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Missão no Haiti precisa vencer fama do "cemitério de projetos"

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Agência Brasil

BRASÍLIA - A Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (Minustah) tem a sua frente o desafio de desenvolver projetos sustentáveis para o país caribenho, na avaliação do cientista político Ricardo Seitenfus.

- O que ocorre, muitas vezes, é que projetos maravilhosos são apresentados e não têm auto-sustentabilidade - diz ele. Por isso é que alguns especialistas chamam o Haiti de cemitério de projetos.

Seitenfus, doutor em Relações Internacionais, é autor do livro Haiti - A Soberania dos Ditadores e já atuou no país como consultor do governo brasileiro e das Nações Unidas. Ele fez as avaliações em entrevista à Rádio Nacional. Para o especialista, a estabilização do Haiti na verdade envolve um desafio de longo prazo, de pelo menos 15 a 20 anos ,necessários para tirar o país da miséria.

O cientista político lembra que, ainda hoje, cerca de 80% dos haitianos estão desempregados, e o país sofre com problemas como o êxodo rural e a ausência de capacidade do Estado para assumir funções básicas, como a Justiça.

Para que se tenha uma idéia, 85% dos presos no Haiti estão em detenção provisória, portanto não há processos de julgamento ou de absolvição, diz ele. Não é impossível reverter esse caos, afirma Seitenfus. Ele lembra que, séculos atrás, o país era a mais rica colônia francesa, grande produtora de cana-de-açúcar e café - '70% da produção vinda das colônias para a França, vinha do Haiti', diz ele.

Além disso, poucos anos depois dos Estados Unidos, o Haiti foi o segundo país das Américas a se tornar independente - e, o que se tratou de um caso único, a partir de uma rebelião de negros escravos.

O problema é que se passaram décadas sem que o país registrasse investimentos em infra-estrutura. Ele exemplifica: - Para se fazer uma viagem de 150 quilômetros, se levam sete, oito horas, para que se tenha uma idéia do estado das estradas. Essa é uma questão que envolve toda a cooperação internacional, e há projetos, e há possibilidades - completa.

Devido à instabilidade política dos últimos anos, lembra Seitenfus, até mesmo as vocações econômicas do país caribenho, outrora a Pérola das Antilhas, estão abandonadas. O Haiti tem uma capacidade nas planícies agrícolas que não está sendo utilizada. Que foi abandonada nessas últimas décadas, diz ele. É necessário retomar esse desenvolvimento agrícola, (...) com a pequena propriedade rural, com a economia familiar.

Outra possibilidade que não vem sendo aproveitada, segundo o especialista, é a instalação de empresas exportadoras interessadas em montar produtos no Haiti, utilizando a abundância de mão-de-obra barata e com baixa qualificação. Essa alternativa é objeto de críticas por parte dos movimentos sociais, mas o governo haitiano vem considerando sua viabilidade, como forma emergencial de resolver os problemas econômicos do país.

Nesse processo de recuperação econômica, o Brasil tem muito a colaborar, a partir dos projetos de cooperação, na avaliação de Seitenfus. Ele cita um caso: O Haiti não tem nenhum tipo de recuperação de lixo, não tem nenhum tipo de cooperativa. Não tem sequer recolhimento de lixo. Essa é uma experiência interessante que o Brasil pode aportar ao Haiti, porque isso dá mão-de-obra, isso dá renda, mobiliza uma parte da população que não é qualificada.

Seitenfus faz, também, uma advertência quanto à cooperação internacional. Tem que ser focado, tem que ser levado com muito cuidado.

- Porque, se nós atropelarmos eles com apresentação ou imposição de modelos, é evidente que o Haiti não aceitará e nós voltaremos à estaca zero - diz, em referência específica à colaboração na remodelação do Judiciário do país.

A Minustah conta com cerca de 7 mil militares, sendo 1,2 mil brasileiros, além de 2 mil policiais e centenas de funcionários civis. As forças, coordenadas pelas Nações Unidas, estão no Haiti desde 2004. O mandato da missão expira esta semana, e o Conselho de Segurança da ONU deverá votar a proposta de nova extensão da permanência das tropas nos próximos dias.