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Incêndios - fragmentos do Diário de Guerra e Paz

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Dia 15/10, sai uma nova pesquisa

O mundo inteiro, atônito, se pergunta como podem os brasileiros votar em um patético deputado que em 28 anos nunca fez nada a não ser colocar os filhos como herdeiros à moda do velho coronelismo, manter funcionários fantasmas, receber auxílio-moradia, tendo apartamento próprio, e que empunha agora a bandeira fascista do ódio, da militarização, da intolerância. A tese do antipetismo não funciona fora do Brasil, nos países que raciocinam com fatos e dados. Nesses países, o Brasil conquistou a admiração dos mundos político, econômico, diplomático e acadêmico nos anos de Lula. Mas, por aqui, vamos de novo encarar essa tese. O último argumento é que Lula não teria tido a grandeza de fazer um acordo que deixasse o PT como vice numa chapa de centro-esquerda. Mas a eleição não terminou e ainda é possível vencer a barbárie. Se Lula errou e os que dizem isso não apoiam agora um candidato que não é do seu partido, estão repetindo o mesmo erro. Isto é, se os acusadores assustados fizerem agora o que disseram que Lula devia ter feito, abrirem mão das suas posições partidárias para defender a democracia, ainda há chance de ganhar.

Enquanto isso, o fascismo, mordendo com discursos extremistas e soprando com mentiras, conta com o apoio ou pelo menos o silêncio cúmplice da maior parte da imprensa.

Sábado, dia 20/10, pensando na virada

Uma declaração de posse para Fernando Haddad, se ele ganhar esta eleição, poderia ser assim: Agora, na Presidência, não estão apenas os partidos da minha coligação. Não estão apenas os partidos que me apoiaram plenamente ou com reservas. Estão também os partidos que se declararam neutros e liberaram seus filiados e eleitores para votar como quisessem. Mas não só. Estão na Presidência os partidos de esquerda, de centro-esquerda, de centro, de centro-direita, de direita. Alguém que esteve enganado por falsas narrativas desta eleição, talvez diga, ah, então quem está na Presidência é a velha política. E eu direi que não, que é a POLÍTICA, com maiúsculas. E a quem disser que estou acenando a adversários, buscando uma composição sem corpo e sem cara, segundo os valores da velha politica, direi também, enfaticamente, que não. Estou chamando a que venham fazer oposição os que têm posições opostas às nossas, venham para os diversos níveis democráticos da discussão, da luta de ideias e opiniões, das disputas democráticas. Quem está na Presidência é a Democracia.

Domingo, dia 21/10, as percepções tardias

Fernando Henrique Cardoso sentiu cheiro de fascismo no ar, com a declaração de Eduardo Bolsonaro de que basta um cabo e um soldado para fechar o Congresso. Ministros do Supremo (três) consideraram a declaração extremamente grave. É sempre surpreendente o raciocínio lento dos que deveriam ser os mais atentos na defesa dos princípios básicos da democracia. Não quero falar do tempo em que eram poucos, além dos seus pares no Congresso, os que sabiam das convicções e declarações estapafúrdias de Bolsonaro e o tratavam como um personagem patético, ignorante e desequilibrado. Mas a partir do dia tristemente histórico em que “ele” dedicou seu voto pelo impeachment ao coronel Brilhante Ustra, o cheiro que só agora FHC começa a sentir começou a se espalhar pelos ares dos nossas várzeas e nossos bosques, que têm (tinham?) mais flores e mais vida. A gravidade que os ministros começam a perceber deveria ter sido percebida já naquele dia e provocado alguma reação imediata: em muitas democracias, uma declaração como aquela, fazendo a apologia de crimes de lesa-humanidade, pode custar a prisão imediata de quem a deu.

Segunda-feira, dia 22/10

Ou o Brasil muda esta semana, ou o incêndio do Museu Nacional terá sido só o começo da destruição da nossa história.

* Diretor e autor teatral, ator e apresentador