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Direitos humanos e tributação

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A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi proclamada pela ONU em dezembro de 1948, estando, hoje, às vésperas do seu 70º aniversário. Elaborada por homens e mulheres de diferentes nacionalidades, ela reflete o consenso mínimo necessário para a existência digna de todos os seres humanos, independentemente de sua condição sociocultural ou orientação sexual, política e religiosa. A Declaração Universal dos Direitos Humanos tem sido fonte de inspiração para diversas constituições nacionais, não sendo diferente com a Constituição brasileira, que ora completa 30 anos.
Em consonância com as normas internacionais de direitos humanos, a Carta de 1988 assume a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República. Contudo, o direito à dignidade não se efetiva por geração espontânea. Para que se materialize é necessário um mínimo existencial sem o qual resta fraturada a própria noção de humanidade. Em apertada síntese, o mínimo existencial contempla tanto as liberdades civis e políticas quanto os direitos elementares à educação, saúde, trabalho, moradia, justiça e meio-ambiente.
Mas o Brasil não respeita as normas internacionais de tutela aos direitos humanos e ignora os fundamentos de sua própria Constituição. Segundo o relatório “Síntese de Indicadores Sociais”, publicado em dezembro de 2017 pelo IBGE, o Brasil é um país com 50 milhões de pobres e altos níveis de desigualdade social. O caráter multidimensional da desigualdade social brasileira permite ver que as regiões Norte e Nordeste são mais pobres que o Centro-Sul; os negros e pardos são mais pobres que os brancos; e as mulheres são mais pobres que os homens. Do total, 25,4% dos brasileiros possuem renda familiar de até R$ 387,07. Além disso, a renda total dos 10% mais ricos é 3,4 vezes maior que a dos 40% mais pobres.
Em um estado democrático de direito, a tributação é um dos principais instrumentos de efetivação do mínimo existencial. Mas no Brasil o sistema tributário é absolutamente injusto. Quais os vetores dessa injustiça? Primeiro, ele não tributa o lucro distribuído pelas empresas aos seus associados, incidindo fortemente sobre o salário dos trabalhadores. Segundo, inexiste um imposto progressivo sobre grandes fortunas, sacrificando a riqueza eventualmente acumulada pelas camadas médias. Terceiro, a tributação incide especialmente sobre a renda e o consumo, preservando os grandes patrimônios. Quarto, o crime tributário compensa para os mais ricos, incentivando a sonegação fiscal. Por fim, os juros são estratosféricos, privilegiando o capital financeiro sobre o capital produtivo e o rentismo sobre o trabalho.
A necessidade de uma ampla reforma tributária que iniba a regressividade do sistema e cobre mais daqueles com maior capacidade contributiva não pode ser apenas um mantra pré-eleitoral, repetido cinicamente a cada quatro anos. Trata-se de um imperativo de civilidade e justiça! Para ajustar-se às normas internacionais de direitos humanos e às diretrizes de sua “Constituição Cidadã”, o Brasil deve erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades sociais, efetivando um patamar aceitável de dignidade humana. A reforma tributária é um dos vetores necessários dessa transformação. Só assim o país poderá superar a barbárie de seu cotidiano e aspirar à construção de um verdadeiro Estado Democrático de Direito.

* Advogada, presidente da CBA
** Advogado, professor do Ibmec

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