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Hoje melhor do que ontem

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Os cronistas do Rio antigo escandalizavam-se com a violência que cercava cada eleição presidencial, e disso deixaram registros interessantes, retratando costumes políticos de uma época em que não se falava em fake news, fenômeno que veio concorrer para apimentar os ânimos da campanha que vai terminar no sábado. Conhecessem os expedientes atuais a serviço da mentira, os retratistas do cotidiano, como costumavam ser chamados, talvez não se ruborizassem mais que o razoável, pois, em seu tempo, raros foram os “meetings” que não resultavam em óbitos numerosos. Melhoramos, convenhamos.

O calor das disputas em determinada fase chegaria a tal ponto, que Prudente de Morais, elegendo-se, viu-se impelido a devotar boa parte de seu mandato à pacificação da política nacional. Para confirmar um capricho da Historia na crônica da intolerância, ele teria morrido com a facada que em 1897 lhe desferiu Marcelino Bispo, se o ministro da Guerra, Machado Bitencourt, não tomasse a frente para morrer em seu lugar. Sob parecidas tensões, 120 anos depois, outro de nome Bispo, Adélio, quis fazer o mesmo com Jair Bolsonaro, em uma rua mineira. Mas tratou-se de uma exceção, diferentemente de velhas conspirações.

Visto o panorama atual, com as partes digladiando com vigor, não será delírio achar que o sucessor do presidente Temer terá de aconselhar-se no passado, onde há sempre coisas a aprender; evitar o que experimentou de mal e o que ensinou para a superação das violências, sempre desnecessárias.

Do jeito como sucedem nossos dias, na refrega deste segundo turno, os casos de agressão física e uma intensa verborragia contribuíram para disseminar falsidades, não faltando ofensas aos candidatos. Mas, felizmente, não tanto como o memorialista Pedro Nava constatou na campanha de Rodrigues Alves, quando não faltaram agressões familiares, filhos tidos como fruto de bastardias e inconfidências de alcova. A honra no lixo. Nada sobrevivia à sanha dos contendores, num tempo em que o Rio tinha de dividir atenções entre a eleição e a tragédia demolidora da Gripe Espanhola. Felizmente em 2018 não descemos a essa infâmia.

Ainda para preservar e defender nosso tempo, cabe falar das antigas e monumentais fraudes, agora impossíveis, mas outrora comuns. Anis José Leão, um especialista eleitoral, informa: “No Rio de Janeiro, por volta dos anos 20, os cariocas haviam instituído a prática de pancadarias e sequestro de urnas; pela frequência com que os eleitores votavam em envelopes de certa cor, era fácil saber qual partido receberia mais votos, e os capangas do desfavorecido armavam confusão e as urnas sumiam”.

Não se pode negar que progredimos muito, mesmo que agora, como outrora, o conjunto de desvios levou e leva o processo eleitoral a tropeçar, ao mesmo tempo em que remete a uma importância secundária os temas de relevo para o futuro do país. Outra inconveniência entristecedora, esta mais recente, é o bate-boca entre candidatos, empenhados em ofuscar o momento cívico. Antigamente, sem rádio e televisão, a guerra de palavras se limitava a poucos jornais e revistas caricatas, ou na tribuna do Palácio Monroe.

Avançar é sempre preciso. Da mesma forma como erros e vícios ficaram condenados a crônicas remotas, as coisas que hoje destorcem e comprometem o processo eleitoral haverão de estar superadas, mais cedo ou mais tarde. É o que permitirá poupar o futuro, por exemplo, de fake news, grave defeito da atualidade, que precisa ter vida curta. Tomara.