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Diálogo bem medido

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Deram-se os primeiros passos rumo ao diálogo do governo Bolsonaro com os partidos políticos e suas representações no Congresso Nacional, porque sem isso pode se tornar dificultosa a tramitação de projetos. Ainda não se pode dizer que as partes estão chegando à concretude das negociações, o que vai ficar na dependência de prosseguir, removendo detalhes complicadores, que nunca faltam. Mas começou.

É conversando que se entende, já dizia Tancredo, ao encarar o Congresso nos tempos do parlamentarismo híbrido dos anos 60, sem que hoje se saiba se a nova geração de políticos prima pelo poder de convencimento daquele velho primeiro-ministro; com um detalhe que torna os dias atuais ainda mais desafiadores, graças ao cenário do presidencialismo obrigado a conviver com o multipartidarismo. Estamos entre os casos raros dessa complicada associação. Mas é o que temos, e é com isso que temos de caminhar.

Como é da natureza política dialogar, espera-se boa disposição bilateral, porque sem isso cai-se no monólogo, o que não haveria de interessar à governabilidade. Da equipe do presidente e dele próprio aguarda-se, como postura, respeitar o poder Legislativo, que é o instrumento político da sociedade; quanto aos partidos e suas bancadas, amplamente conhecida sua tradição de agasalhar-se sob favores do Executivo, o que se cobra é comedimento no encaminhamento de suas ansiedades, sem ferir princípios éticos e morais. Principalmente estes. Porque, inobservando-se tal comportamento, cessa o mútuo respeito entre os poderes. É de se esperar para ver qual lado contribuirá com maior dose de boa vontade.

Nesse modelo de presidencialismo morto-vivo que temos no Brasil, mais facilmente se respira um grave defeito das casas legislativas, quando em seu escopo predomina a coação, muitas vezes para fazer do Executivo seu permanente refém. Ou cede ou não prospera; atende ou fica manietado. Preocupa a possibilidade de a nova legislatura continuar concorrendo para essa distorção, graças a frágeis e inexperientes bancadas, facilmente atraídas à indústria das pressões. Um modesto grupo de deputados, aliado aos mais fortes, pode ser chamado a servir de degrau para poderosos estratagemas. Não há novidade nisso.

Nem sempre o ideal é possível, e os próprios eleitores sabem disso quando votam. Mas o compromisso essencial dos parlamentares, além de não se corromperem, é não cederem ao presidente e a seus ministros, caso estes se voltem contra os altos interesses e a soberania da nação. Ao se empossarem, no primeiro dia de fevereiro, têm de ter plena consciência dessa responsabilidade em mão dupla. A bem dizer, ideal é que tais princípios já estivessem cristalinamente expostos aos interlocutores do senhor Bolsonaro nessa abertura de diálogo. Enquanto sobreviverem esse presidencialismo de coalizão, seus cacoetes e deformações, é preciso que se caminhe da melhor forma possível, a começar pela adoção do diálogo respeitoso, sem marotices e segundas intenções de ambas as partes.

Para que as relações institucionais se façam respeitar - lato sensu – o diálogo deve ser entendido, antes de tentar convencer, como a arte de fazer o outro lado compreender o fundamento do que se pretende. Presidente, ministros e deputados, todos juntos e a uma só voz, têm de ouvir, sem se acharem que são os mais poderosos, donos absolutos de todas as verdades. Não sobem sozinhos, porque na politica não há como contrariar a física, e tentar subir puxando os próprios cabelos.