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Presidente sem reeleição

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Ao reafirmar ser contrário à reeleição e trabalhar para removê-la em definitivo da Constituição, no que é coincidente com matéria aprovada pela Câmara dos Deputados, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, parece admitir, e implicitamente aceitar, cinco anos de permanência no poder, o que seria a forma de compensar os curtos quatro anos, dos quais sempre se queixaram seus antecessores. Pouco tempo para o muito que se tem a fazer. Quarenta e oito meses, na verdade, acabam sendo bem menos, porque em parte consomem-se nos ajustes do começo do mandato ou na arrumação da casa para as despedidas. Extirpar o instituto da reeleição é retomar uma tradição republicana, interrompida nas ditaduras de Vargas e dos generais de 64; e, depois, o longo retorno com Fernando Henrique, Lula e Dilma. Todos os três, com melhor desempenho nos primeiros mandatos, caíram em desprestígio no segundo, sob visível tédio palaciano e exaustão da sociedade em relação a eles.

Mas também nesse particular, mesmo que repugnando a reeleição, sua e dos que vierem depois dele, o presidente tem de se preparar para reagir aos interesses políticos que se sentirão contrariados; os que encontrarão pretextos para insinuar o continuísmo, como as importantes obras de modernização, que se comprometeriam no mandato mais curto. Não faltarão aos seus ouvidos sussurros de partidos da base. Porque há decisões para as quais não basta a vontade do presidente; são poderosas as influências dos circundantes. Que se precavenha, para não ter de reconsiderar o que está solenemente prometido.

É assunto para render, como vem rendendo desde a Carta de 1891, que fixou o mandato presidencial em quatro anos, e assim veio prevalecendo até agora, mas já então excluindo a reeleição. Argumentava-se - faz tanto tempo - em favor de que não demorassem muito as alternâncias, da mesma forma como se suspeitava que o governante que não consegue resolver os problemas em quatro anos não os resolverá depois. A experiência dos tempos seguintes caminhou, diferentemente, para confirmar que o ideal situa-se nos cinco anos, evitando-se o direito à reeleição, porque esta nunca deixou de mostrar toda a sua nefasta capacidade de perturbar boas normas da disputa entre os contrários. Para quem tem a caneta na mão e o Diário Oficial de plantão, reeleição ganha-se de véspera. Provam-na as crônicas dos bem-sucedidos.

Valerá a pena destinar o mandato ampliado a quem acaba de ser consagrado pelas urnas de domingo passado? Bolsonaro, governando, então, por cinco anos, como governaram Gaspar Dutra, Juscelino, Geisel e Sarney. E sem os expedientes e armações que levem a uma elasticidade de seis anos, como se consentiu a João Figueiredo para escrever o último capítulo da ditadura. Escreveu e pediu que nunca mais fosse lembrado.

Trata-se de uma das questões que sempre comportaram divergências, sustentadas por preeminentes figuras políticas e juristas. Defensores há, e não são poucos, que subscrevem a reeleição em nome da desejada e sequencial dinâmica administrativa, desde que cobrado ao candidato temporário afastamento do cargo, impedindo que dele se utilize em benefício próprio. Mas esse impedimento com prazo fixo põe por terra o argumento da continuidade, de qualquer forma quebrado. Não menos convincente, bom seria lembrar, a contradita da terrível desigualdade de recursos entre os concorrentes. Na reeleição não há Davi que possa derrotar Golias.