Em contrato pelos direitos de TV do Campeonato Brasileiro de 2019 a 2024, a Globo prometeu ao Flamengo que nenhum outro clube ganharia mais luvas (dinheiro adicional na assinatura) que o rubro-negro carioca. É o que mostram documentos aos quais a reportagem teve acesso.
No acordo, fechado no dia 4 de abril de 2016, a Globo estipulou que "garante que o valor das luvas devidas ao clube não será inferior ao valor das luvas devidas aos demais clubes que disputarem o campeonato com os quais venham a celebrar contrato".
Assim, o Flamengo conseguiu R$ 120 milhões em luvas: R$ 70 milhões no prazo de cinco dias úteis após a assinatura do instrumento, mais R$ 30 milhões, com a correção monetária, em 2019, e outros R$ 20 milhões a serem pagos em janeiro de 2021.
O contrato também garante um valor mínimo de R$ 120 milhões por ano --totalizando R$ 720 milhões--, mais a correção monetária dos períodos, pelos pacotes de pay-per-view em nome da equipe.
Do valor obtido com as vendas dos pacotes, 38% são repassados para os times. A divisão dessa fatia é feita a partir de uma pesquisa com clientes que assinaram o serviço. Quem tem mais torcedores assinantes recebe mais.
Com o acréscimo das luvas e os valores mínimos exigidos por rateio, o clube tem garantido cerca de R$ 1 bilhão caso permaneça na Série A até 2024.
O contrato da Globo estipula um valor de referência de R$ 1,1 bilhão por ano, a ser dividido pelos 20 clubes da seguinte forma: 40% de forma igualitária, 30% por premiação de performance e 30% de participação por exposição e aparições da equipe transmitidas na TV aberta ou fechada.
Só com a participação igualitária, permanecendo na elite, o Flamengo tem R$ 132 milhões garantidos --o valor será ainda maior com a correção monetária.
O prêmio por performance garante no mínimo R$ 67,3 milhões ao clube, pois o 16º colocado --posição com menor bônus na tabela, por ser a última que garante a permanência na Série A-- recebe R$ 11,22 milhões por temporada.
Com o título do ano passado, o contrato rendeu aos cofres rubro-negros, só pelo critério de desempenho, R$ 33 milhões.
Recentemente, o Flamengo entrou em disputa com a Globo por divergências no entendimento do modelo de contrato.
No processo, que está em segredo de Justiça, o Flamengo diz que discorda do cálculo da "participação por exposição". Para a agremiação, a emissora reduziu as suas aparições nas TVs aberta e fechada e vem priorizando a exibição de jogos do time no sistema pay-per-view, que não remunera de acordo com o número de exibições.
Na petição inicial da ação, os representantes rubro-negros dizem que a emissora tenta enriquecer indevidamente às custas do clube.
O Flamengo foi procurado, mas não quis comentar. A Globo afirmou que não comenta valores referentes à relação contratual com os clubes, sujeitos a confidencialidade.
A emissora também ressaltou que há mais de 30 anos a relação da empresa com as agremiações está pautada em uma agenda comum que visa à valorização e o desenvolvimento do futebol brasileiro.
"Essa postura não tem sido diferente com o Flamengo, com quem tem um contrato para o Brasileiro nos mesmos moldes do celebrado com os outros clubes e que vem sendo cumprido regularmente, com transparência", disse a Globo, em nota.
A emissora apontou também que não se manifesta sobre questões em análise na Justiça, mas considera que são normais eventuais divergências sobre interpretações contratuais e confia que vai chegar a uma solução consensual com o Flamengo.
Recentemente, as partes viveram conflito também na transmissão dos jogos do campeonato estadual. Entre os 12 times da competição, o time rubro-negro foi o único que não chegou a nenhum acordo com a Globo durante as negociações dos direitos para TV aberta e fechada, além do pay-per-view.
Como a Lei Pelé estabelece que partidas só podem ser exibidas com a autorização das duas partes envolvidas, o Flamengo não poderá transmitir seus próprios confrontos nem assinar com outra emissora ou plataforma de streaming.
O clube quer receber um valor mais alto em relação aos seus rivais, o que a emissora rejeita. (Camila Mattoso e Diego Garcia/FolhaPressSNG)