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Crise: muito além dos bancos falidos e bônus milionários

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Gabriel Costa, Jornal do Brasil

RIO - Os principais efeitos da crise financeira sobre a economia mundial já não são novidade. Espera-se que o comércio global encolha este ano pela primeira vez desde 1982, investimentos estrangeiros diminuem progressivamente e o fluxo de capital privado deve cair de US$ 1 trilhão em 2009 para US$ 530 bilhões em 2009. No entanto, para a parcela mais pobre da população do planeta, o desastre econômico causa preocupações muito mais sérias que o pagamento ou não de bônus para funcionários de instituições como a seguradora AIG.

As apertadas condições de crédito e a desaceleração do crescimento derrubaram a arrecadação dos governos, o que diminui a capacidade de investimento para alcançar metas de educação e saúde, assim como os gastos em infraestrutura necessários para sustentar o crescimento. Agora, pessoas que mal perceberam benefícios com o processo da globalização enfrentam os reflexos de uma crise que teve início nas capitais do mundo desenvolvido.

Uma coisa é as famílias em países desenvolvidos passarem algumas privações. Outra são enormes populações que podem morrer de fome lembra o professor Alexandre Espírito Santo, diretor do curso de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing do Rio de Janeiro (ESPM-RJ).

De acordo com dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) da Organização das Nações Unidas (ONU), embora a porcentagem da população que vive na pobreza na região tenha caído de 34,1% para 33,2% em 2008, o número de pessoas na situação de extrema pobreza ou indigência aumentou de 68 milhões, ou 12,6% da população em 2007, para 71 milhões em 2008, ou 12,9% da população. O relatório destacou que os esforços para reduzir a pobreza e a indigência no ano passado foram menos efetivos que no período entre 2002 e 2007.

Emergentes expostos

Já o Banco Mundial estima que entre 130 milhões e 155 milhões de pessoas em todo o mundo caíram na pobreza em 2008 como resultado da disparada dos preços de alimentos que, embora tenham caído desde o pico do ano passado, continuam a afetar os mais pobres, segundo a ONU e combustíveis. Segundo a instituição, quase 40% dos 107 países considerados em desenvolvimento estão altamente expostos à pobreza em consequência da crise, e a maior parte dos restantes foi moderadamente exposta. Menos de 10% das nações enfrentou apenas pequeno risco de exposição, de acordo com a estimativa.

As expectativas da entidade não encorajam otimismo. Segundo o Banco Mundial, a crise vai jogar mais 46 milhões na faixa de renda inferior a US$ 1,25 por dia, enquanto outros 65 milhões cairão abaixo de US$ 2 por dia 12 milhões a mais do que a instituição projetava em fevereiro. O total de mais de 100 milhões de novos pobres será somado aos cerca de 2,6 bilhões que já vivem com menos de US$ 2 por dia.

Em seu relatório mensal sobre a economia mundial, a ONU avaliou que o avanço do desemprego mantém um ritmo alarmante, e que os desequilíbrios globais estão avançando de forma desordenada.

Num contexto como esse, os países que estão na linha entre pobreza e miséria obviamente sofrerão, porque têm economias muito dependentes do mercado externo alerta Espírito Santo. Vivemos um período de dificuldades em que terão que ser tomadas decisões políticas até mais urgentes que as econômicas. E os líderes do G-20 terão que arcar com o ônus dessas escolhas.