Matéria publicada nesta sexta-feira (19) pelo The wall Street Journal conta que um ano de redução de dívida, venda de ativos e aumento nos preços das commodities tiraram a Glencore PLC da beira de uma crise. Agora, os acionistas da gigante suíça da mineração e negociação de commodities têm uma nova preocupação: que Ivan Glasenberg, o diretor-presidente, possa voltar à sua velha prática de gastos desenfreados com aquisições. Durante grande parte dos últimos dez anos, Glasenberg foi o principal comprador do setor de commodities, abocanhando minas de carvão, cobre e ouro em regiões como o leste da África, América do Sul e Austrália. Depois que o acúmulo de dívidas e a queda dos preços das matérias-primas derrubaram as ações da Glencore no ano passado — a cotação chegou a cair 29% num único dia, 28 de setembro, na bolsa de Londres — investidores pressionaram Glasenberg a reduzir o endividamento e vender minas deficitárias. Ele suspendeu o pagamento de dividendos aos acionistas, demitiu empregados para cortar custos e reduziu a dívida da firma para níveis mais sustentáveis, dizem investidores. Com as ações tendo subido 180% desde as mínimas de 2015, a Glencore recentemente passou a concorrer nas ofertas por ativos de porte, como minas de carvão australianas que as mineradoras Rio Tinto PLC e Anglo American PLC colocaram à venda, dizem pessoas a par das negociações. Os investidores dizem que Glasenberg tem trabalho a fazer antes de começar a comprar de forma responsável, e esperam ver mais planos de cortes de custos do que de novos investimentos quando a empresa divulgar seu resultado, em 24 de agosto.
“Primeiro, precisamos terminar a alavancagem e, então, temos que restaurar os dividendos”, diz David Herro, administrador de fundos da gestora americana Harris Associates LP, que detém cerca de 6% das ações da Glencore, uma fatia avaliada em cerca de US$ 2 bilhões.
O Journal afirma que Herro comprou bilhões de dólares em ações da Glencore no ano passado, enquanto elas caíam, e diz que a Glencore deveria considerar se recompras de ações não fariam mais sentido do que novas aquisições. Um porta-voz da Glencore não quis comentar. Glasenberg transformou a Glencore de uma empresa de negociação de commodities em uma das maiores mineradoras do mundo, com negócios como a compra da mineradora de carvão Xstrata, em 2013, por US$ 29,5 bilhões. Mas suas grandes apostas não tiveram êxito nos últimos dois anos, quando os preços das commodities despencaram. Apesar de ter esboçado uma recuperação este ano, o preço do carvão continua deprimido devido, em parte, às tentativas mundiais de refrear o aquecimento global reduzindo as emissões de carbono de fábricas movidas a carvão. A Glencore perdeu US$ 5 bilhões em 2015 e sua ação continua 60% abaixo do preço da oferta inicial, em 2011. Não há dúvida de que a situação da Glencore melhorou de um ano para cá, quando Glasenberg tentou acabar com o receio dos investidores de que a empresa era um barril de pólvora de dívidas prestes a explodir. No fim de 2015, a dívida líquida da Glencore — que não inclui os bilhões de dólares em empréstimos que alimenta a unidade de negociação de commodities — caiu para US$ 25,9 bilhões, ante US$ 29,6 bilhões em meados daquele ano. A Glencore afirma que planeja reduzir o endividamento para US$ 17 bilhões a US$ 18 bilhões no fim de 2016.
“A administração está fazendo exatamente o que eles deveriam fazer”, disse Herro, o gestor de fundos.
De acordo com a reportagem do WSJ na semana passada, a Glencore registrou queda na produção de cobre, carvão e zinco no segundo trimestre em relação a um ano antes, devido principalmente ao fechamento voluntário de minas. A Glencore já captou US$ 2,5 bilhões com uma oferta de ações e US$ 1,4 bilhão em alguns negócios de “streaming”, em que a empresa recebe recursos adiantados em troca da produção futura de ouro e prata em suas minas. A suspensão de dividendos gerou economias de US$ 2,4 bilhões em dinheiro. No segundo semestre do ano, a Glencore afirma que espera embolsar cerca de US$ 3,13 bilhões com a venda de quase metade de sua unidade agrícola e mais US$ 100 milhões com a venda de uma mina de ouro no Cazaquistão. A empresa também está estudando a venda de outra mina de ouro naquele país por até US$ 2 bilhões e de ativos ferroviários na Austrália que podem valer mais de US$ 750 milhões, dizem analistas. Charl Malan, gerente de portfólio da americana Van Eck Global, que possui quase US$ 200 milhões em ações da Glencore, diz que a empresa deve continuar reduzindo dívidas e voltar a pagar dividendos antes de fazer novos investimentos.
O jornal norte-americano aponta que existe o risco de os preços das commodities caírem. Alguns analistas dizem que uma rodada de estímulos do governo da China impulsionaram os preços este ano e que eles podem voltar a cair com o fim das medidas. Outros investidores estão preocupados com o preço do carvão no longo prazo, commodity em que a Glencore afirma que poderia investir mais. Bruce Duguid, sócio da gestora britânica Hermes Investment Management, diz que clientes seus que investiram na Glencore temem que a empresa não tenha calculado adequadamente os riscos das políticas criadas para reduzir o aquecimento global. A Glencore afirma esperar que a demanda por carvão térmico — usado na geração de energia — continue aumentando por anos, principalmente no Sudeste Asiático.
“Estamos reticentes quanto à ideia de que você possa prever o mundo com muita confiança, dado que o colapso das commodities que acabou de acontecer foi resultado de uma má compreensão da demanda”, diz Duguid.