A empresária Maíra Fontana, 38, buscou as duas filhas, uma de 7 e outra de 10 anos, na escola em uma quinta-feira de setembro, no Morumbi, em São Paulo. Às 18h10, guardou as mochilas das meninas no porta-malas do carro, colocou a filha mais nova no banco de trás, ajustou o cinto da mais velha e se preparou para sair. Foi quando ouvi o barulho da porta traseira do veículo abrir novamente. Era um homem.
"Demorou para a gente saber o que estava acontecendo. Achei que era algum conhecido, o pai de alguma colega. Aí minha filha que estava no banco de trás gritou. Ele tinha uma arma."
O homem queria uma quantia exata: R$ 2.500. Instruiu que fossem a uma agência bancária mais próxima para retirar o dinheiro. Mas era hora do rush. "Levei 40 minutos para chegar, por conta do trânsito", diz Fontana.
"Quando eu parei na agência para sacar o dinheiro, ele não deixou eu levar as meninas. Foi o momento de maior angústia e desespero, medo de sair do carro e ele ir embora com elas. Falei: 'Calma, a mamãe vai dar o dinheiro que ele quer'. Eu fui e voltei correndo e, enquanto puxava as meninas com uma mão, dava o dinheiro com a outra."
O assaltante fugiu com o carro. Fontana foi a um posto policial perto de onde elas foram deixadas e os policiais conseguiram abordar o carro a um quilômetro de distância.
Apesar de recorrentes e traumáticos, esses registros estão em queda em São Paulo, após atingirem recorde em 2013, com 1.411 casos. O recuo foi de 80% em relação ao índice deste ano. Comparado a 2018, os casos neste ano recuaram, até agora, 42%.
A análise dos boletins de ocorrência registrados mostra que a maior parte desses crimes acontece à noite --26% do total, entre 20h e 22h. A maioria das vítimas é homem e tem entre 20 e 30 anos.
Há registros desses crimes em todas as regiões da capital, inclusive nas áreas pobres, mas a concentração maior é nas zonas sul e oeste, regiões mais ricas e residenciais.
O Código Penal prevê, desde 2009, pena de seis a doze anos de prisão, além de multa, para quem comete o crime de sequestro relâmpago. Se houver lesão corporal ou morte, essa pena pode subir para de 16 a 30 anos de reclusão.
Para a delegada titular do 89º Distrito Policial, no Morumbi, Roberta Guerra Maransaldi, esses crimes caíram porque houve uma migração para atividades menos arriscadas e mais lucrativas para os bandidos.
"O ladrão não vai correr o risco de ficar horas num carro com uma pessoa para sacar R$ 2.000, quando pode ir a um ponto de ônibus às 5h da manhã e roubar, em dois minutos, quatro celulares"
Concorda com ela Rafael Alcadipani, especialista em segurança pública e professor da Fundação Getúlio Vargas. "Se você rouba relógio, celular, é mais fácil, e está sujeito a uma pena menor", diz.
O pesquisador aventa outros motivos: operações da polícia para desarticular quadrilhas que atuam nesses crimes e maior preparo dos sistemas bancários para identificar saques e operações suspeitas e bloquear o cartão.
Além disso, os especialistas apontam também que sistemas de tecnologia usados pelo governo tendem a atrapalhar a fuga desses bandidos. O Detecta, por exemplo, sistema de câmeras inteligentes do governo estadual, identifica em pouco tempo um carro roubado, pela placa, e dispara alertas à polícia.
A tecnologia, porém, chegou para os dois lados. Há registros de bandidos que carregam máquinas de crédito e débito, de modo que nem sequer precisam levar as vítimas a uma agência bancária.
Mas o método ainda é raro, diz a delegada Maransaldi, e não tem muito futuro, porque é possível rastrear quem recebe o pagamento. Há empresas que pedem apenas um CPF para vender a maquininha, o que se pode forjar, mas ainda há como rastrear para onde o dinheiro vai.
A maior parte das vítimas desse tipo de crime são abordadas quando está de carro. Maransaldi recomenda que motoristas não se alonguem nas chegadas e saídas e não percam tempo mexendo no celular dentro do veículo.
Também recomenda que pelo menos um amigo ou familiar conheça seus trajetos e horários.
"Mas o principal é que as pessoas observem, sejam mais solidárias. Se as pessoas prestarem mais atenção ao seu redor, podem avistar alguma ação suspeita, avisar a polícia e colaborar com as investigações."
O crime deixou marcas em Maíra Fontana. Durante uma semana, sentiu dores de cabeça e dor no corpo constantes. As filhas estão bem, mas, hoje, "escureceu um pouco, elas falam para trancar as portas do carro, ficam com medo", diz.
"Quando passa alguém com cheiro mais forte de suor, elas comentam que era o cheio do assaltante." Ela conseguiu recuperar os bens roubados, já que o criminoso foi preso pouco depois. "O principal foi manter a calma. Como mãe, percebi todo o perigo da situação. Mas conversei com as minhas filhas e deu tudo certo." (Thiago Amâncio/Folhapress)