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STF, PGR e TSE se manifestam contra ações de juízes e fiscais eleitorais em universidades

José Peres -
Estudantes protestam em frente ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio contra ações de fiscais eleitorais em universidades: alunos foram recebidos pelo presidente do tribunal
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Os protestos em relação à fiscalização dos tribunais regionais eleitorais em universidades em todo o país tiveram uma estrondosa repercussão e levaram a procuradora-geral da República e procuradora-geral eleitoral, Raquel Dodge, a encaminhar ao STF uma liminar contrária às ações da Justiça Eleitoral, para, nas palavras dela, “restabelecer a liberdade de expressão, de reunião e de cátedra” nas instituições de ensino. Antes da decisão da procuradora-geral, os gritos dos estudantes pelo Brasil já haviam ecoado no Supremo Tribunal Federal (STF) e em outras instituições. O presidente do Tribunal, Dias Toffoli, ao comentar os excessos, asseverou que sempre defendeu “autonomia e livre pensar”. No Rio de Janeiro, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), o desembargador Carlos Eduardo da Fonseca Passos, recebeu uma comissão de alunos e a Ordem dos Advogados do Brasil do Rio (OAB-Rio), após uma grande manifestação ser organizada em frente à sede do próprio TRE, da qual partiu, em alto e bom som, o brado: “A verdade é dura o TRE apoia a ditadura”.

A revolta veio de casos concretos. No Rio, o mais emblemático desta semana foi a retirada da faixa em que se lia “Direito UFF Antifascista”, na cidade de Niterói. Nela, como se lê, não havia qualquer menção a nome de candidatos, mas ela foi retirada por fiscais do TRE, acompanhados por policiais militares, que cumpriam a decisão de uma juíza do tribunal. Episódios como esses se multiplicaram Brasil afora. Ao ordenar a apreensão de materiais antifascistas, os juízes eleitorais provocaram intensa reação de alunos em todo o país.

Na mesma toada de Raquel Dodge, a presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Rosa Weber, afirmou que a Justiça eleitoral investigará os juízes eleitorais que avalizaram operações de policiais e fiscais eleitorais em universidades públicas. “O TSE está adotando todas as providências cabíveis, por meio da Corregedoria-Geral da Justiça Eleitoral, para esclarecer as circunstâncias e coibir eventuais excessos no exercício de poder de polícia eleitoral no âmbito das universidades de diversos estados da Federação”, disse a ministra.

Sem afiançar que as ações foram orquestradas, o conselheiro da OAB do Rio Carlos Henrique de Carvalho disse ter estranhado tantas ações da Justiça eleitoral em nível nacional. “Por enquanto, nós vamos demonstrar estranheza em relação a isso”, disse o conselheiro, ao sair da reunião com os estudantes com o presidente do TRE do Rio. O TRE fluminense, por sua vez, enviou nota à imprensa, na qual declara que “manifestações políticas e ideológicas, em especial aquelas realizadas por estudantes em instituições de ensino, são inerentes ao processo democrático e à liberdade”. A nota, contudo, afirma que as ações foram desdobramentos de decisões judiciais, “a partir de denúncias oriundas de eleitores e da Procuradoria Regional Eleitoral”.

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Estudantes protestam em frente ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio contra ações de fiscais eleitorais em universidades: alunos foram recebidos pelo presidente do tribunal (Foto: José Peres)

Ministro do STF, Marco Aurélio Mello disse que toda interferência em universidades “é, de início, incabível”. Também ministro da Suprema Corte, Gilmar Mendes se manifestou, fazendo um alerta: “É preciso lidar com cautela para que não caiamos em nenhum exagero ou exorbitância”. Vice-presidente do TSE e ministro do STF, Luís Roberto Barroso, sem se pronunciar sobre os casos concretos, condicionou a entrada da polícia em uma universidade: “Só deve entrar em uma universidade se for para estudar”.

Em nota, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal foi direto ao ponto: “Conceber que o repúdio ao fascismo possa representar o apoio a uma determinada candidatura seria admitir que a Constituição brasileira endossaria tal forma de regime, o que é inaceitável”. E deu exemplos: “A interpretação de dizeres ‘Direito UFF Antifascista’, ‘Marielle Franco presente’, ‘Ditadura nunca mais’, bem como outras iniciativas de debates acadêmicos ou manifestações públicas a partir do espaço de ensino, como sendo uma forma de propaganda eleitoral transborda os limites da razoabilidade e compromete o arcabouço constitucional da liberdade de manifestação e de cátedra, bem como de expressão do pensamento e intelectual”.

A Defensoria Pública da União, o Ministério Público Federal e a OAB nacional também se manifestaram contrários às ações dos TREs. Na reunião com o presidente do TRE do Rio, estiveram presentes seis estudantes e o diretor da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Ricardo Lodi. O protesto em frente ao TRE continuou, enquanto o encontro acontecia. O clima ali estava influenciado não só pelo que ocorreu no Rio. Dezessete universidades em todo o país foram alvo de fiscalização eleitoral.

Felipe César Santiago, membro da Federação Nacional de Estudantes de Direito, esteve na reunião com o presidente do TRE. Ele relatou que, na Universidade Católica de Petrópolis (UCP), fiscais do TRE escoltados por policiais militares interromperam uma reunião, anteontem à noite, com cerca de cem alunos, na qual o tema era a UCP contra o fascismo. “Não havia propaganda eleitoral. Eles disseram que, se a reunião não terminasse, todos nós seríamos presos”, disse Felipe César. Professor de Direito Eleitoral da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ), Luiz Paulo Viveiros de Castro também esteve presente na reunião dos estudantes com o presidente do TRE. Segundo ele, o próprio desembargador Carlos Eduardo da Fonseca Passos deixou claro que não aprovou as ações nas universidades. “O TRE do Rio não concordou com os atos abusivos. Os estudantes demonstraram sua indignação, mas saíram de lá com a informação de que o TRE tem de ser provocado por denúncias para tomar providências contra as arbitrariedades cometidas”, disse o advogado.

Após o encontro no TRE, os estudantes se juntaram ao ato em favor do candidato do PT à Presidência da República, Fernando Haddad, que partiu da Candelária, atravessou a Avenida Rio Branco e ocupou a Cinelândia. A passeata cresceu significativamente com a chegada de universitários e contou com músicos de diversos blocos de carnaval. Os manifestantes levaram cartazes com frases alusivas ao apoio do candidato do PSL, Jair Bolsonaro, à ditadura militar: “Tire seu fascismo do caminho, que eu vou eleger um professor”.