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Sob fogo cruzado

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Se nesta altura dos 12 primeiros dias de Bolsonaro nem tem cabimento cobrar resultados de governo, pelo menos parece razoável indagar se alguém, ou ele próprio, estaria preocupado em implantar e dirigir um programa que permita definir, com clareza, as competências nos temas políticos e administrativos. O presidente, se é verdade que ainda tem muito a fazer, talvez fosse conveniente priorizar logo um plano de voo para seus ministros e os dirigentes de estatais, de maneira que cada um faça o que for de seu dever e, ao mesmo tempo, conheça limites que devem estar bem definidos em cada gabinete. A esta observação, na contradita, diz-se logo que o ministro não pode ser figura estanque, mas com direito a opinar sobre temas que, mesmo escapando de suas atribuições, são do interesse de um governo no qual toma parte. Verdade que a realidade não invalida outra verdade: há questões que, sendo tratadas publicamente, antes de serem objeto de definições internas, expõem ausência de um estoque mínimo de coerência diante da opinião pública.

A sociedade tem direito de saber tudo sobre o que pensam os homens que têm as rédeas, mas precisa informar-se em relação ao conjunto do governo, principalmente quando sobrevivem divergências pontuais. Ainda agora, numa total reversão de expectativas, vê-se o general Hamilton Mourão, vice-presidente da República, levantar-se em defesa dos petistas que ocupam funções estratégicas, remanescentes de governos anteriores; o que bate de frente com o ministro Onix, este empenhado em “despetizar” o palácio, neologismo que se adéqua e define o projeto de desestruturar eventuais resquícios da Era Lula.

Ainda mais nestes dias de altas temperaturas e calor escaldante, tudo é possível: de um lado, o general tido como durão, mostra-se gentil defensor de agentes do PT em cargos de mando; na outra margem, um ministro liberal que enverga postura radical. Interessante notar que ambos são da primeira linha de influência em Brasília.

Como fica o presidente diante desse singular conflito? Um fato a mais para embasar a preocupação dos que cobram do governo maior nitidez nas formas que pretende adotar, em nome de desejável unidade, cuja ausência, sendo prejudicial a ele, não menos nociva à população. Não obstante, recorde-se que essa ideia de eliminação in totus do PT e seus séquitos foi promessa de Bolsonaro, que falava abertamente, desde a campanha pelos votos, na necessidade de varredura e limpeza, sem tolerância com os contrários. Quanto a isso, cabe dizer que o ministro Onix entrou em campo sob as bênçãos do dono do time. Tudo sugere que respaldado para demitir, porque, como em seu favor adverte Bolsonaro, “se errar eles voltam”, referindo-se aos comandados e devotos do lulismo, sem exclusão do pessoal do segundo escalão, que, como se diz, vulgarmente, é o que conhece o caminho das pedras.

Certamente ainda ecoam nas paredes da Casa Civil e ressoam nos ouvidos de Onix o que já havia notado o jurista Saulo Ramos, nos tempos de ministro de José Sarney: “observei que no governo federal os servidores do segundo escalão adoram ministro novo, porque fazem dele o que bem entendem. Enganam, dão informações truncadas, assessoram mal”. Ressalva que há honrosas exceções, que são honrosas precisamente por serem exceções.

No caso da defenestração, por atacado, dos petistas que vêm de passados dias, já se ouvem vozes palacianas a concluir que a defesa deles feita pelo vice-presidente pode redundar em tiro no pé; para doer mais tarde.