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Um superdesafio

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Está aberto um longo, proveitoso, ao mesmo tempo delicado debate sobre as relações do futuro governo com setores produtivos do país, inspirado na decisão do presidente eleito, Jair Bolsonaro, de fundir as pastas da Fazenda, Indústria e Planejamento, para delas nascer no Brasil, em operação cesária, o superministério da Economia. No momento em que começam as atividades do grupo encarregado de conduzir a transição, a crianção chega prometida como passo indispensável rumo à eficiência, a começar por desburocratizar os caminhos, onde isso for possível. A experiência agora prometida procura espelhar-se em modelos semelhantes de outros países, com a ressalva, que o novo governo não deve ignorar que fusões dessa magnitude estão sempre na dependência de conjunturas locais e do potencial financeiro construído em bases diferentes das que podemos oferecer hoje. Ainda assim, em alguns deles, segundo análises de que se dispõe, a mistura não foi tão abrangente, resultado do acolhimento das opiniões de mestres de formação intelectual diversa.

O que em primeiro plano cabe discutir é se o governo conseguirá evitar, no bojo da fusão, outros excessos normativos, muitas vezes preponderantes, quase necessários na organização de um ministério enorme, onde seriam comuns conflitos entre setores de finanças e economia, sabendo-se, em boa hora lembrado, que é prioridade na plataforma do superministro a desobstrução de exigências que sempre tornaram acidentadas as relações do governo com os produtores. O que, não obstante os bons propósitos, pode condená-lo a uma incômoda encruzilhada: ter de apenas substituir velhas por novas normas reguladoras, mesmo com os canhões voltados para a desburocratização. Seria um desafio a enfrentar, como uma das surpresas da experiência que está por vir.

De outro lado, ainda divagando em cima da proposta de fusão, sob o contexto de uma pasta com capacidade de sugar outras que transitam em rotas semelhantes, é que, com ela, o governo pode se sentir estimulado a partir para metas mais audaciosas, com a intenção de acelerar a exportação a qualquer custo; e, para tanto, aplicando medidas para as quais o empresariado nacional talvez não esteja tecnologicamente preparado. Pode se dar de, em algumas vezes, os organismos industrial e exportador ficarem demasiadamente atordoados. É quando a política governamental acaba cobrando mais do que suporta a resistência de quem deseja proteger. Já se disse que, em casos tais, os governos não sabem o mal que fazem, com o bem que querem fazer.

O superprojeto ainda permanece em fase embrionária, mesmo que o ministro Paulo Guedes tenha reunido suficiente conhecimento sobre a matéria. Contudo, nem mesmo ele saberia avaliar, estando fora do governo, as totais repercussões da medida que propõe, com a promessa de modernizar a produção e torná-la mais competitiva no mercado. Seja como for, tendo ou não o ministro de corrigir a marcha de seus planos, justifica-se a linha de prioridade, que é dar combate frontal aos excessos da burocracia, responsáveis por estarmos entre os países mais atrasados nesse item. Com apenas um passo ou com muitos passos, seja qual for a dimensão da reforma, o Brasil precisa remover os entulhos cartoriais, que afetam não apenas os produtores, donos de 21% do PIB, mas infernizam a vida de todos os cidadãos.

Exigências desnecessárias, carcomidas pelo tempo, têm muito a ver com os constrangedores balanços do desenvolvimento nacional. O produtor é, antes de tudo, vítima do modelo. Nesse passo, talvez o superministro tenha conseguido ferir a questão essencial, prometendo salvar a indústria, “apesar dos industriais”. Uma advertência injusta, agravada pelo tanto que generalizou.