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O maior pecado do Rio de Janeiro

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Três menores de idade morreram no Rio de Janeiro, vítimas de armas de fogo, entre os dias 2 e 4 de novembro. Todos eram pobres e moradores de favelas, perfil preferido de projeteis de qualquer calibre. A família de Thiago de Souza, que tinha 14 anos e morava em um barraco na Cidade de Deus, não tinha sequer como pagar pelo enterro do garoto, morto na sexta-feira, dia 2. Amigos e vizinhos fizeram uma vaquinha na internet e conseguiram o dinheiro necessário.

Ao todo, 65 crianças e adolescentes foram baleados na Região Metropolitana desde o início da intervenção na Segurança Pública, em fevereiro, até a metade do mês passado, segundo o laboratório de dados Fogo Cruzado. O número equivale a mais de oito feridos por mês, sendo que 35% não resistiram e morreram. De todas as tragédias políticas e sociais que caem sobre a população, aos olhos dos direitos humanos mais básicos o assassinato de crianças é o nosso maior pecado.

Não é incomum que as vítimas sejam atingidas dentro de casa ou na escola, locais onde deveriam se sentir mais seguras. Wanderson Santos, de 15 anos, morava no Morro da Fé, na Penha. Ele acordou no sábado, dia 3, com o barulho de tiros e resolveu fechar a janela, quando foi baleado nas costas. O terceiro adolescente, morto no domingo, dia 4, até o momento não foi identificado. O rapaz andava de bicicleta em Manguinhos, Zona Norte do Rio, na hora em que ocorreu um confronto entre policiais militares e traficantes da região.

Atingido lendo um livro em uma praça na Cidade de Deus, Thiago pediu à mãe para não morrer. Foi socorrido, passou por três cirurgias, mas infelizmente não foi salvo. Ele queria ser jogador de futebol, como a maioria dos meninos brasileiros.

Presentes ao enterro de Thiago, os amigos dele tinham ao mesmo tempo uma expressão de dor e incompreensão. Não é simples, nem para adultos, entender o fracasso generalizado que leva ao assassinato de um jovem. O trauma de ver alguém da mesma idade, no início da vida, dentro de um caixão por causa da violência é carregado para sempre.

Repetir que a culpa é do Estado não é suficiente. Ainda não percebemos que a dor de cada família que perde um filho é a dor de toda a população fluminense. Escolhemos atirar na “cabecinha” dos bandidos como solução para problemas sociais profundos e ignoramos a responsabilidade de cada cidadão na construção de uma sociedade melhor.

A preparação para uma vida marcada pelo crime começa cedo no Rio de Janeiro. Armas, drogas e violência passam a fazer parte do cotidiano ainda na infância e acompanham os moradores das periferias até a morte. Ao invés de esperança por dias melhores, visto que acabamos de eleger um novo governador, o medo cresce nas regiões dominadas pelo tráfico de drogas. Medo de mais inocentes assassinados ao acordar, lendo na praça ou andando de bicicleta, talvez atingidos por um drone.

* Escritor gonçalense

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