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Doria é stalinista ao rejeitar discordância, diz tucano de esquerda

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Na última sexta (24), quando o governador João Doria (PSDB) disse que está construindo um novo partido e que quem discorda deve pedir para sair, fazia referência implícita a Fernando Guimarães.

O sociólogo está à frente da corrente Esquerda pra Valer (EPV), que existe no PSDB desde 1993, e constrói o movimento Direitos Já, Fórum pela Democracia, que reúne dez partidos, incluindo o PT e siglas de esquerda, em oposição a Jair Bolsonaro (PSL).

Dirigentes ligados ao governador afirmam que Guimarães assumiu sua posição como a do partido com o movimento e iniciaram processo que pode levá-lo à expulsão. "Esquerda pra Valer não tem mais espaço no PSDB", disse Doria.

À reportagem, Guimarães responde que não sairá da sigla, onde começou a militar aos 13 anos. Classifica a atitude de Doria como stalinista e diz que o partido será uma legenda apequenada se for sequestrada por ele.

Na sexta (31), o rumo do PSDB será definido em convenção que deve consolidar o poder de Doria. Apoiado pelo governador para a presidência da sigla, o ex-deputado Bruno Araújo é o único na disputa até agora.

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Pergunta - Como recebe o processo de uma eventual expulsão do partido?

Fernando Guimarães - Com muita surpresa. Ao se filiar a um partido, busca-se ampliar a participação política e não ter a liberdade como cidadão restringida, receber um cabresto. O Direitos Já é um movimento cuja bandeira é nada mais do que a defesa da Constituição, na qual o PSDB teve papel fundamental. Em nenhum momento eu ou qualquer outra liderança falou em nome do partido. É uma caça às bruxas.

É a primeira vez que um líder tucano diz que o EPV não espaço?

FG - É a primeira vez. Sempre tivemos um amplo diálogo com nossos líderes. Doria vem falando em nome do partido, apontando quais rumos o partido irá tomar, desrespeitosamente. O presidente nacional é Geraldo Alckmin.

O que se vê quando Doria diz que descontentes devem pedir para sair é uma afirmação stalinista. Contraria o princípio fundamental do PSDB, que é a democracia interna.

Se ele quer um novo PSDB, se não se identifica com os valores progressistas do partido, onde nunca existiu extrema esquerda ou extrema direita, por que se filiou ao PSDB? Quem apoiou o extremo foi ele, ao apoiar Bolsonaro, que é extrema direita, antes de qualquer deliberação do partido.

Vai pedir para sair do PSDB?

FG - De forma alguma. Eu dediquei minha vida à construção desse partido. Não só eu, mas milhares de militantes históricos que vão seguir fazendo a defesa da social-democracia. A nossa escola foi Mário Covas, Franco Montoro. O PSDB é um partido de centro-esquerda, sempre foi. Nós somos tucanos. Essa é a dificuldade do Doria diante das figuras históricas do partido: ele não se sente tucano. E por isso essa dificuldade de ter pluralidade.

Quais críticas o sr. tem a esse processo no conselho de ética?

FG - Há uma hipocrisia da burocracia partidária. Se ela entende que o PSDB não pode dialogar com o PT, por que ela não agiu quando o PSDB foi buscar uma aliança com o PT para viabilizar a eleição do presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo?

É estranho quando eu vejo um pedido de encaminhamento à comissão de ética assinado pelo secretário-geral do partido no município, que é o chefe de gabinete de Doria. Está ali a digital do governador. O primeiro líder que não reconhece a separação do que é ser chefe do Executivo e o que é o papel do partido. É como se ele dissesse: "eu indico as pessoas e elas farão aquilo que eu determino". Isso não é um partido político, isso é uma legenda apequenada, sequestrada.

Nos discursos, os tucanos que fundaram o partido falam em volta às origens e Doria fala em renovação. Há uma tensão?

FG - Permanentemente. Há uma tensão, há um constrangimento. O PSDB tem nos fundadores, como Alckmin, Serra, Tasso e FHC, o DNA tucano, esse compromisso com a social-democracia, que é uma corrente de centro-esquerda.

E essa velha guarda está resistindo? Porque só o indicado de Doria, Bruno Araújo, concorre à presidência.

FG - Restam cinco dias e há uma expectativa de que nossos líderes consigam cumprir o papel de defesa do PSDB. Se eles não agirem nesse momento, depois vai ser tarde. É preciso que nossos líderes se manifestem. Porque se for para levar o PSDB para direita, que se mude o nome, porque não é honesto carregar o nome de social-democracia e levar o PSDB para um neoliberalismo extremado.

Doria fala que o PSDB será de centro, concorda?

FG - Absolutamente. O Doria é um liberal, é um neoliberal, o posicionamento dele é bem à direita.

Estrategicamente, do ponto de vista de quem pretende disputar uma eleição para presidente da República, se apresenta de centro para ter mais facilidade de conseguir trazer o eleitor. Mas o conteúdo do que ele defende não é centro. Ele não é uma figura moderada. Se fosse, ele não estava fazendo essa caça às bruxas, estava dialogando conosco.

FERNANDO GUIMARÃES, 44

Sociólogo, começou a militar no PSDB aos 13 anos. Foi vice-presidente da juventude nacional do PSDB e é membro do diretório nacional do partido e do conselho do Instituto Teotônio Vilela. Foi assessor parlamentar de deputados do PSDB.

(CAROLINA LINHARES)