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Democracia - salvação ou frustração?

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Democracia é um termo cunhado pelos gregos, significando o “poder do povo”. Como um sistema, existe há milênios, embora só tenha começado a ser utilizado na política há pouco mais de 100 anos. Depois de adotada por gregos e romanos, a democracia foi esquecida em favor de monarquias, impérios e ditaduras.

Hoje em dia, é considerada como um sistema moderno, capaz de ouvir o povo, respeitar seus desejos com o objetivo de criar uma sociedade melhor e mais justa. Por outro lado, os sistemas democráticos implantados criaram vários problemas no mundo moderno. Discutiremos ao longo desse artigo, portanto, se a implantação e operação desses sistemas democráticos é benéfica para a sociedade como um todo.


Em vários países, especialmente aqueles os subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, o regime democrático trouxe tanto benefícios quanto problemas. No caso do Brasil, a prevalência da corrupção no cotidiano político trouxe para muitos uma saudade do regime ditatorial (1964–1985), um sentimento que cresceu com a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Jair Bolsonaro, conhecido por sua posição pró-ditadura, é o atual líder nas pesquisas eleitorais (com exclusão de Lula do pleito) para a Presidência da República. Esse fato é um bom indicativo do que o brasileiro pensa do regime democrático vigente.


Em países como a Rússia o problema é semelhante. Em 1996, quando Boris Yeltsin vislumbrou perder as eleições para um rival comunista, fez um pacto com um grupo de “empresários”. Em troca da influência deles sobre a mídia, Yeltsin iria decretar a privatização de diversas estatais a preços de banana (o que era de interesse desse grupo, que eventualmente comprou essas empresas). Isso fez a Rússia retroceder mais de uma década, levando a uma crise ligada à corrupção, que, com o advento da crise da Ásia em 1998, levou a renúncia de Yeltsin no ano seguinte.


O outro problema com a democracia é a sua vulnerabilidade a avanços de outros regimes políticos. Muitas ditaduras foram erguidas a partir de “vácuos de poder” existentes em regimes democráticos, como no caso do governo provisório que perdeu o controle da Rússia para Lenin e os bolcheviques, e mais recentemente na Venezuela, que não conseguiu impedir a consolidação de Nicolás Maduro como um ditador (através de uma eleição manipulada). Outros problemas podem ser encontrados em países que têm muita instabilidade política, como é o caso da Itália, que já teve 65 governos formados nos últimos 60 anos desde a morte de Mussolini, o que é melhor que conviver com um ditador que apoiava Hitler, mas não um exemplo de regime político funcional.


Porém, a implementação da democracia trouxe vários benefícios ao mundo atual.


Primeiramente, levou a uma redução das guerras e dos conflitos internacionais, porque decisões implementadas por uma maioria, e não por um indivíduo ou pequenos grupos, levam a um comportamento mais racional. Além disso, muitos argumentam que regimes democráticos trazem benefícios à população, já que os políticos precisam “agradar” o eleitorado de modo a angariar votos nas eleições, diferentemente de monarcas ou ditadores que governam a seu bel prazer.


Outro ponto positivo seria que a democracia evita, na maioria dos casos, a monopolização do poder por um determinado grupo ou partido, já que além de eleições frequentes a maioria dos regimes implementa limites aos mandatos, principalmente no Poder Executivo.


Existem, de fato, vários exemplos de democracias bem-sucedidas ao redor do mundo. Um dos melhores casos de estudo é a Alemanha, que saiu derrotada de duas guerras provocadas, ora por um monarca ora por um ditador. Depois de ser associada diretamente ao racismo e à ideia de uma raça pura, a Alemanha prosperou com seu regime democrático, conquistando o posto de um dos países mais avançados do planeta e, surpreendentemente, aberto a todas as etnias (é o país que recebeu mais refugiados dentro da União Europeia nos últimos 10 anos).


Outro exemplo de sucesso é a Finlândia, que de acordo com o “2016 Democracy Index”, da revista “The Economist”, é o nono no ranking mundial, tendo certamente se beneficiado da democracia lá implantanda, seja por ter desenvolvido um dos melhores sistemas de ensino do mundo, seja por ser considerado um dos países mais livres em termos de direitos humanos e políticos, ou mesmo por ter criado um dos sistemas de Justiça mais independentes de acordo com o estudo do World Economic Forum.


O Brasil, por sua vez, é um dos casos mais complexos de democracia, onde o sistema implantado exemplifica tanto os pontos positivos quanto os negativos da democracia. De um lado temos líderes democraticamente eleitos, mas que, mesmo sendo considerado ilegal, de fato recebem recursos de empresas e organizações para ter maiores chances de alcançarem essas posições. Depois de receberem esses recursos, é um “dever” dos candidatos, agora eleitos, retornar o favor, seja por apoiar as referidas organizações ou votando para aprovar leis que beneficiam, direta ou indiretamente, seus “patrocinadores”.
No presente, o país está envolvido no maior escândalo político da sua história, a Operação Lava Jato.

Dezenas de políticos já foram presos e a maioria dos representantes eleitos tem processos e/ou investigações em curso. Confiança no sistema se perdeu entre os brasileiros, substituída por um sentimento de que nada e ninguém podem modificar a cultura vigente na classe política.


Em seu lugar, a população está lentamente voltando a apoiar candidatos com discurso mais duro, mais nacionalista e que, em casos extremos, apoiariam a volta de um sistema militar.


Só a ideia que os brasileiros voltariam a apoiar candidatos de extrema direita seria considerada loucura há 30 anos. Na década de 80, o povo foi às ruas na campanha “Diretas Já”, protestando por liberdade política e o fim da ditadura militar.


Da mesma maneira que criticamos o sistema democrático atual, na época criticava-se o regime ditatorial, tanto do ponto vista político quanto do desempenho econômico. Alguns sentem saudades dos dias de “glória” do regime militar, alegando que era seguro passear pelas ruas, o desemprego era menor, a economia crescia e a inflação não era um problema. A demonstração mais clara desse sentimento é o apoio significativo a Bolsonaro e outros candidatos com linhas de pensamento similares.


Se grande parte desses fatos era verdade, também é verdade que o regime militar é lembrado de uma maneira romântica, mascarando certas realidades da época (a economia entrou em colapso e a inflação galopante começou no início da década de 80 em pleno regime militar).


Do outro lado, mesmo com o Brasil vivendo uma crise profunda, a maioria da população ainda defende o sistema democrático. O principal argumento é que cada cidadão é empoderado, com voz para criticar políticos eleitos, protestar nas ruas, divulgar opiniões sem medo de censura e lutar por seus direitos.
Esse debate contínuo é o que torna o país um caso de estudo interessante, tendo vivido por regimes ditatoriais e democráticos nos últimos 50 anos. Em geral, ambos os regimes têm seus prós e contras, dependendo da visão de cada indivíduo. Embora regimes militares possam prover supostamente mais estabilidade e segurança, eles tendem a impor controles de informações (censura) e condenar opiniões dissidentes. Embora democracias sejam favoráveis à liberdade de opinião e ao direito de escolha, esses regimes não necessariamente conseguem instaurar estabilidade política num país.


Como pode ser visto, existem várias perspectivas em torno desse debate e, de maneira geral, a efetividade do sistema democrático continuará por muito tempo. Pelos exemplos descritos acima, fica claro que a democracia, por si só, não é a “salvadora da pátria”, como outrora foi idealizado, e que em muitos países acabou por produzir resultados negativos, gerando instabilidade e frustração. Entretanto, é questionável se há sistemas melhores para serem adotados, e que para fazer a democracia realmente funcionar, precisamos continuar a evoluir, implementando mudanças e continuando a demonstrar insatisfação com os resultados apresentados até agora.

*Estudante de 15 anos da Escola Britânica do Rio

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