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Hora do diálogo produtivo

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O primeiro desafio do novo presidente da República, sendo diferente ou não de todos que o antecederam, é dar os passos iniciais para tornar mais fácil, ou menos difícil, sua convivência com o Legislativo, tarefa ingente, se for considerado que sua eleição se dará em clima de acentuado antagonismo entre as principais forças políticas, tal como nos revela o segundo turno. Tancredo Neves, que em 1985 viu-se empenhado na construção de sólida base parlamentar governista, definia esse trabalho como uma de duas engenharias que se tornariam inarredáveis. A outra, aliviada pelo talentoso assessoramento de Thales Ramalho, era a formação de uma base de apoio em que se sentissem contempladas todas as forças políticas protagonistas da transição democrática. Quem seria o novo Thales disponível para já em novembro entrar em campo?

Obter simpatia das bancadas, principalmente diante de uma expressiva renovação, com deputados e senadores ávidos em obter espaços políticos, é o esforço que no alvorecer da Quinta República comparava-se a dividir um bolo, de forma que cada um achasse que tinha ficado com a fatia maior. Se nunca foi fácil para Tancredo e outros governantes passados, não haveria agora de ser diferente.

Dessa convocação não escaparia Jair Bolsonaro ou Fernando Haddad, talvez até com a sobrecarga de um fator a mais da atualidade: ambos são donatários de consideráveis índices de rejeição e protagonizam uma disputa eleitoral mais radicalizada no segundo turno; e por isso mesmo capaz de guardar feridas e ressentimentos. Tão mais delicada tal empresa, se, conseguida a vitória, o presidente mantiver disposição de incursionar em projetos de acentuado perfil polêmico. Para citar um entre os temas mais sensíveis, a inevitável reforma da Previdência.

Um alívio a considerar, se bem aproveitado (os dois finalistas da corrida eleitoral certamente têm agentes qualificados para aproveitá-lo) é que a nova legislatura, se teve o destino de se compor de vários partidos fracos, ameaçados pela cláusula de desempenho, pode se abrir a um diálogo menos exigente, mais voltado para os interesses legítimos da sociedade, facilitando o intercâmbio entre os poderes. É o que tem de ser feito, antes que, pobres de poder, as legendas mais modestas optem por migrarem rumo a partidos maiores. Seja como for, ao governo não é dado o luxo de caminhar e agir à revelia do Congresso Nacional, sede legítima da política nacional. Talvez o capricho das urnas, além de ter fragmentado a nova representação, sirva de subsídio ao presidente, qual dos dois for, para reduzir as dificuldades a um número tolerável.

Não apenas no Brasil, mas em muitos países com dificuldades legislativas, a proliferação das siglas tem causado dificuldades. O pensador Karl Popper, que estudou a matéria a fundo, indica como principal ponto negativo a dificuldade para a construção de forças de coalizão, o que muitas vezes torna-se indispensável para a governabilidade. Afora outra realidade, com experiência brasileira no recente fracasso da reforma previdenciária: a perigo da diluição de responsabilidades.

A estimativa do volume e da profundidade dos problemas que aguardam o presidente a ser eleito no dia 28 permite considerar que uma convivência produtiva entre Executivo e Legislativo será fundamental para o país avançar no que for preciso. E abrir melhores caminhos de colaboração política que permitam alcançar os objetivos.