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Momento de paz na campanha

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Há um sentimento de solidariedade e comiseração quase atávico na cultura brasileira, o que alguns já cuidaram de definir como fenômeno de hereditariedade social. Não parece ter sido diferente o que ocorreu logo após o atentado contra o deputado Jair Bolsonaro, em Minas, onde, ontem, celebraram-se missas de desagravo ao estado, que nada teve a ver com o gesto tresloucado, ameaçando complicar gravemente o processo eleitoral. Se os mineiros e quaisquer outros, onde quer que vivam, repudiam a violência, independentemente de quem for a vítima, viu-se um olhar quase de ternura dirigido ao candidato, incluindo seus mais ferrenhos adversários. O Brasil se comove ante casos como esse, nem se dispôs, a avaliar, pelo menos por hora, se o sangue que o candidato derramou vai influir no destino das urnas, contra ou a favor dele. Não há tempo nem vagar para isso.
O ato de intolerância de quinta-feira, que logo ganhou repercussão em todo o país e nos principais centros do mundo, veio contribuir para arrefecer um pouco a campanha dos adversários da vítima; e alguns deles apressaram-se em remover de seus programas os discursos ácidos contra Bolsonaro, e que não eram raros. Tomaram providências imediatas para substituir críticas por pesares, pois sabiam, e continuam sabendo, que o sentimento nacional de piedade passou a residir no hospital paulistano em que ele convalesce; e atacá-lo, neste momento, é contraproducente.
O tom da disputa perdeu um pouco do calor, após o atentado, como facilmente se pode identificar. Um pouco sem sal, dizem os políticos, até porque o próprio candidato ausente sabia, mais que os outros, como dar o condimento apimentado ao debate. Certo é que a campanha ganhou um poderoso imprevisto, o que autoriza esperar que, em um momento tão singular, estando içada, mesmo que temporariamente, a bandeira da paz, seria justo esperar, ausentes as agressões verbais e as admoestações pessoais entre os candidatos, que o tempo no rádio e na televisão se preocupe mais com ideias políticas claras e projetos objetivos. Se antes do grave incidente com um candidato que vinha obtendo desempenho nas pesquisas, essa objetividade era reclamada, mais agora faz sentido, no momento em que a solidariedade com um dos concorrentes recomenda que cada um cuide de si e dos eleitores.
Se, por todos os motivos, o atentado ganhou protestos gerais; se o golpe contra o deputado feriu não apenas sua integridade física, mas o livre direito de defender suas propostas, democraticamente, que sirva, pelo menos, para sugerir aos candidatos que adotem discursos propositivos. Porque quanto mais se adotar esse modelo, menores espaços estarão reservados às críticas os arroubos, e afastada a tentação para a violência. Nada melhor para conferir proveito à campanha eleitoral, que já vai caminhando para seus capítulos finais.
É a contribuição que se espera dos candidatos e também de seus colaboradores. Estes, muitas vezes tornam-se pregoeiros do acirramento dos ânimos, sem maiores cuidados com os prejuízos que podem estar elaborando. Uma cota da deseja paz na reta final da campanha cabe a eles. A outra parte, de igual importância, espera dos setores de segurança, que se dispõem a dar garantias, só quando requisitados. Deviam cuidar de todos os candidatos à Presidência da República, independentemente de serem solicitados, porque, estando expostos na disputa, a segurança deles deixa de ser apenas um direito pessoal, para ser interesse da normalidade política da nação.