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Ter ou ser feliz?

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Na sociedade moderna, segundo indicadores econômicos, a disponibilidade de bens e utilidades é impressionante, contudo o mal-estar e a desorientação psíquica são indiscutíveis. Os recursos produzidos pela indústria, mercantilizados para consumo, principalmente nos países desenvolvidos, são abundantes. No entanto, nem sempre as pessoas se sentem felizes e, em consequência, maximizam suas razões de insegurança.

Objetivo a ser alcançado, em todos os tempos, a felicidade começa a ser estudada pelas ciências sociais. As pessoas, no mundo ocidental, apesar da afluência econômica, não se tornaram mais felizes nos últimos 50 anos. Muitas ficaram ricas, trabalham menos, têm mais férias, viajam mais, vivem mais tempo e são mais saudáveis. Contudo não estão mais satisfeitas. Hoje é possível medir esse grau de insatisfação, pois a Psicologia Econômica, disciplina sistematizada, conseguiu resultados qualitativos no estudo de Richard Layard, de título “Happiness: has social science a clue?”.

A abundância e a prosperidade trazem, sem dúvida, satisfação e prazer, todavia existem fatores que reduzem muito esse ganho. Um dos mais importantes é o efeito relativo, já que o progresso, por mais notável que seja, é anulado quando nos comparamos, por exemplo, aos vizinhos que tiveram um benefício superior. Na nossa sociedade, eminentemente competitiva, é possível ter muito mais e não se sentir melhor. Por mais que consigamos, estamos sempre insatisfeitos porque queremos ser o melhor do mundo.

A mesma análise diz respeito a razões mais profundas para a falta de satisfação na abundância. Com a ciência capaz de medir o bem-estar, a partir de inquéritos, experiências comportamentais e outros estudos, é possível também determinar as suas fontes e assim identificar os fatores de que a prosperidade nos faz perder. O homem do Racionalismo e do Positivismo apostou tudo no avanço da ciência e da técnica e ganhou abundantemente com essa experiência. Os benefícios materiais que conseguiu foram superiores aos seus sonhos mais ambiciosos, mas não justificam sua razão de viver.

Os espantosos progressos nos cuidados de saúde, no rendimento financeiro, no conforto, na segurança econômica, no emprego, na liberdade política e social, fatores desencadeadores de bom êxito, não vêm satisfazendo plenamente. Esses objetivos, segundo o estudo, foram enfraquecidos por perdas fundamentais nos valores da família, na religião e na falta de limites éticos, mantendo-se o estranho paradoxo de o dinheiro não trazer, por si só, a felicidade.

Desta forma desapareceram os grandes princípios do cenários da vida humana e seu lugar foi usurpado por pseudoatores que variam seu disfarce dia a dia. O prestígio como força interior cedeu ao prestígio como força econômica; como compaixão cedeu à bestialidade instintiva; como respeito cedeu à insolência; como dignidade cedeu à prepotência; como sinceridade cedeu à mentira em todos os níveis. Para que continuar com esta comprida lista de maus atores da moda?

Para chegarmos à civilização voltada para a verdadeira realização, seria preciso que fossem conquistados grandes progressos do espírito humano, não tanto de suas capacidades técnicas e materiais, mas em sua interioridade psíquica. É preciso, pois, uma reforma radical de todos os sistemas de educação, destacando-se a necessidade mais premente de se cultivar o espírito de tolerância e das faculdades intelectuais e morais.

* Sociólogo e professor