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Presente de grego

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Figura entre os últimos atos do presidente Temer uma reunião, ainda que oficiosa, com seu sucessor, que será conhecido em outubro próximo. Poderiam tratar de um conjunto de problemas gerais, mas esses ficariam em melhores mãos com os integrantes do grupo encarregado da transição, que também logo se comporá. Mas o que, objetivamente, vai compor a pauta do encontro é o perigoso quadro em que se precipitou a Previdência Social no país, particularmente os encargos da aposentadoria, que, aos trancos e barrancos, veio se arrastando e se agravando nos três últimos mandatos presidenciais; mas já agora com visíveis sintomas de um próximo colapso. Portanto, ao sucessor, com nenhum carinho, um verdadeiro presente de grego.
A fim de que a situação não progrida para dificuldades ainda maiores, torna-se evidente que medidas saneadoras têm de vir em socorro, o quanto antes. A gestão Temer, sem ignorar isso, preferiu expor a questão, em grau de reforma, ao Congresso Nacional, quando já se avizinhava a campanha eleitoral. Assustou deputados e senadores, tementes quanto aos desgastes com a sociedade, à qual certamente será ministrado algum sacrifício. Os remédios amargos, sabem os congressistas, geram náuseas aos eleitores e escassez de votos, algo que horroriza a quem está sonhando com urnas generosas.
Mostrar ao sucessor que a reforma se impõe, a reclamar tal iniciativa o quanto antes, se possível logo nos primeiros meses do novo governo. Uma pressa que se justificaria, pois daria tempo razoável para a nova administração se refazer dos arranhões políticos e da ira natural de quem tiver interesses afetados.
Abrindo-se o diálogo sobre matéria tão melindrosa – e aqui avulta a experiência pessoal de Temer -, já não vai bastar falar ao novo presidente, seja quem for, sobre a situação que vai herdar e os curtos tempos para soluções adequadas. É indispensável conversar com os deputados e senadores, que logo depois, no primeiro dia de fevereiro, estarão abrindo a legislatura. Os que hoje lá estão, e muitos lograrão a recondução, impediram que a reforma da Previdência caminhasse. Nada impediria que tal disposição se repetisse, a menos que prevaleça uma boa conversa, removendo temores e dúvidas quanto a aspectos políticos e eleitorais; preocupariam apenas esses dois aspectos, porque, quanto à essência, a reorganização da estrutura previdenciária, são poucas as reais temeridades até agora conhecidas e justificadas. Com maior ou menor intensidade, mexendo-se no todo ou em particularidades dos problemas mais corrosivos, muita coisa precisa ser feita.
Sendo a Previdência refém do Estado, que não apenas a tomou para si, como também fechou as portas a uma ampla participação privada nos planos de capitalização e benefícios, ficou toda a responsabilidade sobre os ombros do governo. E ele sempre impotente para atacar focos de corrupção, desmandos e o poderoso clube de aposentadorias privilegiadas. São conhecidas as forças que travam, com a simpatia de setores políticos, em sua maioria instalados no Parlamento.
O que desanima confiar e adotar o caminho da previdência privada é que, quando experimentada, gozou de descontrole, a cavaleiro de conivências criminosas; em muitos casos desaparecendo, sem deixar rastros. Não fossem os tristes antecedentes, hoje seria uma alternativa para o cidadão brasileiro escapar dessa situação de depender do INSS, contribuir compulsoriamente, e assistir, desolado, à desvalorização do seu benefício, que cai na mesma proporção em que sobem as aposentadorias precoces e milionárias.