As águas fétidas e turvas anunciam a morte da Lagoa de Jacarepaguá, a mesma que margeia o Parque Olímpico e que constava do plano de recuperação ambiental do Estado para os Jogos. Ali, a concentração sistemática de esgoto nos últimos anos deixou um rastro de destruição que se estende por todo o sistema lagunar da região, numa faixa de 15 quilômetros. São cinco as lagoas da Barra da Tijuca. Na de Jacarepaguá, não há mais peixes.
A constatação é do biólogo Mário Moscatelli, maior referência do estudo das condições das baías de Guanabara, Angra dos Reis e Sepetiba e das lagoas e praias em áreas urbanas do Rio. Na semana passada, ele circulou por mais de uma hora com a reportagem do Terra por três lagoas do complexo – Jacarepaguá, Camorim e Tijuca. Durante todo o percurso, o odor das águas provocava náuseas e reações inconformadas de Moscatelli.
Em alguns trechos, a pequena embarcação quase encalhou em elevações de sedimentos poluídos formados pelo acúmulo de matéria orgânica.
“Isso tudo virou uma grande latrina. Em locais lindos, em que poderia haver ecoturismo, produção pesqueira, prática de esportes aquáticos e até a frequência de banhistas, o que se vê hoje é um grande valão pútrido. Vivemos no Rio um estado de terrorismo ambiental. Isso é o legado dos Jogos!”
Moscatelli é o responsável pela recuperação dos manguezais que costeiam as lagoas da Barra. O trabalho, no entanto, não consegue fazer frente ao despejo de esgoto que oito rios lançam diariamente no complexo lagunar. “Excepcionalmente quando a maré sobe muito, há a entrada de peixes (da praia da Barra) nas lagoas, mas não resistem à quantidade de gás sulfídrico e metano.”
O desapontamento do biólogo aumentou recentemente quando o governo do Estado suspendeu contrato de R$ 76 milhões previstos para obras de recuperação ambiental das lagoas da Barra. O dinheiro foi transferido, por ordem judicial, para o pagamento de aposentados e pensionistas do Rio.
A revitalização do sistema lagunar da Barra integra o caderno de encargos do Brasil para os Jogos Olímpicos. Mas, praticamente não saiu do papel. Até anos atrás, esses locais abrigavam cardumes de tainhas, robalos, savelhas e caraúnas e atraíam muitos pescadores. Havia também camarões e caranguejos em abundância. Atualmente, as águas borbulham como reação a gases tóxicos e indicam ali o fim da vida marinha.
“O Parque Olímpico é cercado por dois rios mortos (Arroio Pavuna e Pavuninha) que despejam esgoto na Lagoa de Jacarepaguá. Se durante os Jogos bater um vento forte e remover o fundo, o cheiro vai ser insuportável e vamos passar vergonha. Triste olhar para trás e ver que tivemos sete anos, desde a escolha do Brasil como sede olímpica, para fazer algo pelo meio ambiente.”