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Mourão terá voz ativa no próximo governo

Vice-presidente eleito trava guerra interna com Onyx Lorenzoni

Antonio Cruz/ABR -
Mourão quer protagonismo e faz questão até de sala ao lado de Bolsonaro
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Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão serão diplomados amanhã, em cerimônia no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), como presidente e vice-presidente da República, respectivamente. O clima, na cerimônia, promete não ser dos mais amigáveis, diante das declarações feitas ontem, por Mourão, à jornalista Andreia Sadi, da “Globonews”.

Na conversa com a jornalista, Mourão não evitou responder sobre as suspeitas que recaem sobre a família Bolsonaro diante do relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que aponta movimentação de R$ 1,23 milhão feita por Fabrício Queiroz, ex-assessor do deputado estadual Flávio Bolsonaro e cheque nominal à futura primeira-dama, Michelle Bolsonaro, no valor de R$ 24 mil.

Mourão aproveitou para dar uma estocada verbal no futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. “Ele está estressado. Quando responde daquele jeito, parece que tem culpa no cartório. Quando me perguntam, eu respondo com tranquilidade. Temos que falar”, disse Mourão, segundo o Blog de Andreia Sadi.

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Mourão quer protagonismo e faz questão até de sala ao lado de Bolsonaro (Foto: Antonio Cruz/ABR)

Na guerra de poder entre os grupos que circundam na transição de governo – que incluem o núcleo familiar, o político e o militar –, além da patente, respeitada por Jair Bolsonaro, o general de quatro estrelas do Exército possui a seu favor a vontade sufragada do eleitor que o colocou na condição de vice. Isso lhe dá autonomia para se pronunciar sem correr o risco de perder o cargo, ainda que o presidente tente desautorizá-lo.

“O cargo de vice-presidente tem a sua independência. Não se trata de um cargo ad nutum (pela vontade) como é no caso dos ministros. É um cargo que faz parte do processo eleitoral e dispõe de autonomia. Não há a possibilidade de uma quebra de confiança, por exemplo, gerar a demissão ad nutum do presidente”, explica Christine Peter, professora titular de Direito Constitucional do UniCeub, em Brasília.

Durante a campanha eleitoral, por pelo menos três vezes, Bolsonaro desautorizou falas de Mourão. “Ele é o general e eu sou o capitão. Mas eu sou o presidente”, disse, em uma dessas vezes.

Mas a campanha passou e ele não pode mais calar o seu vice. Tanto que Mourão, já na transição, permanece concedendo entrevistas e deixando claro o seu protagonismo, a contragosto, inclusive, dos filhos de Bolsonaro.

Centro de governo

Em 20 dias, os dois despacharão em seus respectivos gabinetes – Bolsonaro, em uma vasta área do 3º andar do Palácio do Planalto; e Mourão, no térreo do Anexo II, onde para se chegar por dentro do Palácio, é preciso descer ao subsolo – se bem que ele ainda trabalha para ter uma sala no mesmo andar, para exercer a sua atividade de um jeito mais contiguo ao presidente. Mourão manifestou esse desejo ainda na campanha eleitoral. As negociações vêm sendo feitas e o próprio presidente eleito mencionou querer esta segunda sala para facilitar os despachos. Mas, até agora, o espaço não foi providenciado.

No Gabinete de Transição as salas do presidente e do vice são vizinhas de porta, separadas apenas por um estreito corredor. Quando estão em Brasília, de terça a quinta-feira, Mourão atravessa da sua sala à de Bolsonaro a todo instante para apresentar seus planos para o futuro governo.

O plano mais cobiçado, desenhado ainda no período da campanha, é o de gerir as ações interministeriais, com a coordenação do que batizou de “centro de governo”. A proposta foi apresentada a Bolsonaro, que concordou. Mas havia, no meio do corredor, Onyx Lorenzoni para atravancar o caminho do vice. E conseguiu, por enquanto. Segundo um interlocutor próximo aos dois, Onyx costuma usar a força política para pressionar Bolsonaro. Na maioria das vezes, adentra à sala do presidente em transição acompanhado de deputados para dar sustentação às suas teses. Foi assim que convenceu Bolsonaro a mudar de ideia em relação ao centro de governo, diante da possibilidade de ver esvaziada a sua missão na Casa Civil.

Ao apresentar o organograma do futuro governo, Lorenzoni, ministro Extraordinário da Transição, usou como justificativa para subtrair de Mourão a função, o fato de que ele já teria uma “missão constitucional”. O artigo 79º da Constituição diz que “substituirá o presidente, no caso de impedimento, e suceder-lhe-á o vice-presidente”. Mas o parágrafo único do mesmo artigo aponta que “o vice, além de outras atribuições conferidas por lei complementar, auxiliará o presidente sempre que por ele convocado”.

Três Projetos de Lei Complementar definindo as atribuições do vice já foram apresentados, nenhum foi aprovado. A segunda parte do parágrafo único, no entanto, autorizaria, segundo os especialistas, que Mourão coordenasse as ações de governo, sem a necessidade de lei.

Atualmente, a Câmara discute o PLP 349/2017, do deputado Veneziano Vital do Rego (MDB-PB), que está na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP). Segundo o texto, Mourão estaria apto a montar o seu “centro de governo”.

Após a posse, em janeiro, o vice-presidente já sentará na cadeira presidencial para que Bolsonaro posso fazer a cirurgia de retirada da bolsa de colostomia que usa desde o atentado que sofreu em setembro.