Matéria publicada nesta quinta-feira (22) pelo The Wall Street Journal conta que desde que entrou na guerra síria no ano passado, a Rússia teve sucesso em minar o status dos Estados Unidos como única superpotência do Oriente Médio, uma conquista que culminou com a queda de Aleppo. Essa ascensão transformou Moscou num intermediário indispensável nas negociações da região. Na Europa, também, a onda de imigrantes desencadeada pela guerra síria reforçou o domínio de Moscou, alimentando partidos populistas que simpatizam com o presidente Vladimir Putin. O assassinato do embaixador da Rússia na Turquia na segunda-feira, no entanto, colocou em evidência o outro lado dessa ascensão vertiginosa. À medida que a influência americana diminuiu, a Rússia ocupou o lugar que os EUA ocuparam por muito tempo na mente de muitas pessoas no Oriente Médio: uma potência estrangeira imperialista encampando uma guerra contra os muçulmanos e o Islã.
Segundo a reportagem não há nenhum episódio recente de protesto antiamericano na região. Mas em meio à agonia de Aleppo, dezenas de milhares de manifestantes convergiram este mês para as áreas onde estão as missões russas, de Istambul à Beirute à Cidade do Kuwait. Nas manifestações, lideradas por legisladores locais, a mensagem era clara: “A Rússia é o inimigo do Islã”. O policial turco que assassinou o embaixador Andrey Karlov na segunda-feira gritou que estava vingando o sofrimento de Aleppo, que havia sido submetida a um ano de bombardeio russo antes que o regime sírio e seus aliados xiitas conquistassem as partes dominadas por rebeldes da cidade em semanas recentes. O assassinato do diplomata, embora condenado pelos governos, foi recebido com alegria nas redes sociais árabes e nos campos de refugiados palestinos.
O Journal afirma que o assassinato de 12 pessoas em uma feira de Natal em Berlim na segunda-feira pareceu ser um desses ataques extremistas. Uma dia depois, o Estado Islâmico assumiu responsabilidade pelo atentado. Embora o autor do ataque ainda seja desconhecido, esse tipo de ato terrorista na Europa passou a se misturar na mente da opinião pública com o influxo maciço de refugiados que começou depois que a chanceler alemã Angela Merkel, uma das críticas mais duras de Putin no Ocidente, decidiu conceder asilo para os sírios fugindo da guerra no ano passado. Um coro de políticos anti-imigração em toda a Europa já acusou Merkel, que enfrentará eleições no próximo ano, de ser responsável pela carnificina em Berlim. O fato de a Rússia ter se tornado um alvo dos jihadistas de forma nunca vista antes ficou claro em outubro de 2015, apenas um mês depois que forças e aviões de guerra russos foram despachados para a Síria. Um avião de passageiros russo foi derrubado sobre a península egípcia do Sinai, com o Estado Islâmico reivindicando a responsabilidade.
Diário norte-americano avalia que o envolvimento da Rússia — com tropas e ajuda financeira — aumentou. A ira contra a Rússia é hoje também mais evidente e não se limita aos jihadistas. Isso gera um problema para a meta do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, de forjar um entendimento com Putin e o Irã sobre o futuro da Síria. Até recentemente, a Turquia era um dos inimigos mais determinados do regime de Assad, mas suavizou essa postura em troca da aquiescência russa a uma operação militar turca contra o Estado Islâmico e as milícias curdas no norte da Síria. Os ministros de Relações Exteriores dos três países discutiram sobre a Síria em uma reunião na terça-feira em Moscou. Na Turquia e em outros lugares da região, a opinião pública hostil significa que os representantes e as missões da Rússia terão de aplicar as mesmas restrições de segurança que dificultaram o trabalho dos diplomatas americanos por décadas. No entanto, assim como as manifestações antiamericanas e os ataques a diplomatas americanos não expulsaram os EUA do Oriente Médio, Moscou também não deve ser dissuadido pela morte de Karlov.
Tanto a Turquia quanto a Rússia estão determinadas a não deixar que o episódio prejudique a recente aproximação entre os dois países.
Independentemente do que acontecer, os líderes regionais estão bem cientes que Moscou chegou ao Médio Oriente para ficar, conclui The Wall Street Journal.