que o uso de recursos desses dois fundos para financiar a TV pública configuraria mudança de destinação, que precisaria da aprovação do Congresso. Em relação ao Fust e ao Funtel, a gente não pode simplesmente remanejar os recursos para a TV pública , afirmou o consultor do Ministério das Comunicações. Isso exigiria uma mudança na lei.
A proposta de utilizar os fundos para financiar a TV pública, no entanto, não foi bem recebida pelo presidente do Conselho Consultivo da Anatel, Luiz Fernando Linhares. Acho uma temeridade o uso de verbas de qualquer fundo porque a definição de como os recursos vão ser aplicados sempre caberá a uma pessoa ou instituição, o que pode dar margem a arbitrariedades , justificou.
Na opinião de Linhares, as fontes complementares de recursos para a televisão pública deveriam vir de apoios culturais, em que a marca de investidores privados aparecem no início ou no final dos programas, sem interferência no conteúdo. Ele, porém, acredita que a maior parte do dinheiro para a televisão pública deve vir do próprio orçamento do governo.
A Secom [Secretaria de Comunicação da Presidência da República] vai gastar R$ 1 bilhão neste ano com a publicidade oficial , estima Linhares. Basta aplicar esse mesmo montante na televisão pública que ela terá condições de se desenvolver plenamente.